terça-feira, 31 de março de 2015

Os Demonizados Filósofos Preferidos de Putin

Prefácio por Alexander Mercouris

Publicamos este longo artigo inteiro não só porque intelectualmente falando é algo brilhante, mas porque contém ideias excepcionais tanto sobre a Rússia como sobre a política externa dos EUA e seus métodos utilizados por alguns apoiadores de sua política externa.

Antes de comentar sobre os pontos feitos no artigo, faríamos um pedido de atenção: deve haver alguma dúvida sobre a verdadeira extensão da familiaridade de Putin com os três filósofos discutidos no artigo.

Contrariamente à sua imagem no Ocidente, Putin é altamente educado e um homem muito lido que conhece trabalhos acadêmicos de história e música clássica.

Se ele tem tempo ou inclinação para se familiarizar com o muito complexo e difícil material contido nos trabalhos dos três filósofos discutidos nesse artigo é outra questão. É mais provável que Putin tenha conhecido estes filósofos de resumos providenciados por seus assessores do que por estudo pessoal.

Pondo este ponto de lado, o artigo faz um válido e importante apontamento - os filósofos que Putin aprova são genuínos pesos intelectuais, cujas ideias não se explicam em um programa ou diagrama para uma agressiva, expansionista, etnocêntrica, autoritária e "mssiânica" Rússia, como os críticos de Putin alegam, mas, pelo contrário, de uma forma diametralmente oposta.

Conforme o artigo afirma, os filósofos sob discussão foram altamente reconhecidos no Ocidente até que Putin os apoiasse. No momento - mas não antes - suas ideias de repente se tornaram "perigosas" e "sinistras".

Isso nos traz ao nosso ponto. O artigo mostra como cinicamente as ideias dos três filósofos estão sendo mal representadas com fim de provar a tese de uma Rússia perigosa, agressiva e autoritária.

O tipo de des-representação não é mais a exceção, mas a regra.

Como um princípio geral nenhuma citação de Putin ou de algum outro oficial ou político proeminente russo que aparece na mídia ocidental pode ser assumida como verdade. Dada a agenda implacavelmente hostil anti-Putin e anti-Rússia que agora domina os comentários ocidentais, qualquer citação é quase certa de ser distorcida e até mesmo através de más traduções ou serem tomadas fora de contexto.

A situação é agora tão ruim que mesmo alguém como um sênior como o anterior presidente da comissão europeia irá deliberadamente citar frases distorcidas que Putin lhe contou em conversa privada. Recentemente ficou claro que algumas citações atribuídas a Putin foram inventadas por seus críticos ocidentais.

O que este artigo mostra é que o processo agora se estende não apenas aos russos vivos como Putin, mas também aos intelectuais russos que já há muito morreram. Parece que as palavras de qualquer russo, vivo ou morto, são agora um jogo de sorte para aqueles no Ocidente que querem convencer os outros de que a Rússia é uma ameaça ao Ocidente. Isso é um processo muito sinistro, que faz (e que busca fazer) um entendimento com a Rússia ser totalmente impossível. Nota do inteligente comentário de Dr. Grenier sobre isto:

"Os críticos dizem que a Rússia recentemente se tornou uma nação cheia de ódio. Mas como estão os cidadãos russos e o presidente Putin por verem distorcidas (e o que vimos acima é apenas a ponta do iceberg) suas próprias palavras e suas mais caras tradições de um modo aparentemente rancoroso e até mesmo violento?"

Isto no entanto não é o pior.

Um tal crescente impiedoso de manipulação das palavras e ideias de pessoas há muito mortas pode ser muito bem chamada de Owelliana.

Pessoas que mostram um tal desrespeito pela verdade são perigosas. Ao engajar-se em falsidades tão cínicas eles revelam de onde vem o real perigo para a paz mundial. Eles também expõem quem é realmente responsável pela desastrosa relação entre Rússia e Ocidente.

Isso também mostra a propósito que qualquer coisa que uma pessoa diz simplesmente não pode ser invocado como verdade salvo a extensão que serve aos seus propósitos políticos. Quando eles portanto dizem coisas como "o exército russo está invadindo a Ucrânia" não há mais razão para acreditar neles do que quando eles dizem que pessoas como Putin ou Solovyov disseram coisas que eles de fato não disseram.

Dr. Garnier, o escritor deste artigo, é claramente consciente disto. Um outro modo no qual este artigo se posiciona é na sua compreensão do pensamento ideológico e ultimamente corrupto daqueles que estão por trás da política externa dos EUA. Considere isso um resumo muito brilhante no fim do artigo com seu implícito pedido de atenção do incipiente totalitarismo do atual pensamento dos EUA:

"... se o ideal político da América é quase tão perfeito que pode ser alcançado neste "mundo decaído", então a coisa vai adiante e vence, desse modo trazendo o bem perfeito (somos nós!) para todos.

Por que preocupar-se seriamente em familiarizar-se com um sistema competidor? Claramente Brooks and Co. não fazem nenhum esforço. Foi o bastante para eles saber que o ideal político da Rússia significantemente difere do americano: logo é ilegítimo, Q. E. D.

