domingo, 2 de dezembro de 2018

Alexandr Dugin: "Síria é importante para acabar com a hegemonia ocidental de destruição de países árabes"

Alexandr Dugin (nascido em Moscou, 7 de janeiro de 1962) é um dos grandes ideólogos da Rússia contemporânea. Analista político, filósofo político e historiador de religiões com estreitas conexões com o Kremlin e os militares. É um homem vinculado à alta política há anos sendo, além disso, o grande ideólogo da Quarta Teoria Política, do Neo-eurasianismo, com uma grande e crescente influência e autoridade entre o povo russo, dentro do Kremlin e, cada vez mais, fora da Rússia. Teve a graça de conceder uma entrevista para a Oltracultura.com.
1- Quais foram os desafios internos que Rússia teve que operar, particularmente desde a chegada de Vladimir Putin ao poder depois da década dos anos noventa (a década Yeltsin) na qual a Rússia teve uma brutal crise econômica, viu-se nas mãos de oligarquias ou de países estrangeiros (Estados Unidos enviava grandes quantidades de dinheiro para a Rússia), viu-se com um gravíssimo problema na Chechênia e com grande descrédito internacional. Quais foram os desafios que Putin teve que superar e como se chegou a essa situação tão delicada e perigosa para a Rússia de aberto comprometimento com a grande superpotência internacional que são os Estados Unidos? Como a Rússia se recuperou nestes quinze anos de governo de Putin?
Dugin: Sim, este foi o momento mais difícil, mais dramático da história da Rússia atual. Quando Putin chegou ao poder, foi o momento de mudança total do curso, mas, paradoxalmente, Putin foi posto lá por Yeltsin, não veio de fora do sistema, era membro do grupo dos liberal-democratas de São Petersburgo, trabalhava com Anatoly Sobchak, que era figura simbólica do liberalismo ocidentalista demagógico russo, dos piores; interessante que Putin chegou ao poder não como a alternativa a Yeltsin, mas como o representante de seu sistema, de seu grupo. Desde os anos noventa, [este grupo] era chamado "a família" de Yeltsin, não no sentido de sua família real, natural, mas no sentido da gente, dos oligarcas que sustentavam Yeltsin.
O liberalismo, esta ocupação do país pelo Ocidente, precisamente porque nos anos noventa foi a ocupação... Gorbachov quis fazer um acordo com o Ocidente para deixar a Guerra Fria, mas Ocidente entendeu isto como uma capitulação da Rússia, e a resposta foi a expansão da OTAN, da pressão sobre a Rússia para acelerar seu término, seu fim. Brzezinski declarou abertamente que se deveria destruir totalmente a Rússia. Era a política geral do unipolarismo ocidental nos anos noventa. A elite que chegou ao poder, liberal-democrata, era uma elite pró-ocidentalista que ajudava o Ocidente com a destruição do país, eles venderam quase tudo, e Putin era um deles; é muito importante compreender, entender, o que se produziu no momento de sua chegada ao poder.
Era uma parte deste sistema. Este sistema rumava no sentido da destruição total do país, a posição era fraca, não se pôde opor em nada contra este caminho dos liberais, dos oligarcas, dos traidores, e Putin era parte deste grupo. Mas quando ele chegou ao poder, ele mudou tudo de supetão, completamente. Sendo o homem de Yeltsin desde seus primeiros passos no poder, Putin começou a seguir uma linha completamente oposta à linha de Yeltsin.
Yeltsin não pôde nem quis acabar com a guerra na Chechênia, o que ele quis era continuar colaborando com o Ocidente, e Putin transformou tudo isso imediatamente, com vontade e decisão acabou com a guerra na Chechênia, começou a reconstruir a Rússia, saindo do Fundo Monetário, dos preceitos do Banco Mundial, e começou a reafirmar, reconstruir a soberania nacional da Rússia. Nisso ele foi apoiado completamente pelo povo russo, totalmente; faltava a Putin o partido, a estrutura, a ideologia, a elite também lhe faltava; foi apenas posto pelos liberais, os oligarcas e Yeltsin mesmo, mas mudou tudo, era uma forma.
Não era a oposição que vencera as eleições; pelo contrário, era integrante do grupo de Yeltsin nos anos noventa que se revoltou, depois de chegar ao poder, contra tudo isso e, desde então, começa outra história para a Rússia. A história de Putin com o conservadorismo, a soberania nacional, o patriotismo, com o curso em geral, com a multipolaridade, com a integração do espaço pós-soviético no sistema eurasiático. Uma mudança completa e radical com respeito ao curso de Yeltsin. Putin era o oposto, mas há que compreender que Putin não mudou a elite; a elite é a mesma. É a elite liberal dos anos noventa que não pode se revelar abertamente contra Putin, mas conserva suas opiniões e ideias liberais. Putin não criou outra elite, não criou instituições para o apoio de seu decurso.
