domingo, 11 de novembro de 2018

Neomania -- A Obsessão pelo Novo

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Por Roberto Pecchioli

A obsessão por tudo que é novo é uma das mais surpreendentes características da nossa época. É uma mania, uma verdadeira e própria patologia de massa, uma doença da alma, a neomania. E estão conscientes disso também os intelectuais do campo progressista. Escrevia o comunista ortodoxo Alberto Asor Rosa há vários anos atrás: vivemos um presente caracterizado pela ausência de uma regra e pela presença de muitas regras transitórias. Tudo deve sempre ser novo, inédito. O psicanalista Massimo Recalcati observa em uma página que confundimos o "novo" com o diverso, uma fuga do "mesmo" que nos entedia, cuja tensão com qual nos impulsionamos em direção ao novo é uma fuga de uma carência, de uma ausência que nos aflige.

Ainda mais explícita é uma passagem de uma antiga Enciclopédia da Moda, segundo a qual "é com o advento da sociedade capitalista que coincide o surgimento daquele tipo de obsessão pelo novo, ou neomania, da qual a moda de vestidos representa um dos aspectos mais vistosos". Trata-se de uma verdade parcial, cujo núcleo da questão escapa.

A mania pelo novo é filha da ruptura antropológica da modernidade com todo o passado, o símbolo e a consequência da perda da dimensão espiritual e transcendente do homem ocidental. A busca constante pela novidade se torna um antídoto contra a angústia para uma humanidade privada da parte mais elevada de si mesma, um efeito placebo que impõe doses sempre mais altas do "novo". Um vício extra, que exorciza a ansiedade e a falta de sentido, criando um eterno presente.

Albert Camus intuiu alguma coisa, para quem o futuro é a última transcendência do homem sem Deus. O autor de O Estrangeiro e A Peste, ateu, não podia reconhecer que todo o futuro, para o homem moderno, é a porta aberta para o Nada. É o Novo o verdadeiro substituto da transcendência, o substituto da esperança perdida dos indivíduos transformados em elementos estatísticos (Gabriel Marcel), que sofrem de angústia, "a disposição fundamental que se coloca diante do Nada" (Heidegger). Condição da modernidade falsamente iluminada pelas Luzes, a descarga de adrenalina obrigatória que consente em suportar a insatisfação do presente sem precipitar no escuro.

Neste vazio existencial se insere a psicologia de massa da sociedade de consumo, que produz insatisfação ao vender desejo, irmão espúrio do futuro. Se nos mudamos frequentemente, se a mudança a consideramos positiva a priori é porque procuramos algo que não é encontrado, que na verdade não deverá ser encontrado. O objetivo do novo é a viagem, o panorama sempre diverso do viajante em fuga de si mesmo. Ele não suporta o vazio, saturado de abundância de objetos. O desejo do novo é a expectativa do gozo que não será satisfeito, resignado ou disponível para experiência ulterior, "novo", mas em verdade o desdobramento do idêntico. A experiência sempre renovada é aquela do consumo, ou do desperdício, do exaurimento, da dissipação.

Grotesca é a atitude dos fãs de novidades tecnológicas, prontos para encarar filas quilométricas para garantir os primeiros exemplares dos aparatos que em poucos meses serão substituídos por novos e mais novos. Bárbaros induzidos a recomeçar pela pobreza da experiência ultrapassada e não vivenciada, indiferentes à evidência que o novo brilhante se torna em breve se torna antiguidade e às vezes faz o velho reaparecer sob novas formas, na pós-modernidade fatigada e pouco criativa, exaurida em ideias, reduzida a reforma, remake, imitação, do modo como a arte depois do Renascimento. O novo detesta o silêncio, a introspecção, antecâmeras da angústia. Sua forma é o ruído indistinto, o zumbido confuso de vozes, porque o novo tem a obrigação de romper o silêncio.

A neomania é compulsiva e neurótica como a triunfante sexualidade do consumo. Mudar de cônjuge para viver uma experiência nova, tratando a si mesmo e o outro como coisa, objetos de consumo. Tudo envelhece cedo, ninguém parece longe, a dimensão do espaço e do tempo se confundem. A neomania é também a adoração de um ídolo, o Progresso, cujo culto coincide com aquele da Razão. Ele não deve ser discutido e menos ainda limitado, sua marcha é imparável; o novo é bom mesmo se amanhã ele já estará velho. Tudo deve ser feito segundo a nova moda, a nova descoberta, a nova tecnologia, ao modo hodierno, significado literal de uma palavra eternamente ambígua, modernidade. Em um poema famoso, Addio, o poeta simbolista Arthur Rimbaud o sintetiza em versos dramáticos: "Deve-se ser absolutamente moderno. Apenas cante: segue o passo. Dura noite! O sangue seco esfumaça em minha volta, e não há coisa alguma atrás de mim". De fato, o novo não tolera nada atrás de si, pretende tábula rasa para seu breve triunfo.