Conforme Hannah Arendt escreveu em The Origins od Totalitarianismo, "a curiosa logicalidade de todos os ismos, sua simplista crença no valor de salvação da teimosa devoção sem consideração por fatores específicos e variáveis, já acolhe os primeiros germes do desprezo totalitário pela realidade".

Essa América realmente não vive seus próprios ideais, como tenho escrito anteriormente, não muda nada para o ideólogo. Afinal, todo aumento no poder da América traz mais perto o dia em que suas ações (que são geralmente realistas) e seu discurso (que é sempre democrático e idealista) podem encontrar harmonia. Então a história pode verdadeiramente e finalmente terminar."

Este artigo originalmente apareceu em Consortium News. Anteriormente apareceu na Johnson's Russian List.

DEMONIZANDO OS FILÓSOFOS PREFERIDOS DE PUTIN

O que deu início à Guerra Fria? De acordo com o Departamento de Estado, foi a violação ilegal da Rússia das fronteiras nacionais ucranianas. O Kremlin, por sua vez, insiste que foi um golpe na Ucrânia facilitado pelos EUA, que destruíram a ordem constitucional por lá, causando caos e perigos à segurança russa, em vista do quê a Rússia não tinha o que fazer senão responder.

De acordo com a política externa "realista", a causa foi a iminente ameaça da integração ucraniana em um pacto expansivo dominado pelos EUA. De acordo com George Friedman, presidente de Statford, empresa privada de inteligência estratégica, a crise ucraniana é mais efeito do que causa: o conflito começou em 2013 quando os EUA decidiram que o aumento do poder russo estava se tornando uma ameaça.

E de acordo com Kiev, o presidente Vladimir Putin criou toda a crise. Ele inventou a ameaça do "fascismo" ucraniano e foi motivado por uma combinação de ambição imperial com medo de democracia.

Não é meu objetivo aqui tentar julgar entre as alegações acima. Apesar das óbvias diferenças, elas também compartilham de um traço comum: ninguém fornece qualquer direção clara de como resolver essa bagunça. É hora de nos aproximarmos disso de um ângulo completamente diferente.

Quando a primeira Guerra Fria terminou, Francis Fukuyama explicou, mais em tristeza do que em triunfo, que o modelo capitalista liberal-democrata americano venceu e que este foi o motivo da "história" - a luta para encontrar a resposta correta para a questão política considerando a forma ótima de sociedade - terminou.

O que venceu, de fato, foi um tanto de respostas para questões-chave da vida política como a origem e propósito do Estado; o que significado ser humano; o que fazem os humanos todos, ou o que deveriam fazer, empenhar-se. As fontes clássicas das respostas especificamente americanas para estas questões são bem conhecidas: são as fontes da política liberal pensada enquanto tal.

Eis uma outra coisa bem conhecida a ponto de ser um clichê: desde 2001, a tese do fim da história foi repetidamente mudada por acontecimentos. Ns verdade, a tese de Fukuyama não pode ser desafiada por meros acontecimentos, porque ele nunca disse que dissabores deixariam de ser parte da experiência humana. Ele disse que os humanos improvavelmente se engajariam mais efetiva e atrativamente em compromisso com a solução para a chave das questões políticas do que para as fatigadas respostas que formaram o mundo liberal, democrata e capitalista.

Para aqueles que assinalam que o Estado Islâmico desaprovou esta tese de "fim da história", Fukuyama poderia responder com razão: "Bem, se você achar que este tipo é atrativo, você pode aceitar minhas congratulações".

Mas eu estou escrevendo não para defender nem atacar Fukuyama. Estou simplesmente sugerindo que não estamos fazendo favor algum a nós mesmos ao ignorar todas as respostas para as questões políticas que diferem da ortodoxia liberal. Pode haver no liberalismo e na democracia e no capitalismo muito de correto, mas há muita razão para suspeitar que ainda não descobrimos nem a verdade nem sobre os seres humanos ou sobre o homem político.

O próprio Fukuyama oefereceu sua própria critica: seu ceticismo sobre o material humano é que fez colocar seus pensamentos tão devagar. Não é necessariamente uma crítica de Fukuyama salientar que há muitos no mundo hoje que aspiram por algo além do nosso mundo de autonomia confortável e de posse de direitos no sentido puramente lockeano.

Entre aqueles que aspiram muitos estão no mundo eslavo, com suas raizes no Cristianismo Ortodoxo Oriental; ou na esfera chinesa, com sua herança confuciana que está apenas despertando; e claro, no Oriente Médio. E isto é apenas para nomear os grupos que os EUA identificaram como necessitados de reformas.

Diversidade e Liberalismo

O Ocidente, e especificamente os EUA, tem diante de si uma escolha fatal: deveriam procurar uma coexistência "live and let die" [viva e deixe morrer] das nações liberais e não-liberais do mundo, ou deveriam tentar fazer do resto do mundo liberal uma mão armada, e nesse sentido provar realmente que a história chegou ao fim? Deveríamos nós tornar o mundo a salvo para a diversidade, ou deveríamos tornar o mundo uniforme para a segurança dos EUA?