Por isso devemos considerá-lo um líder solitário, um Czar solitário, que tem o apoio do povo geral, mas da elite nas instituições não têm qualquer apoio nem mesmo estrutura, exceto talvez o exército, o círculo dos militares, do Estado profundo russo, mas no nível da elite não tem apoio.
2- Há um tema muito interessante, falando sobre os liberais na Rússia, como muitos desses oligarcas como, por exemplo, citando nomes, Abramovitch (que comprou o Chelsea, um time de futebol britânico), como Berezovsky; eles abandonam a Rússia e se refugiam no Reino Unido, assim como Ahmad Zakaev, que foi presidente da Chechênia quando foi independente e que obviamente fugiu da Rússia para o Reino Unido; e do Reino Unido quero falar porque há pouco, há apenas uma semana se difundiu uma notícia sobre uma operação do Estado profundo britânico na Europa, cuja função consistia, precisamente, em evitar através de diferentes lobbys na Europa continental (entre eles Espanha) que a influência russa fosse avançando. Por acaso estamos agora mesmo na Europa, evidenciando o caso da Ucrânia, sobre o qual falaremos depois, por acaso estamos assistindo a uma guerra entre um eixo que é o Reino Unido e os Estados Unidos, de um lado, e a Rússia por outro?
Dugin: Sim, você perguntou muitas coisas em uma só questão; para começar, falemos dos oligarcas. Putin não destruiu os oligarcas, ele apenas fez uma diferenciação, uma divisão entre os oligarcas. Uns aceitaram sua inclinação, como Abramovitch, os outros se revelaram contra Putin, como Berezovsky. Putin não é anti-oligarquista, sua política consiste na promoção dos oligarcas leais à sua inclinação, à ideia da soberania da Rússia; o reconhecimento dos valores conservadores soberanos lhes deixa viver. Os que se revelam contra esta inclinação, contra Putin e os valores que esta inclinação representa, saem do país, como Berezovsky.
Berezovsky foi assassinado, creio eu, pelos britânicos porque quis voltar à Rússia. Ele tinha saudades, pensava que tinha cometido o erro de se mostrar contra Putin, quis voltar e foi assassinado; ele tinha os contatos com os serviços secretos britânicos e americanos, e foi assassinado porque enviou uma carta a Putin com a explicação de sua saudade pela Rússia, com o reconhecimento de seus erros etc. etc., e foi assassinado por isso.
Sobre o Reino Unido agora. A Inglaterra sempre foi o inimigo geopolítico da Rússia, o ponto central do imperialismo anglosaxão, e esta tradição continua. No Reino Unido, recentemente se publicaram documentos que mostram que Reino Unido quis apresentar a Rússia como agressora, apresentá-la também como influenciadora das eleições na Catalunha para destruir a Europa, apoiando os elementos extremistas. Tudo era mentira, tudo era completamente falso e foi organizado com fakenews e propaganda pelos britânicos.
Não creio que as relações com os Estados Unidos sejam muito diferentes das relações com o Reino Unido, porque, apesar de certa simpatia entre Trump e Putin, Trump não pode sair dos limites do atlantismo e da elite americana. A elite norte-americana não deixa Trump se aproximar de Putin e ele entende isto perfeitamente, por isso [Putin] busca o apoio mais a oriente, na China, no Irã, na Turquia e outros países orientais e com alguns representantes conservadores alternativos antiglobalistas europeus de esquerda ou direita. Por isso, apesar de que Putin não faz grandes coisas para o apoio do movimento alternativo no Ocidente, creio que este movimento de esquerda e de direita vê em Putin precisamente este símbolo da luta contra a globalização, o globalismo, contra a hegemonia das elites liberais mundiais que destroem não apenas o mundo asiático, africano ou latino-americano, mas também a própria Europa.
A Europa começa pouco a pouco a se revelar, como os gilets jaunes na França atual. Putin, como o defensor da ordem multipolar, é o inimigo geopolítico do globalismo e da hegemonia americana, e representa um símbolo nesta luta. Os britânicos estão em pânico precisamente porque a autoridade de Putin cresce no mundo e na Europa. A Europa quer um líder como Putin, forte, popular, que defenda a sociedade e que luta contra os que querem debilitar as sociedades. Creio que hoje Putin seja o líder mais popular em toda a Europa; apesar das pretensões dos liberais e dos oligarcas europeus que querem demonizar Putin, ele não é um demônio, é um líder muito querido na Rússia precisamente porque representa o povo, não tanto as elites, mas o povo.
