Em petição protocolada no Superior Tribunal de Justiça, a
Procuradoria Geral da República pede providências contra bancos que
descumprem ordens judiciais de quebra do sigilo bancário de investigados
em operações de combate à corrupção. Acusa as casas bancárias de
“acobertarem a prática de crimes”, passando “a impressão de que o
sistema financeiro nacional não se submete ao ordenamento jurídico nem
ao Poder Judiciário.” Algo que “converte o Brasil, na prática, num
paraíso fiscal.”
Assinado pelo subprocurador-geral da República Carlos Eduardo
Vasconcelos, o documento critica também o Banco Central, que assiste às
transgressões sem coibi-las. A peça foi anexada a um processo que corre
no STJ. Envolve um caso de corrupção. Como os autos tramitam em “segredo
de Justiça”, a Procuradoria noticiou o fato sem informar a natureza do caso e os nomes dos envolvidos.
De acordo com o subprocurador, o STJ ordenara aos bancos que os dados
bancários dos investigados no inquérito fossem fornecidos em 30 dias.
Algumas instituições atenderam à ordem. Outras demoraram a fornecer as
informações. Pressionadas, repassaram-nas incompletas.
Carlos Eduardo menciona em seu texto duas logomarcas: Itaú-Unibanco e
o Santander. Informa que, embora a ordem de quebra dos sigilos tenha
sido expedida há dez meses, esses bancos ainda não se dignaram a
fornecer os dados. Tudo isso “sem que o Banco Central exerça seu poder
fiscalizatório sobre eles.”
Carlos Eduardo acrescenta que uma das instituições que repassaram
cifras incompletas ao Ministério Público, depois de pressionada,
complementou as informações. Curiosamente, a segunda fornada de dados
registrou a “movimentação de somas elevadas” numa conta anteriormente
apresentada como “sem movimentação.”
Segundo o subprocurador, os presidentes dos bancos e os prepostos que
“sonegam as informações cometem o crime de desobedicência, previsto no
artigo 330 do Código Penal, “além de acorbertarem a prática de crimes
financeiros.”
Quanto ao presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, o
subprocurador sustenta que, ao assistir passivamente à desobediência dos
bancos, ele se converte, “na melhor das hipóteses”, em testemunha-chave
dos crimes praticados pelas instituições que deveria supervisionar.
O autor da petição pede ao STJ que oficie aos presidentes dos bancos
para que obedeçam às ordens judiciais “no prazo improrrogável de 10
dias”, sob pena de fixação de multa diária. Requer que seja enviado
ofício também ao presidente do BC.
Deseja que, no mesmo prazo de dez dias, Tombini informe que “medidas
coercitivas” o Banco Central planeja adotar no caso específico e em
outros processos análogos em que se verifica a mesma “recalcitrância”
dos bancos em cumprir as ordens de quebra do sigilo da clientela
encrencada com a Justiça.
O texto do subprocurador menciona vários inquéritos em que
instituições financeiras desrespeitam decisões judiciais. Anota que o
fenômeno, por recorrente, “sugere uma ação organizada de obstrução da
Justiça.” Coisa destinada a “dificultar ao máximo o atendimento às
requisições de quebra de sigilo bancário.”
Sustenta que a teimosia dos bancos e a inação do BC, além de afrontar
a lei, desrespeitam compromissos assumidos pelo Brasil com a comunidade
internacional por meio de tratados. Menciona, de resto, a existência de
mecanismos que deveriam simplificar a quebra dos sigilos em operações
de combate à corrupção.
Cita uma ferramenta batizada de Simba (Sistema de Investigação de
Movimentações Bancárias). Trata-se de um banco de dados gerido pela
Assessoria de Pesquisa e Análise da Procuradoria Geral da República.
Deveria tornar o processamento das informações bancárias mais
“eficiente” e “ágil”.
O sistema foi aprovado no âmbito de um acordo chamado ENCCLA
(Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro).
Participaram dos entendimentos, entre outros, a CGU, o Ministério da
Justiça, o BC, o Ministério Público, o Conselho Nacional de Justiça e as
próprias instituições financeiras, representadas pela Febraban.
Considerando-se o acerto entre as partes e a legislação vigente,
escreve o subprocurador Carlos Eduardo, “não há respaldo para que o
cumprimento da ordem judicial no prazo estabelecido […] se subordine à
conveniência, ao arbítrio, capricho ou às prioridades logísticas dos
diretores das instituições financeiras.”
No documento levado ao STJ, o doutor sustenta que o tribunal precisa
acabar com “esse sistêmico desdém” que leva o Estado a “se ajoelhar
perante o sistema financeiro” para implorar os dados necessários à
repressão de crimes como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e evasão
de divisas.
A CPI do Cachoeira vive um drama semelhante ao retratado pelo
subprocurador. A comissão quebrou os sigilos das contas de várias
pessoas e empresas. Entre elas a Delta Construções. Alguns bancos ainda
não enviaram os dados. Outros forneceram informações incompletas e
despadronizadas. Em contato com as instituições financeiras, técnicos da
CPI “se ajoelham” para pedir aquilo que a lei manda entregar.
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