No Oriente Médio a escolha já foi feita. É para torná-lo um braço armado liberal e democrata. As enormes dificuldades que isto apresentou convenceram o partido de guerra americano, que pareceram ser maioria, que é hora de dobrar e se fortalecer, não só no Oriente Médio, mas agora no mundo eslavo também.

Isto traz uma questão crucial sobre diversidade e diferença. O que torna uma nação ela mesma e não algo mais? É a presença das fronteiras? São as eleições sob o poder humano? Claramente, não é nenhuma dessas coisas, nem nada parecido.

Ser uma nação autêntica, continuar existindo de fato, significa exatamente continuar a realizar sobre o tempo sua própria ideia nacional, ou seja, como Ernst Renan pôs (Qu’est qu’une nation?, 1882, conforme citado por Hannah Arendt), "preservar dignamente a herança indivisível que foi mantida até então".

Que nações frequentemente emprestam conteúdo cultural de outras é inegável, e muitas vezes louvável. Mas é crucialmente importante, como notou uma vez o historiador americano William Appleman Williams, quem faz a escolha destes empréstimos. Eles são adaptados livremente de dentro, ou são forçosamente impostos? A falha para compreender esta distinção é o que continua acarretando A Tragédia da Diplomacia Americana (também o título de um livro de William).

Quando nações totalmente compartilham da visão liberal americana, estas nações separadas se tornam, em um certo sentido, não mais "separadas". Isto é necessariamente algo ruim. As nações do norte da Europa não sofrem tanto por sua próxima aliança com os EUA,  inclusive no sentido cultural.

Mas aqui está a questão dos seis trilhões de dólares: os EUA estão tentando mascarar a existência, em base permanente, dos outros grandes poderes que não aceitam os valores liberais como a América os define? Digo "grandes poderes" porque a longo prazo só um grande poder, ou um protetorado de um grande poder, pode assegurar a continuidade de sua existência.

O status não-liberal da Rússia foi apresentado recentemente como uma horrenda ameaça à segurança tanto da América como do mundo. Em apoio dessa linha historica, o presidente russo foi associado com pensadores do passado russo que foram, supostamente, a fonte de um fanatismo que justifica falar de Putin e da Rússia (os dois são mesclados juntos em uma interminável repetição "Rússia de Putin") no mesmo sentido do Estado Islâmico.

Mas as ideias dessa Rússia não ou não-inteiramente-liberal são de nenhum modo perigosas. Pelo contrário, oferecem um caminho frutífero para repensar algumas das nossas mais queridas suposições sobre a natureza da política e a natureza da ordem internacional.

Passado e Presente

Quando o comunismo foi abandonado nos fins de 1980 e início de 1990, ficou evidente para pensadores russos e estrangeiros que um novo conceito de Estado, um novo conceito de homem, e uma nova pública filosofia deveria ser criada. Foi então, e permanece hoje, uma questão aberta de que se a nova identidade russa acabaria por ser importada do Ocidente, algo tirado do pensamento filosófico pré-comunista, ou talvez uma combinação das duas.

Como pode ser esperado do país que trouxe ao mundo Dostoievsky e Tolstoy, quando se chega à filosofia, a Rússia tem uma profunda banca. Nos meses imediatamente seguintes de fevereiro de 2014 muda o poder em Kiev, e resulta a crescente tensão entre Washington e Moscou, três filósofos russos, só dois deles amplamente conhecidos fora da Rússia, vieram a ser cada vez mais associados com o nome de Vladimir Putin. A interpretação subsequente desses filósofos nas páginas de muitos dos jornais mais influentes dos EUA merecem ser consideradas em detalhe.

Maria Snegovaya, uma doutoranda em ciência política na Universidade de Columbia, iniciou a discussão com um artigo em 2 de março de 2014 no Washington Post. "A visão de mundo pró-soviética de Putin", escreveu Snegovaya, é pobremente compreendida:

"Para entender... precisa-se checar o que são as preferidas leituras de Putin. As preferidas incluem um monte de filósofos nacionalistas russos do início do século XX - Berdyaev, Solovyev, Ilyn - que são muitas vezes citados em seus discursos públicos. Ademais, recentemente o Kremlin especialmente salientou aos governantes regionais da Rússia que lessem os trabalhos desses filósofos durante as férias de inverno de 2014. A principal mensagem desses autores é o papel messiânico da Rússia na história mundial, a preservação e restauração das fronteiras históricas russas e da Ortodoxia".

Mark Galeotti, escrevendo na Foreign Policy ("O Império Mental de Putin", 21 de abril de 2014) também encontrou defeitos nesses mesmos três filósofos. "Esses três, a quem Putin costuma citar", escreve Galeotti, "exemplificam e justificam a crença [de Putin] no posto especial da Rússia na historia. Eles romantizam a necessidade de obediência ao forte governador - seja manipulando os boiardos ou defendendo o povo da corrupção - e o papel da Igreja Ortodoxa em defender a alma russa e o ideal russo".