3- Sobre isso eu quis falar. Durante muitos anos na Europa os líderes se encontraram distanciados dos diferentes povos da Europa porque se encontram ao serviço de organizações internacionais, em muitos casos dentro desta ordem mundial também imposta pelo liberalismo estadunidense, falo de presidentes que seguiam diretamente as diretrizes do Banco Central Europeu, do FMI etc...o domínio dos Estados Unidos sobre a União Europeia e, agora, o fato de que Reino Unido saiu da União Europeia também levou a que os países da União Europeia se encontrem sob controle dos Estados Unidos, evita boas relações de dependência entre Rússia e a União Europeia a nível financeiro, a nível econômico, enquanto Europa necessita de recursos naturais que Rússia possui, e Rússia precisa do financiamento que a Europa tem. Essa ruptura, completamente artificial, é devido ao liberalismo vindo dos Estados Unidos, o atlantismo. Qual é a opção que a ideologia, o movimento Eurasiático, que você tem desenvolvido em seus textos para salvar estas relações entre União Europeia e Rússia, oferece?
Dugin: Sim, estou de acordo que Rússia e Europa têm todos seus interesses regionais comuns ao serem aliados, porque a Rússia contemporânea não tem mais ideologia radical comunista ou socialista, não é mais imperialista ou colonialista como nos tempos passados. A Rússia contemporânea é bastante fraca para representar perigo para a Europa.
Essa fraqueza é muito importante para compreender que Rússia não representa perigo, mas que representa a possibilidade positiva, os recursos, grande mercado para os produtos, investimentos, frandes recursos naturais para apoiar a economia europeia. Graças ao desenvolvimento das relações normais, naturais, entre a Europa contemporânea e a Rússia, que não representa mais este perigo para a Europa, lutam com esta elite liberal dos americanos, porque as elites europeias lutam contra os interesses regionais de seus povos, são não tanto antirussos, mas sobretudo antipopulares e antieuropeus estas elites, são traidores dos interesses regionais dos europeus, e por isso querem trazer mais e mais imigrantes para destruir esta classe média europeia e destruir as sociedades tradicionais e democráticas europeias, querem destruir a Europa essas elites, os governantes atuais da Europa não são europeus, não são representantes dos povos.
Macron, Merkel e todos os demais. Creio que com líderes com responsabilidade, que defendam os interesses da Europa, seria necessário um pacto comum com a Rússia, desenvolver as relações. Contra isso estão mobilizadas as forças antieuropeias e antirussas. Querem mostrar a Rússia como o perigo, como o poder autoritário e totalitário, e creio que o problema com a Ucrânia foi criado artificialmente, precisamente para destruir essa imagem (positiva da Rússia) e provocar a guerra civil dentro da Rússia. Nós somos o povo eslavo, cristão, eslavos orientais. Creio que os líderes europeus que apoiaram o Maydan, este golpe de Estado dos ultranacionalistas, ultraliberais ucranianos contra Rússia, quiseram precisamente destruir completamente as relações entre Rússia e Europa.
Sobre a ideologia, a Rússia atualmente não tem qualquer ideologia, não tem ideologia comunista, nacionalista ou liberal. O Eurasianismo, sobretudo a Quarta Teoria Política, está se desenvolvendo como a teoria política do Estado profundo ou da corrente nacional patriótica independente da Rússia contemporânea, porque no nível das elites a Rússia está na situação de confusão com muitos aspectos do liberalismo dos anos noventa, os restos do comunismo e socialismo, e não está organizada intelectualmente, mas o grupo dos patriotas desenvolveram esta ideia do eurasianismo. A teoria do mundo multipolar, a Quarta Teoria Política, fora do liberalismo, fora do comunismo e do fascismo.
(A Quarta Teoria Política) propõe superar estas teorias do mundo moderno para unir a pré-modernidade com a pós-modernidade, a fim de criar uma crítica radical da modernidade ocidentalista. A Europa precisa desta nova ideologia para sair da modernidade política, no interior da qual o liberalismo mostra sua essência niilista, sua essência suicida; porque o liberalismo, depois de vencer o comunismo e o fascismo, mostrou a essência da própria modernidade na Europa moderna, que representa, como disse Heidegger, o niilismo puro, total.
O liberalismo hoje se mostra como a ideologia totalitária que impõe os princípios da correção política como a forma necessária junto com a política de gênero ou a imigração, que não correspondem em nada aos interesses dos europeus normais, concretos. Contra esta ideologia liberal há que lutar, mas sem cair no comunismo ou no fascismo, que são duas formas superadas desta visão antiliberal. Precisamos de uma forma mais atualizada e totalmente diferente, totalmente fora do comunismo e do fascismo, porque ambos são, também, produtos da modernidade, da Europa moderna e do niilismo que operam com os sujeitos artificiais de classe, nação ou raça, que são artificialmente compostos na mesma medida em que o conceito de indivíduo, que é o conceito central do liberalismo.