O novo tem por missão induzir em tentação, prever a tentação contra a qual não é concedido resistir. Nisto consiste o livre arbítrio de hoje, dar um consenso entusiasta e efêmero a toda novidade, evitando a tomada de sentido, a reflexão sobre o bem e sobre o mal. Qualquer coisa que podemos tecnicamente fazer deve ser feito e experimentado. No máximo, a questão é: posso me permitir? A resposta está também ela mesma no novo. As fórmulas de consumo de dívida mudam continuamente e promete acesso ao mundo brilhoso da última descoberta, do produto "definitivo", aquele 2.0. Passada a festa, clamou o santo: chega o modelo 3, depois 4.0 e a roda continua. É essencial que a nova ideia, os novos bens, o comportamento inédito quebrem temporariamente a solidão de tantos indivíduos idênticos que se sentem únicos. A idolatria do novo resulta em desprezo pelo passado. A escuridão por definição, povoada por homens e mulheres sem um telefone e inconscientes da conexão online, produz um particular tipo de angústia: eu não estava lá, no passado; esta insustentável ausência do "eu" é uma característica desconhecida para outras épocas. A única terapia é a remoção forçada através da descarga elétrica da novidade.

Pelo contrário, o princípio fundamental da vida é a conservação, a tendência que em biologia se define homeostase, ou a inclinação natural à realização de uma certa estabilidade interna e comportamental, uma disposição que une todos os viventes mesmo que as condições externas mudem. Na política como na cultura, depois da Revolução Francesa o conservador é zombado, declarado anacrônico (a obrigação de estar "à altura dos tempos"), a definição mesma é uma condenação preventiva, um meio de excluir do debate. John Stuart Mill, um dos patriarcas do liberalismo, definiu os conservadores como "o partido estúpido". A neomania é uma naturalização progressista, convencida da perfectibilidade ilimitada do homem e das coisas. Ela não crê no limite do homem, na sua imperfeição, e assim está necessariamente em guerra contra a natureza. Ela torna absurda a ideia de que existem princípios permanentes.

O novo impõe a transgressão, isto é, a violação do comportamento comum. Seus adoradores transgridem disciplinadamente seguindo as regras "novas", em uma corrida ridícula para romper [com a normalidade], transformada em conformismo inconsciente. A ordem, o ético, o civil, natural, pessoal, é detestado como expressão da estabilidade. Vêm aplaudir os falsos profetas que proclamam a relatividade de todo princípio, sustentando que todos provêm da vontade e do desejo. O paradoxo é a exaltação do último valor na ordem do tempo, o mais "novo".

Odiar tudo que é permanente gera instabilidade, destrói todo padrão elevado e reduz o mundo pretensamente civilizado ao satisfazer os fúteis e momentâneos desejos materiais, sem distinção entre necessidades, direitos, caprichos, esquisitices e impulsos infernais. O chamado à razão humana como único critério de juízo se resolve no seu contrário, uma irracionalidade arrogante que nega a tendência natural da humanidade à violência e aquilo que uma vez se chamava pecado. A razão se transforma em instinto, o determinismo se torna guia para o bem social, a religião vem a ser refutada e as mais diversas ideologias e crenças tomam o seu lugar. Além disso, desde que tem a auréola do novo, o homem que não crê em nada está disposto a crer em tudo (Chateaubriand, O Gênio do Cristianismo).

O novo, enfim, se tornou um direito. Isto de tomar qualquer coisa como sendo a mesma, lançando alto todos os dias o impulso do desejo. Tudo deve ser "avançado", como a tecnologia atual, cujo destino é se tornar atrasada com a próxima descoberta, a futura explicação que, enquanto "nova", será objeto de insatisfação daquele que não a possui, de inveja e de desejo. Está claro a degeneração de todo sentido moral em um mundo dominado pelo novo. Qualquer ética tem o defeito de ser persistente, de se crer verdadeira e permanente, de imprimir um sinal forte.

Alguns elementos da neomania surpreendem mais do que outros. A renovada popularidade das tatuagens, por exemplo, pode ser explicada pelo o desejo de se ser criador de si mesmo a partir do aspecto exterior, mas como se se concilia com a permanência durante a vida da tatuagem? Evidentemente, o impulso gregário do conformismo é potentíssimo, ou a confiança no "novo" é tão difundida que convence que as futuras tecnologias permitirão que se remova o nome dos cônjuges não mais amados, as frases que eles não gostam mais, os símbolos caídos em desgraça. Além disso, o objetivo é sempre a emancipação, a liberação das velhas crenças e dos juramentos do passado.