Finalmente, David Brooks, escrevendo para o New York Times ("Putin não pode parar", 3 de março de 2014), do mesmo modo expressou alarme sobre a influência de Solovyov, Berdyaev e Ilyn. "Putin não apenas cita estes caras; ele quer que outros os leiam", escreve Brooks. Três ideias principais unificam os trabalhos de Solovyov, Ilyn e Berdyaev. Brooks escreve:

"O primeiro é o excepcionalismo russo: a ideia de que a Rússia tem seu próprio e único status espiritual e propósito. O segundo é a devoção à fé ortodoxa. O terceiro é a crença na autocracia. Misturados juntos, estes filósofos apontam uma Rússia que é uma autocracia nacionalista quase-teocrática destinada a desempenhar um papel no mundo".

Sob a influência desses "caras", Brooks continua, "O tigre do nacionalismo quase-religioso, que Putin tem montado, pode agora tomar controle. Isso torna as coisas muito difíceis para Putin parar neste conflito onde o cálculo racional lhe mandaria parar." Brooks conclui que a Rússia pode não mais ser considerada um regime "normal" e que "um conflito huntingtoniano de civilizações com a Rússia" pode ser o resultado.

Analisando os Analistas

O que somos nós para fazer algo com estas análises, todas elas publicadas em jornais autorizados dos EUA? Uma coisa é certa. Essas afirmações representam uma enorme e surpreendente reviravolta no ponto de vista da opinião educada no Ocidente, particularmente com relação a Solovyov e Berdyaev (com Ilyn, conforme já afirmado, sendo muito menos conhecido).

Até estes artigos, em março-abril de 2014, eu não lembro de ler uma única afirmação negativa de qualquer um desses pensadores, pelo menos não entre especialistas ocidentais, nem um único indivíduo acusando-os de serem hostis ao Ocidente, ninguém sugerindo que eles são amigáveis ao chauvinismo ou nacionalismo russo.

Em Russian Thought after Communism, James Scanlan, um importante especialista ocidental do pensamento russo, descreveu Vladímir Soovyov (1853-1990) como "por consenso o maior e mais influente de todos os pensadores filosóficos da Rússia". Em algo recente da Imprensa da Universidade de Cambridge sobre a história da filosofia russa, Randal Poole escreve que "Solovyov é amplamente considerado como o maior filósofo da Rússia".

Há, é verdade, dissidentes de mão cheia dessa unânime aceitação de Solovyov. O filósofo russo contemporâneo Sergei Khoruzhy considera Solovyov um muito grande filósofo, mas muito ocidental em orientação para merecer o título de grande pensador russo em sentido estrito.

Ademais, até mesmo intelectuais souberam ser geralmente hostis às coisas russas, tal como o professor de Harvard Richard Pipes, no entanto fala respeitavelmente sobre Solovyov: "A Igreja Ortodoxa nunca encontrou uma linguagem comum com o educado porque sua perspectiva conservadora tornou-o pronunciadamente anti-intelectual... um por um ela abandona as mentes religiosas mais finas do país: os eslavófilos, Vladimir Soloviev, Leo Tolstoy e os leigos engajados no início dos anos 1900 em torno da Sociedade Filosófica Religiosa..." (Russia Under the Old Regime, 243.)

Em resumo, a incompreensão de Snegovaya quanto a Solovyov dificilmente poderia ser mais completa. Em que sentido possível pode Solovyov, que não teve nenhuma ideia de soviético, pode ser considerado como apoiador de uma alegada "visão de mundo pró-soviética" de Putin? Na verdade, os escritos desse filósofo supostamente "pró-soviético" - exatamente como os de Berdyaev e Ilyn - foram banidos pela censura soviética.

Como pode Solovyov ser descrito como "nacionalista" quando sua magnun opus, A Justificação do Bem (o livro que Putin foi acusado de recomendar aos seus governadores), estabelece precisamente o oposto? É difícil de imaginar uma condenação mais absoluta do excepcionalismo nacional que a contida no trabalho de ética deinitivo de Solovyov:

"Deve ser um ou outro. Ou devemos renunciar ao cristianismo e ao monoteísmo em geral, de acordo com o qual 'não há bem que não seja um, Deus', e reconhecer nossa nação como sendo o bem mais alto em lugar de Deus - ou devemos admitir que um povo se torna bom não em virtude do simples fato de sua nacionalidade particular, mas somente enquanto conforma e participa do bem absoluto".

O mesmo sentido anti-nacionalista percorre todo o corpus de Solovyov. Ele argumenta agressivamente contra os nacionalistas eslavófilos do seu tempo. Para ler os pensamentos de Solovyov a respeito do assunto, Snegovaya, que lê russo, pode ter consultado o livro Estado, Sociedade, Governo, um voluma acadêmico de ciência social liberal co-publicado em 2013 por Mikhail Khodorkorsky (não conhecido por seu carinho com relação a Putin). Nesse compêndio em língua russa de ensaios feitos por teóricos liberais russos, Solovyov é rotulado como um crítico autoritativo do nacionalismo russo, inclusive o nacionalismo ocasionalmente falado por Dostoievsky [S. Nikolsky e M. Khodorkovsky, ed., Gosudrastvo. Obshchestvo. Upravlenie: Sbornik statei (Moskva, Alpina Pablisher: 2013)].