Não existe, na verdade, indivíduo nem raça nem classe. Tudo isso são abstrações; existe homo, existe o Dasein heideggeriano, existe a existência pensante, a presença pensante como Heidegger dizia. Precisamos construir a Quarta Teoria Política, baseando-a nesta instância nova e ao mesmo tempo eterna.
4- Sobre esta Quarta Teoria Política, e na verdade que foi muito interessante sua resposta, eu gostaria de lhe perguntar: quais seriam as respostas desta Quarta Teoria Política para os problemas que transcorrem agora mesmo na Europa ocidental, por exemplo, respostas do Eurasianismo frente à problemática migratória que está acontecendo agora na Europa, frente aos movimentos homossexuais e feministas histriônicos que estamos encontrando desproporcionalmente belicosos, frente à questão econômica; falo de salários muito baixos, vida muito cara que cada vez mais está destruindo a classe média que, em muitos casos, se perdeu -- qual seria a resposta para estes problemas citadinos concretos que seriam resolvidos pelo Eurasianismo na Europa ou na América Latina?
Dugin: sim, para começar em ordem, primeiramente deve-se compreender que o problema é o liberalismo, o liberalismo é o mal absoluto. Todos os problemas que afetam hoje as sociedades ocidentais provêm diretamente da ideologia liberal, que traz os imigrantes, que destrói a classe média pela política liberal, que faz com que os ricos se tornem mais e mais ricos enquanto os pobres se tornem mais e mais pobres, sem pensar na justiça social, porque o liberalismo leva ideologicamente, dogmaticamente, a ideia da justiça social. Quando não há mais justiça social. Não se deve estranhar que quando aceitamos os liberais de esquerda e direita, a ambos, votamos para que não haja justiça social.
Deve-se entender que a política de gênero também é consequência direta do liberalismo, porque o liberalismo é a ideologia que insiste que devemos liberar o homem, o ser humano, de todos os vínculos com a identidade coletiva. A identidade coletiva da igreja, da nação, mas também a identidade coletiva do sexo, porque o sexo também é coletivo, identidade coletiva. Os homens e as mulheres são tais como são enquanto coletivos, não individualmente. A política de gênero é a política liberal; em breve, o último passo será o de que ser humano também é uma opção, assim como hoje é a respeito do gênero, da nação, da religião. Isso é liberalismo.
Temos o mesmo a respeito dos imigrantes; são indivíduos iguais aos demais, não há qualquer diferença entre os imigrantes europeus tradicionais, aos olhos dos liberais, porque não existe qualquer identidade coletiva (neles). Esta é a ideia dos Direitos Humanos, que é uma forma de ideologia que destrói o ser humano. É uma ideologia totalitária a dos Direitos Humanos, porque insiste sobre a identificação entre os direitos dos cidadãos e a dos não-cidadãos. Desta maneira, os liberais destroem os Estados, as nações e as identidades, destroem os povos.
O povo começa a compreender que se trata de uma forma de política completamente destrutiva e começa a se revoltar, mas não pode encontrar a ideologia correspondente para explicar e dar um apoio a esta revolução, porque a ideologia de direita, o fascismo, perdeu sua luta historicamente e é muito fácil demonizar os que estão a favor do Estado fascista e acabar com eles; a mesma coisa ocorre com os comunistas, socialistas tradicionais, uns são traidores e aceitaram ser liberais como muitas da esquerda tradicional, e os outros são marginalizados como os stalinistas etc. etc.
A esquerda anticapitalista e a direita conservadora perderam a possibilidade de estarem presentes na estrutura política, e não podemos, nem devemos, salvá-los. A Quarta Teoria Política propõe lutar contra o liberalismo sem se apoiar no fascismo ou no comunismo. Como salvar a situação? Por exemplo, deve-se mudar o poder na Europa, deve-se mudar as elites que estão contra o povo, para que o poder seja tomado por um governo popular, como na Itália.
A Itália é um exemplo. Se a elite não quer sair, deve-se organizar os protestos e as revoluções como na França hoje, com os gilets jaunes, mas é muito importante que a exemplo do êxito ocorrido na Itália, a revolução popular dos gilets jaunes na França não seja nem de direita nem de esquerda. O governo italiano está criado com os populistas de direita e os populistas de esquerda, a fim de criar o populismo integral; os gilets jaunes também não são de esquerda ou de direita, são os representantes do povo. A Quarta Teoria Política quer dar o apoio ideológico, a doutrina ideológica, para que o povo se revolte contra as elites; tudo deve ser mudado, todo este dogmatismo liberal, em todos os aspectos, na economia, na política cultural, na política de gênero, mas não deve ser o retorno para trás, e sim o passo em direção ao futuro.