O amante do novo prensa que se alegra e deseja em plena liberdade, com autossuficiência e auto-governo de si. Ele não suspeita de estar submetido a novos ídolos e de ter decretado a vitória do Id, segundo Freud a força impessoal que "vive" e contém as pulsões agressivas e autodestrutivas. A aplicação, da parte do sistema de poder político e econômico, da descoberta da psicologia de massa, determinou uma aceitação geral de tudo que é novo como sendo melhor, fruto do progresso, da liberação humana. Um reflexo condicionado positivo é alimentado a respeito de qualquer inovação, pronto para dissolver a resistência ligada aos princípios morais e para construir um sentido comum orientado para o consumo, para o desejo, para o instinto dos pulsões.

Na espécie humana largada por si mesma ou condicionada a responder unicamente ao instinto -- pelo qual é exonerada através da civilidade, a abertura à transcendência e a adesão racional ao verdadeiro e ao justo -- os desejos são vorazes, ilimitados e por vezes sanguinários. A razão abstrata, que se tornou universal para o propósito da dominação e do enriquecimento, produziu uma irracionalidade difusa fundamentada no desejo compulsivo do novo: a neomania. O homem comum é induzido a confundir os direitos com os desejos, a perseguir a indisciplina espiritual, a refutar o senso do limite e a negar a validade de qualquer princípio geral. O conformismo mais deprimente é chamado de juízo pessoal, a disciplina consumista e novista é chamada transgressão.

Sobre todas as coisas, reina uma mania de refutar tudo que é considerado antigo, exaurir, jogar fora. Abandonado o velho, o novo é rapidamente consumido; não resta nada senão desfazer-se, jogá-lo no aterro material e espiritual que nos circula, mas que não percebemos mais como tal. A luz do novo a ser mordido e consumido brilha como um poderoso farol que impede a vista de tudo que está em torno de seu raio, engolido por uma sombra da qual nos retiramos angustiados, em busca de uma alternativa capaz de afastar os pensamentos ruins, de uma aceleração do desejo, do novo que promete um outro início; e o jogo continua.

O novo enfatiza o movimento; pouco interessa a direção e o sentido. Isto entendeu Goethe em sua época, que fez Fausto dizer, o homem febril, o primeiro conscientemente apaixonado pelo novo que avança, dizer "no início era a Ação", destronizando o Verbo, Deus, o permanente. A adoração do novo caracterizou a arte do início do século XX, abolindo as formas clássicas e a mesma figura humana. A novidade enquanto tal foi o programa do futurismo. O manifesto de Filippo Tommaso Marinetti de 1909 inicia com uma afirmação que atravessa toda a civilização ocidental sucessiva: afirmamos que a magnificência do mundo é enriquecida por uma beleza nova: a beleza da velocidade.

A palavra-chave do adjetivo novo e o substantivo velocidade. Reunidos, eles representam o único polo sobrevivente da nossa decadente civilização. Tudo deve ser novo e rápido, ao "tempo real", o imediato da informática. As leis do homem não escapam ao ataque. Nada é destinado a durar, o reformismo é louvado a prescindir, mudar, renovar é o gesto de que se projeta "adiante". Duradouro é um vocábulo indesejável, primeiro aos padrões do mundo, interessados em que as ideias e coisas se tornem logo obsoletas. É claro que se o novo é mais veloz do que o antigo, desvanecerá facilmente em algum momento, muitas vezes antes que se possa avaliar os efeitos, com o risco de extraviar o lado positivo daquilo que muda.

Enfim, paira sobre o novo um materialismo sufocante, a obsessiva aspiração ao apagamento dos sentidos, à mediocridade justa de si mesma, à dissolução de todo vínculo. É como se fôssemos nus de alma e nos despíssemos com pressa para nos libertarmos, não as roupas, mas nossa história e nossa personalidade, a fim de assumir uma nova para todo o dia, Zelig compulsivo forçado à novidade. O grande romancista escocês Walter Scott, estandarte do pensamento conservador, previu o resultado da neomania já na primeira metade do século XIX: "poucos são melhorados, muitos são piorados. Nossos desejos se multiplicam e estamos aqui para lutar com cada vez maiores dificuldades graças à força de repetidas invenções. Ao fim teremos que devorar uns aos outros, ou, como outrora, haverá na terra a queda de um cometa?"

A resposta está na obstinação desesperada com a qual algum homem conserva a certeza que em princípio não era a ação ou a matéria em movimento, mas o Verbo. A mania do novo, a mudança a todo custo produz o sono da razão e o precipício do espírito. Lucifer mesmo era um belíssimo anjo cadente e a verdade, dizia Nikolay Berdyaev, é o redespertar do espírito no homem. O velho que salva.