No artigo crítico feito pelo Prof. Sergei Nikolsky, Solovyov é citado longa e precisamente como um crítico autoritativo do desrespeito de Dostoievsky com relação a outras fés e nações e especialmente com relação à Europa. A fim de um balanço, Nikolsky pode ter notado que em mais algum lugar, por exemplo em seu "Três Discursos em Honra ao Dostoievsky", Solovyov homenageia Dostoievsky nos termos mais altos possíveis e especialmente nega que seu ideal político é nacionalista.

É digno de nota que Nikolsky, no mesmo artigo, ataca Ilyn por suas visões demasiadamente rosadas do imperialismo tsarista russo. Nikolsky provavelmente tem um ponto aqui.

Criticando a Igreja

Finalmente, longe de ser um proponente fanático da Igreja Ortodoxa Russa, Solovyov duramente criticou a Igreja Russa, taxando-a por "ser totalmente subserviente ao poder secular e destituído de toda vitalidade interior". Seguindo adiante, isto soa decididamente fraco. E de novo, tudo isso é bem sabido. Muitos, inclusive aqueles teólogos proeminentes como Urs von Balthasar, acreditam que Solovyov renunciou à Ortodoxia e se tornou um Católico, tão fortemente abraçou a Igreja Católica.

Solovyov, o suposto fanático conservador Ortodoxo, louvou a Igreja Católica, entre outros motivos, porque ele viu sua independência com relação às tentações nacionalistas, e por sua prontidão em agir no mundo. "O Oriente [quer dizer, a Ortodoxia Oriental] reza; o Ocidente [quer dizer, o Catolicismo Romano] reza e atua: quem está certo?" questiona Solovyov retoricamente em seu famoso Rússia e a Igreja Universal. Misturar com o mundo é bom se é o mundo que muda, Solovyov continua. Mudanças em quê sentido? De algum movo, no mesmo sentido como advogado pelo progresso Ocidental.

O que a Revolução Francesa destruiu - tratando os homens como coisas, bens ou escravos, merece ser destruído. Mas a Revolução Francesa, no entanto, não instituiu a justiça, porque a justiça é impossível sem a verdade, e a primeira de todas as verdades sobre o homem, mas a Revolução Francesa "perseguiu no Homem nada além da individualidade abstrata, um ser racional destituído de todo conteúdo positivo".

Como resultado, "o indivíduo livre e soberano", Solovyov continua, "encontra-se condenado a ser vítima indefensável do Estado absoluto ou da 'nação'".

É impossível reconciliar o Solovyov que encontramos nesses escritos com o retrato de Snegovaya e de Brooks de um religioso chauvinista e nacionalista russo, alguém com tendências pró-soviétias para aplicar.

A referência ao messianismo, vindo de Brooks, também demonstra uma total falta de auto-consciência. Mas aquele exemplo particular da chaleira chamando o pote preto já tem sido habilmente manuseado por Charles Pierce ("Nosso Sr. Brooks e o Messiânico Sr. Putin", Esquire, 4 de março de 2014).

Filósofo da Liberdade

Berdyaev (1874-1948) escreveu um grande tratado, e em um número de assuntos alterados em sua mente, mas, já que foi A Filosofia da Desigualdade que Putin sugeriu que seus governadores lessem, faz sentido começarmos com este.

Encontramos aqui um repositório de visões 'pró-soviéticas'? Nem perto disso. Pelo contrário, encontramos uma condenação emocionalmente desempenhada de tudo o que a União Soviética buscava (o livro foi escrito imediatamente depois da Revolução de 1917 e Berdyaev estava cheio de raiva e tristeza).

Berdyaev gasta muito do livro repreendendo o movimento bolchevique por sua exaltação exagerada de uma forma política particular. Mas em verdade, Berdyaev insiste, as formas políticas são secundárias ao espírito humano. Se uma pessoa é agradável ou viciosa, devota à justiça ou o seu oposto, tem pouco que ver com se alguém é um monarquista ou um democrata, um partidário da propriedade privada ou um socialista.

Por que especificamente "A Filosofia da Desigualdade"? Não porque o filósofo é indiferente à exploração e à injustiça. E menos ainda porque ele favorecia a tirania - ele foi, pelo contrário, um incansável crítico do despostismo, que é a palavra usada para descrever a ordem tsarista.

Berdyaev nunca abandonou completamente seu interesse por Marx quando jovem, mesmo depois de sua conversão ao Cristianismo perto da virada do século. Ele foi por temperamento uma pessoa mais à esquerda que à direita, apesar de sua duradoura influência de Nietzsche.

No que concerne Berdyaev é a desigualdade entre o que é superior ou inferior no âmbito do espírito e cultura. Berdyaev na maioria das vezes aprova algo do liberalismo e encontra nele algo de aristocrático ou de algum modo não revolucionário. Não obstante, a democracia e o socialismo, precisamente porque eles foram pretensiosos em preencher toda a vida com seu conteúdo, pode facilmente se tornar uma falsa religião.

Em algumas vezes a filosofia de Berdyaev até mesmo coincide com o libertarianismo, que por sua vez rejeita todo abuso de liberdade do indivíduo para fins utilitários.