Podemos imaginar a vida depois do liberalismo, depois dos liberais, depois do fim do dogmatismo e do totalitarismo contemporâneo. Podemos encontrar respostas fáceis para salvar a situação, porque a raiz do problema está precisamente no liberalismo. O liberalismo deve ser aniquilado completamente, os liberais não porque não são responsáveis. Precisamos lutar contra a ideologia, contra a ideia, mais que contra a pessoa; não deve ser brutal, deve ser a mudança ideológica e política acima de tudo, e só depois podemos salvar o problema de quem deve governar, não as identidades dos políticos, dos grupos ou partidos, mas as ideias. Precisamos começar com as ideias e mudar o idealismo.
Somente depois poderemos salvar os problemas, quando os liberais deixarem de estar em seus cargos; enquanto nada puder ser mudado, nada absolutamente, este sistema não tem a possibilidade de evolução. Insistirá sobre seus princípios, imigração ilimitada, política de gênero mais extremista, o enriquecimento dos mais ricos até o momento último da catástrofe; esta elite catastrófica leva a Europa ao abismo; para salvar a Europa desta situação devemos destruir o liberalismo, não os ideais, mas a ideologia e a dogmática.
Com isso, também, devemos entender que as raízes desta situação está na modernidade política europeia, o modernismo; a modernidade que destruiu os vínculos com a tradição, o sagrado, a identidade profunda europeia era o começo do fim.
5 De fato, temos visto, durante um tempo, tentativas por parte de diferentes organizações internacionais vinculadas a serviços secretos ocidentais de introduzir esta ideologia na Rússia com a mão das famosas Pussy Riot, por um lado, FEMEN por outro. De fato, FEMEN foi um dos elementos desestabilizadores nos protestos contra Viktor Yanukovitch. Em chave geopolítica, como poderíamos ler a situação na Ucrânia, a ruptura da Ucrânia, a aparição do Estado da Novorrússia, por um lado, e, por outro, a reintegração da Crimeia ao território da Federação Russa, as relações diplomáticas e de inteligência entre Rússia e Europa, isto é, entre Quarta Teoria Política e liberalismo?
Dugin: Na Rússia, os que se opõem a Putin diretamente, como o Pussy Riot ou outros, não representam o perigo, não são perigosos, são muito pouco conhecidos e sua importância é exagerada demais no Ocidente, são nada. Pussy Riot não representa coisa alguma. Neste sentido, nós chamamos isto de quinta coluna e não representa perigo; um perigo maior representa a sexta coluna, que são os liberais que estão em torno de Putin e que não compartilham de seus princípios, seu conservadorismo ou a ideia da soberania. Eles calcularam que não é possível se voltar contra ele diretamente, sem Putin não é possível conservar sua posição, por conformismo são leais, porém são os representantes da rede ocidentalista-liberal pró-atlantista e representa mais perigo do que a quinta coluna.
A quinta coluna não representa tanto perigo, já a sexta sim é perigosa de verdade. Contudo, mais perigosa é a forma geopolítica. Por exemplo, o fato de que temos vencido a situação na Chechênia não apenas com armas, mas que propusemos aos chechenos uma lealdade à Rússia e, ao mesmo tempo, permitimos que conservassem e desenvolvessem sua própria identidade islâmica e étnica etc. etc.
Kadyrov é leal a Putin, não por sua servidão, mas, pelo contrário, pelo cálculo lógico de que Putin é a única possibilidade de assegurar a independência e a identidade dos chechenos, e porque o Ocidente nunca poderia assegurar o mesmo porque está contra a religião, a tradição, a etnicidade e a cultura tradicional. O Ocidente utiliza as minorias para destruir as grandes identidades, mas depois de destruir as grandes identidades, as grandes nações, acabará com as pequenas, após usar os pequenos nacionalismos contra os grandes nacionalismos. Os chechenos entenderam isto perfeitamente, são leais baseando-se no entendimento de seu futuro, porque são tradicionalistas, são muçulmanos, querem conservar sua identidade, e a Rússia, tradicional, eurasianista, permite esta possibilidade.
O que acontece na Ucrânia? Na Ucrânia, a situação é muito difícil, porque, depois do Maydan, começou a guerra civil entre os povos irmãos, que são dois ramos do mesmo povo dos eslavos orientais, pequenos russos e grandes russos. É catastrófica a tragédia organizada pelos ocidentais atlantistas e os elementos extremistas da Ucrânia ocidental; depois da reunificação com a Crimeia e a declaração de independência das repúblicas do Donbass, a situação é muito, muito difícil. Não é a vitória do eurasianismo, a Quarta Teoria Política, não, de modo algum; é uma tragédia, porque a maioria da Ucrânia permaneceu sob o controle da junta de Poroshenko, dos pró-ocidentalistas liberais e neonazistas ucranianos, e a maioria da população sofre esta pressão de Kiev.