A visão religiosa de Berdyaev é difícil de caracterizar. Ele foi um Cristão, um existencialista e alguém que acreditou na primazia absoluta da liberdade, mas não necessariamente todas as três de uma só vez (elas não são inteiramente compatíveis, mas então Berdyaev não foi sempre consistente). Os escritos de Dostoievsky tiveram uma enorme importância religiosa para ele.

É fácil de não compreender Berdyaev por causa de sua carência de sistema, e porque ele olha algumas vezes para o mesmo conceito de perspectivas diferentes. Tomamos por exemplo a compreensão paradoxal de Berdyaev da unidade nacional.

Dostoievsky, Berdyaev escreve, "é um gênio russo; o caráter nacional russo é estampado em todo o seu trabalho criativo, e ele revela ao mundo as profundezas da alma russa. Mas este mais russo dentre os russos ao mesmo tempo pertence à toda humanidade, ele é o mais universal de todos os russos".

E o mesmo pode ser dito para Goethe e outros gênios nacionais, que por sua vez são universais não por serem genéricos, mas precisamente por serem mais que eles mesmos; no caso de Goethe, sendo especificamente alemão. A perspectiva de Berdyaev aqui é particularmente útil se nós quisermos um mundo salvo para tanto a unidade e a diversidade. Uma civilização global que nivelaria todas as diferençasé feio, enquanto um messianismo que exaltaria uma nação sobre as outras é mal [N. Berdyaev, Sud’ba Rossii [O Destino da Rússia], (Moskva: Eksmo-Press, 2001), p. 353 e 361]

O Cristianismo, entretanto, é messiânico, porque afirma o que considera verdade universal, a verdade de Cristo. Mas essa verdade não tem poder coercitivo.

Até o início de 2014, a visão de que Solovyov e Berdyaev representam particularmente alternativas humanas e atrativas para a Rússia não foi, tão quanto sou consciente, posta em dúvida por ninguém, ao menos ninguém que deu  ao assunto qualquer pensamento.

Nos tempos da Perestroika, quando a filosofia russa foi finalmente redescoberta dentro da Rússia, a influência positiva desses filósofos foi calorosamente afirmada. Bill Keller, escrevendo para o New York Times, louvou a revista soviética Novy Mir por focar atenção em "os pensadores russos do século XIX mais inclinados ao Ocidente tais como Nikolai Nekrasov, Aleksandr Herzen, e os filósofos cristãos Vladímir Solovyov e Nikolay Berdyaev".

Estes foram o tipo de pensadores, enfatizados por Keller, que ajudariam a encorajar "uma alternativa humana ao fanático leninismo e ao obscuro nacionalismo russo". Ao publicar estes escritos, Keller continuou, Novy Mir estava demonstrando que "ocupa uma posição centrista chave a tentativa de reconciliar os ocidentalistas e os patriotas russos em uma base comum de tolerância e ideais democráticos".

O 'Liberal Conservador'

O caso de Ivan Ilyn (1883-1954), quem Putin regularmente cita e por quem Putin reconhecidamente tem respeito, é mais complexo. Algumas das suspeitas de Snegovaya nesse caso são de fato bem feitas. Ilyn tem um temperamento conservador.

É justo chamá-lo de nacionalista, embora um só preocupado com a Rússia e mais nada, e sem ambições messiânicas. Como veremos mais adiante, Ilyn não foi contra o autoritarianismo. Ilyn foi, no entanto, complexo e digno de consideração mais cuidadosa.

A sugestão de que Ilyn é uma fonte da postura "pró-soviética" é facilmente desfeita. Os interrogadores de Cheka que prenderam e interrogaram Ilyn seis vezes entre 1918 e 1922 ficariam muito surpresos com uma tal caracterização.

De acordo com o Prof. Iu T Lisitsa, que revisou os registros sobre Ilyn dos arquivos da KGB, Ilyn "mesmo nas mãos da Cheka, sob ameaça de execução... permaneceu reto, preciso, e articula em sua oposição ao regime bolchevique". [From “The Complex Legacy of Ivan Il’in, Russian Thought after Communism, in James Scanlan, ed., Russian Thought After Communism: The Recovery of a Philosophical Tradition (Armonk, Nova Iorque, M.E. Sharpe: 1994), 183.]

A caracterização "pró-soviética" também não faz jus com o fato de que Ilyn, ao lado de Berdyaev e um grupo de outros filósofos líderes russos, foi banido da URSS em 1922 por sua "agitação" anti-soviética. Diz-se que o corpus literário de Ilyn inclui mais de 40 livros e ensaios, alguns deles escritos em linguagem técnica e acadêmica, então não é coisa fácil caracterizar seu pensamento, mas um bom lugar para começar é Nossas Tarefas, de Ilyn.

Esse não só é um livro que Putin gosta de citar, é também um outro dos livros, ao lado com a Justificação do Bem de Solovyov e com A Filosofia da Desigualdade de Berdyaev, que Putin sugeriu para que seus governantes lessem.

O livro Nossas Tarefas é uma compilação de ensaios jornalísticos escritos por Ilyn entre 1948 e 1954. Seu tema primordial é a necessidade de pôr um fim à regra soviética, derrotar o comunismo e planejar para a restauração da Rússia e recuperar-se das desgraças físicas, morais e políticas impostas à Rússia pelo sistema soviético. É difícil imaginar uma condenação mais descompromissada da ideologia e prática soviética que essa coleção de ensaios de Ilyn. Se houver alguma, deve faltar em exagerar as deficiências do sistema soviético. Deve ser lembrado, apesar disso, que Ilyn (que morreu em 1954) não viveu para ver a era pós-soviética, ou mesmo para ouvir o discurso de Khrushchev condenando Stalin (em 1956).

E Ilyn não foi só um crítico do comunismo, ele foi também um crítico dos líderes passados da Rússia quando eles foram viciosos (como no caso de Ivan IV) ou incompetentes, como no caso de Nicolau II. Como Berdyaev, Ilyn foi também, na ocasião, um crítico agressivo do povo russo, que ele pensou que eram politicamente imaturos e em necessidade de uma quebra de curso em consciência legal.

Depois da queda do poder soviético, uma queda que ele esteve certo que iria acontecer, ele foi cético ao extremo de que o caráter do povo na Rússia seria capaz de sabiamente se auto-governar, que é o motivo pelo qual ele instou, como um expediente temporário, um período de  transição do governo autoritário.

'O Homem Soviético'

Aqui é como, em Nossas Tarefas, Ilyn descreveu o caráter do "homem soviético" que a futura Rússia herdaria: "O sistema totalitário... impõe um número de tendências e hábitos doentios... entre os quais nós podemos encontrar a seguir: uma vontade para informar sobre outros (e conhecida e falsamente), distorcer e mentir, perda de sentido de dignidade pessoal e a ausência de todo patriotismo bem enraizado, pensando de uma maneira escrava e aceitando cegamente o pensamento de outros, sujamente combinados com servidão e medo constante.

"A luta para sobrepor estes hábitos doentios não será fácil... exigirá tempo, uma auto-consciência honesta e corajosa, uma repetição purificadora, a aquisição de novos hábitos de independência e auto-confiança, e, o mais importante de tudo, um novo sistema nacional de educação espiritual e intelectual.[I. A. Il’in, Nashi Zadachi (Nossas Tarefas), sobr. soch. (obras coletadas), vol. 2 (Moskva, Russkaya Kniga: 1993), 23-24.]

 Ilyn era de fato profundamente preocupado com o perigo da desintegração da Rússia e de fato era preocupado com a defesa de suas fronteiras, embora, claro, não por sua restauração. Para evitar tal desintegração, Ilyn instou os russos a não repetir o que ele considerou erro fatal da Revolução de Fevereiro - seu empurrão prematuro por repleta democracia.

Nisso, como em respeito a muitas outras coisas, as recomendações políticas de Ilyn conciliam-se com as de Solzhenitsyn, que foi profundamente influenciado por Ilyn. Que Ilyn é uma grande influência sobre a marca de Putin como "liberal conservador" foi notado já em 2012 pelo acadêmico canadense Paul Robinson.

Diferente de Solovyov e Berdyaev, nos primeiros anos da Perestroika Ivan Ilyn era pobremente conhecido tanto dentro como fora da Rússia, embora Ilyn tenha sido proeminente durante os anos precedentes e seguintes da Revolução Russa, inclusive enquanto vivia no exílio.

Sua fama no início do século XX veio largamente de um celebrado estudo acadêmico dos escritos de Hegel, um trabalho ainda louvado tanto dentro como fora da Rússia como entre os melhores já produzidos.

Ilyn estourou na cena pós-soviética em 1991, quando os ensaios das Nossas Tarefas foram primeiramente publicados, incluindo o presciente "O Que o Desmembramento da Rússia Pressagia para o Mundo?" Em seu ensaio, Ilyn escreve que o resto do mundo, em sua ignorância das prováveis consequências, avidamente subscreverá a destruição da Rússia e providenciará muitas assistências de desenvolvimento e encorajamento ideológico.

Como resultado, Ilyn escreve "o território da Rússia fritará em intermináveis protestos, combates, e guerras civis que constantemente escalarão em confrontos mundiais..." Para evitar esse fato, como mencionado anteriormente, Ilyn instou a Rússia um período de transição de governo autoritário.

Esse ponto é enfatizado por Philip Grier em seu Complexo Legado de Ivan Ilyn. Grier, deve ser acrescentado, que é o antigo presidente da Sociedade Americana de Hegel, é também o tradutor da análise em dois volumes de Ilyn sobre Hegel publicada por Northwestern University Press em 2011.

Embora Ilyn admire os Estados Unidos e a Suíça pelo que ele viu como auto-governos democráticos maduros, não está claro que Ilyn era confidente de que a democracia tenha sido feita sob medida por uma nação e uma cultura do tipo russo.

O que está absolutamente claro, no entanto, é a devoção fervente de Ilyn em governar a lei e a consciência legal, algo que o coloca à parte dos eslavófilos, a quem ele em outros assuntos se assemelha.

Uma Rússia Liberal ou Cristã?