Nós libertamos uma parte pequena da Ucrânia, mas seria muito melhor não libertar, e sim ter uma Ucrânia integral, inteira e unificada, porém neutra ou aliada da Rússia. Não obstante, depois do Maydan não era possível contar com sua neutralidade ou amizade, e era necessário realizar os passos que Putin fez, embora não fosse o ideal. Devo reconhecer que teve muitos erros por parte da própria Rússia, que não entendia a importância da Ucrânia e que não desenvolvera uma política efetiva para salvar a Ucrânia como um país neutro ou irmão. A situação de hoje não é boa para os dois povos, porque não corresponde à visão natural, nem é harmônica, porque a Ucrânia está separada internamente.
Estão os que aceitam a junta e os que estão contra a junta ucraniana, que hoje declarou o estado de emergência e a militarização plena em sua guerra contra a Rússia. Mas é uma provocação, porque Poroshenko perde suas posições e não há qualquer possibilidade de ser reeleito, por isso precisa de um estado de emergência para salvar sua posição política; mas, apesar disso, nada está de verdade decidido na Ucrânia, a situação catastrófica está congelada, mas não está, ainda resolvida.
6- O papel de Lukashenko foi muito interessante nas conversações entre Rússia e Ucrânia. Mas me chama muito a atenção uma coisa, e eu gostaria de perguntar sobre isso, e é o fato de que com Crimeia, a Rússia assegura uma posição de superioridade no Mar Negro, porém, realmente, também Sebastopol é o início de uma rota muito interessante que termina em Tartous, na Síria. Estaríamos dizendo que Sebastopol era necessário para assegurar o interesse russo tanto no Mar Negro quanto no no leste do Mediterrâneo, e para poder ter uma rota segura para a Síria, a fim de ajudar o presidente legítimo Bashar al Assad dentro da guerra que está lutando contra os mercenários e grupos terroristas pagos pelo Ocidente?
Dugin: Sim, acredito precisamente nisto, e que a Síria era necessária não apenas para assegurar os interesses estratégicos da Rússia, mas também para acabar com esta hegemonia ocidental de destruição de países árabes; era necessária para poder fim ao unipolarismo, porque os americanos destruíram Afeganistão, destruíram Iraque, sem quaisquer explicações, e depois interviram na Líbia e mataram o presidente Gaddafi, depois começaram a fazer o mesmo no Egito e na Síria.
Era necessário, era absolutamente necessário acabar com isso e demonstra que existem outras potências que não estão de acordo com estas maneiras de intervir onde bem entenderem, matando líderes, querendo impor sua visão vem perguntar as população, criando massas de refugiados, imigrantes, criando o caos, governar com o caos. Rússia interveio na Síria não tanto para assegurar seus interesses nacionais egoístas, mas para pôr fim ao caos organizado ou manipulado que os Estados Unidos e o Ocidente, os liberais globalistas usaram em toda parte com as revoluções coloridas, com as redes apoiadas pelo fanático, totalitário, maníaco, terrorista Soros, cuja organização Open Society é criminosa. Ele apoiou feitos ilegais e se trata de uma organização terrorista, sendo reconhecida em alguns países como organização terrorista, George Soros é mais perigoso que Bin Laden.
É o perigo à estabilidade dos países, à liberdade, à lei, e deve ser julgado. Deve ser preso e julgado por seus feitos, seu apoio ao terror e às mortes da gente, milhões de pessoas que são vítimas das revoluções organizadas com seu apoio, suas redes, seus grupos de influência e financiados por este grande capitalista, é um criminoso número um.
Isso acontece na história: se começas a lutar contra Hitler, pouco a pouco surge um Hitler em ti mesmo. Esta velha história da transformação do herói que luta contra o dragão e se converte ele mesmo em dragão. Soros é a demonstração desta forma de loucura, porque seu antifascismo e anticomunismo pouco a pouco se tornaram fascistas e comunistas, totalitário. Sua luta contra o totalitarismo é totalitária e se transformou na nova forma de totalitarismo. Por isso creio que nossa intervenção na Síria foi a intervenção contra esta forma de governo pelo caos imposta aos países árabes pelo Ocidente.
E era o caminho necessário para a afirmação da ordem multipolar das coisas, e Putin é a forma e a garantia não tanto para o presidente Assad, mas também para todos os povos árabes para elegerem. Podem optar pelos Estados Unidos, pela Rússia ou pela China, com isso obtêm a liberdade de escolha, creio que a Rússia se torna mais e mais o polo mais atraente, simpático quase a todos os grupos no mundo. Os árabes eu vejo, mais e mais, os representantes dos países muçulmanos que vêm para Moscou para encontrar com os representantes russos e estabelecer contatos conosco, e estão muito interessados na Quarta Teoria Política, no Eurasianismo e na Teoria do Mundo Multipolar.
7- De fato, isso explica as boas relações entre a Rússia e outro Estado do Oriente Médio, como o Irã. É mais para os muçulmanos em geral o exemplo da Chechênia como comentávamos há pouco, o respeito que se oferece desde Moscou em relação a Grozny, e como Ramzan Kadyrov responde a este respeito com uma lealdade total. Pois também está penetrando nos países islâmicos, porque, obviamente, a diplomacia russa é muito mais sofisticada, muito menos agressiva que a norte-americana ou liberal, mas, ao mesmo tempo, consegue muitas más coisas; ganha a adesão destes países e, para is terminando, gostaria de perguntar sobre George Soros e sua implicação nesta onde de imigrantes que atravessaram os balcãs desde a Turquia e chegaram no centro da Europa, falamos de entre um e dois milhões de pessoas. Como Soros instrumentalizou este problema dos refugiados e como ele e certos serviços de inteligência penetraram em países europeus e nos submeteram a seus planos de introdução destes refugiados que vêm de fora da União Europeia?
Dugin: Seria, a meu ver, um erro identificar gentes como George Soros como estando a favor do islã e que desejam desenvolver ou fortalecer a influência muçulmana na Europa. Soros é o inimigo jurado de todas as religiões e tradições, dos valores verticais transcendentes do cristianismo, do islã, mas também do judaísmo, porque Soros está muito mal visto em Israel também.
Soros é um fanático dogmático do liberalismo que quer destruir todas as identidades coletivas, todas. Precisamente o livro que é mais caro a Soros é o livro de Karl Popper, que Soros considera seu mestre, que se chama "A Sociedade Aberta e seus Inimigos"; os inimigos da sociedade aberta é a gente que tem religião, pátria, identidade, consciência de classe, nação, valores tradicionais. Todos são representantes para esta ideia do liberalismo radical extremista, eles são os inimigos.
Para destruir a Europa com os valores tradicionais e sua identidade, Soros quer, praticamente, organizar esta corrente de imigração artificial para destruir a identidade europeia, mas com os imigrantes, que representam outras sociedades tradicionais religiosas como islã e outras tradições. Os curdos tradicionalistas, e tenho visitado o Curdistão, são profundamente tradicionalistas, mas quando chegam na Europa, os curdos, afegãos, árabes, africanos, sírios, todos, todos perdem sua identidade e começam a se dissolver em sociedade pós-moderna, liberal, de gênero, perdem sua religião ou transformam esta religião na forma radical, na caricatura do islã.
Porque o islã, sem o ambiente cultural oriental, se transforma em uma caricatura, um simulacro. Precisamente esta é a ideia de Soros e suas redes, destruir ambas as identidades. Destruir a identidade da sociedade europeia com os imigrantes de identidades opostas ou diferentes, e assim também destruir a identidade dos povos tradicionais do Oriente, como muçulmanos principalmente, ou ainda africanos, com esta confusão na sociedade pós-moderna europeia. Depois de voltar da Europa para seus países, os imigrantes levam com eles também os aspectos desta pós-modernidade que destrói sua identidade. Soros quer destruir todas as sociedades tradicionais, todas as identidades coletivas, porque a identidade coletiva é o inimigo maior da sociedade aberta.
É seu fanatismo, mas Soros é muito forte que representa parte do governo mundial, sua força não é tanto seu dinheiro, mas seus princípios liberais. O liberalismo é uma ideologia criminosa, e Soros é um dos manipuladores, por detrás dele estão Rothschild, Rockefeller, os grandes monopólios globais, o governo mundial que em sua campanha eleitoral Trump declarou que esta era a coisa mais poderosa, maior que o presidente dos Estados Unidos. A organização é mais forte que os Estados Unidos, seu exército... sua estrutura é mundial, a seita dos globalistas, e Soros é um dentre os quais controlam toda a terra atualmente.
Por isso têm também relações com os serviços secretos, governos e chefes dos Estados que são seus escravos. Macron foi posto por Rothschild, Macron é um algoritmo. O homem é um servo, uma forma de ordenador, é virtual, criado por gente como Rothschild e Soros, por isso a maioria dos deputados europeus estão pagos por Soros, para promover a agenda de destruição das identidades coletivas, por isso é muito perigoso.
Os povos não são livres até o momento em que este governo mundial caia, precisamos lutar todos contra este governo em todos os países. Temos o governo italiano, temos na Hungria a Orban, temos Vladimir Putin com o apoio do povo russo, temos Irã, temos em novo curso Erdogan, temos a grande China que representa a potência, a segunda economia do mundo, que rechaça e nega esta hegemonia unipolar, este globalismo ocidental. Temos Trump, Bannon, temos a revolução da América profunda que se mostrou nas eleições de Trump, temos muito, mas não devemos subestimar sua força atual.
Os grupos do Soros são muito poderosos, podem influenciar os governos. Tenho esperança de que um dia na Espanha também apareça a frente populista comum entre a direita populista e a esquerda populista, mas precisará superar o antifascismo e o anticomunismo, porque servem aos liberais para dividir entre os populistas de direita e de esquerda, portanto em luta comum contra os liberais, os populistas podem ter vitória.
8- Para ir terminando, por exemplo, desde a frente liberal, desde a União Europeia, existe uma tendência de alarmar a população sobre o papel da Rússia, sobre a infiltração da Rússia na U.E., o papel da Rússia no movimento de extrema direita, movimentos de extrema esquerda, no nacionalismo catalão etc...., mas quando nos atemos aos fatos, vemos que o peso dos lobbys em Bruxelas recai sobre os Estados Unidos, apenas Rússia tem presença em Bruxelas ou Londres. Temos que ver, por exemplo, que a União Europeia está fagocitada pela CIA e pelo MI6. Ao mesmo tempo, qual é a maneira que a Rússia terá de aumentar sua presença na Europa Ocidental? por exemplo, temos o canal Russia Today, mas essa presença da Rússia aumentando na Europa Ocidental não pode fazer com que os liberais busquem uma guerra com a Rússia, que estão desejando-a, atendendo aos fatos que estamos vendo com a expansão da OTAN em direção a leste, a presença da OTAN na Estônia, Letônia e Lituânia e a situação na Ucrânia?
Dugin: Sim, é tradicional para os criminosos dizer que as vítimas são os criminosos eles mesmos, por isso os serviços secretos britânicos que se ocupam das fakenews, de acusar a Rússia de intervir nas eleições, apoiar os movimentos radicais. São eles que fazem estas coisas, que se ocupam da desinformação, da propaganda, das provocações etc. etc. isso é tradicional.
Eles querem fazer da Rússia o monstro ou o inimigo, dizendo que a Rússia quer dominar a Europa Oriental e Ocidental etc. etc., todos estes mitos existem para não mostrar diante dos olhos dos europeus o verdadeiro inimigo, que são os liberais. Querem mobilizar a consciência europeua contra a Rússia porque não representa qualquer perigo, não representa tampouco a salvação nem a alternativa, entretanto, o que é seguro é que a Rússia não representa perigo.
Se não representa o perigo, qual é o grande problema? Pois é o governo que é completamente incapaz de satisfazer os interesses dos povos, e Rússia não têm nada que ver com tudo isso, por isso creio que os europeus conscientes devem compreender que se trata de propaganda pura, mas não de propaganda russa, porque os russos não estão promovendo propaganda. Russia Today e outros meios dizem mais verdades, mas não se trata de propaganda. Não dizem que Rússia é o melhor de tudo ou que as ideias da Rússia devem ser aceitas pelos demais, nada que ver com a propaganda liberal, a propaganda comunista ou fascista.
A Rússia se defende com esses meios e também mostra outra versão, outra posição, não é propaganda. É muito neutro. Creio que importa compreender mais e mais uma coisa: o que de fato a Rússia pode ser -- não é amiga da Europa ainda, não é inimiga nem o perigo. O perigo maior são os liberais. Depois de entender isto, amar ou odiar a Rússia não importa nem para os russos nem para os europeus. A Rússia é uma civilização à parte, ao lado.
Pode provocar interesse, simpatia, amor, ou pode ser totalmente indiferente para os europeus, mas qual é a verdade concreta? que Rússia não representa perigo. Não quer e não pode invadir a Europa ou submeter a Europa Oriental, não temos tantos desejos ou capacidades. Não queremos e não podemos fazer isto. Não somos mais comunistas nem imperialistas, somos russos que queremos defender nossa identidade e nossa soberania nacional -- e isso é tudo.
Isso é mais importante, mas é verdade que, depois disso, o problema europeu se tornará totalmente diferente, o problema serão os liberais, o governo mundial da maneira que não corresponde aos interesses de seus próprios povos. Por isso creio que não são o problema os grupos extremistas. Os verdadeiros extremistas são a gente do Soros, são os liberais que organizam e utilizam, às vezes, estes grupos como utilizam o radicalismo islâmico, wahabismo, salafismo, fundamentalismo, muçulmano para chegar a seus próprios interesses e ter a razão de intervir em todos os países para desestabilizar a situação nas sociedades. Eles são os verdadeiros criminosos, a Rússia é o poder neutro que luta para sobreviver e pelo mundo multipolar -- não bipolar, mas multipolar, o que é muito importante.