Há muitas diferenças importantes entre estes três pensadores. No entanto, todos os três escritores consideraram a liberdade essencial à cultura humana e ao espírito humano, embora eles difiram na ênfase. Indubitavelmente, então, a visão de mundo de todos os três é irredutível à fórmula liberal até mesmo se suas visões incluem elementos importantes liberais ou modernos.

Todos os três concordam com o mundo liberal de que todos os humanos, independentemente da nação, religião ou qualquer outra diferença, são igualmente dotados de dignidade infinita. Mas para eles isto não é uma frase jogada fora quando eles acrescentam que sua dignidade é conferida aos humanos por Deus, o que significa, entre outras coisas, que um direito a ser absolutamente seguro não pode ultrapassar o direito de alguém de não ser torturado (a proibição absoluta de Ilyn contra a tortura, ou qualquer coisa relacionado à tortura, no livro acima mencionado é excelente e oportuna).

Não houve espaço aqui para tentar mais que uma breve introdução a estes pensadores. Mas deveria ficar claro que a tradição que nós acabamos de descrever oferece, se nós nos engajaríamos nisso, uma oportunidade: uma chance de formar uma parceria com a Rússia que, embora diferente de nosso estado presente da mente, compartilha muito de nosso passado, e talvez sugere alguns caminhos para negociar em um mundo cada vez mais perigoso.

Conforme sua recomendação de lista de leituras fortemente sugere, "a Rússia de Putin" representa uma tentativa de reconectar com sua tradição, embora possa ser falha se tomarmos o famoso discurso de Putin (à Assembleia Federal) em abril de 2005. Embora os comentadores ocidentais tem ad nauseum o repreendido por mostrar suas verdadeiras cores ao despreender nostalgia pela ordem soviética, em verdade, como todo o texto e o seguinte excerto tornam claro, ele não fez tal coisa:

Putin disse: "O poder do Estado, escreveu o grande filósofo russo Ivan Ilyn, 'tem seus próprios limites definidos pelo fato de que é a autoridade que alcança o povo de fora... o poder estatal não pode sobrepor e ditar os estados criativos da alma e da mente, os estados interiores do amor, da liberdade e do bem-querer. O Estado não pode demandar de seus cidadãos fé, oração, amor, bondade e convicção. Não pode regular criação científica, religiosa e artística... não deveria intervir na moral, na família e na vida privada cotidiana, e só quando extremamente necessário deveria impingir na economia do povo iniciativa e criatividade'".

É ser inocente imputar um tal idealismo a Putin? Talvez. Mas Putin não é de fato o ponto, e sim a Rússia. Nós nos engajamos depois de tudo num país, não numa simples pessoa nele, e a tradição que estamos descrevendo tem raizes suficientes na Rússia que atualmente existe que, se nós escolhermos nos engajar nela, haveria a chance de uma conversação produtiva, capaz de reconstruir a confiança e criar uma ordem.

Os críticos dizem que a Rússia recentemente se tornou uma nação cheia de ódio. Mas como estão os cidadãos russos e o presidente Putin por verem distorcidas (e o que vimos acima é apenas a ponta do iceberg) suas próprias palavras e suas mais caras tradições de um modo aparentemente rancoroso e até mesmo violento? Uma sábia análise corretamente notou que os nacionalistas russos como Alexandr Dugin consideram os Estados Unidos como inimigo implacável da Rússia. Representantes desse campo "eurasiano" esperam a queda de Putin.

Os esforços da América para a "mudança de regime" podem ser bem sucedidos e facilitar uma mudança drástica para pior. E então, por meios da "logicalidade curiosa" da ideologia americana, nós mais uma vez, com a "teimosa devoção sem consideração por fatores específicos e variantes" vamos a mais uma catástrofe.

Uma Breve Nota sobre Ideologia

Para a tão alardeada liberdade dos Estados Unidos, exibe surpreendentemente pouca liberdade de manuseio quando vem à política externa. Longe de ser tomado em consideração a necessidade da segurança vital da Rússia, para não dizer nada da identidade russa, os ideólogos dos EUA se comportaram como se ambos não fossem existentes ou fundamentalmente ilegítimos. Tais comportamentos políticos compulsivos é um claro sinal de infecção ideológica.

Brooks, Snegovaya e Galeotti aparentemente fizeram todo o uso da mesma base lógica quando eles examinaram as fontes filosóficas do pensamento de Putin. Essa lógica foi algo como isso: a) Washington considera a Rússia um problema, logo b) Vladimir Putin é um bandido; e logo c) o filósofo do século XIX Vladimir Solovyov sonhou em restaurar a União Soviética em sua anterior glória e poder cristãos.

Um pensamento tão desleixado não aconteceria se essas três pessoas inteligentes não (espera-se temporariamente) fossem previamente incapacitados por cegadores ideológicos. Infelizmente, o mesmo pensamento ideológico domina todo o discurso dos EUA que se refere à Rússia, fazendo com que se torne impossível qualquer afirmação política.

Afinal, se o ideal político da América é quase tão perfeito que pode ser alcançado neste "mundo decaído", então a coisa vai adiante e vence, desse modo trazendo o bem perfeito (somos nós!) para todos.

Por que preocupar-se seriamente em familiarizar-se com um sistema competidor? Claramente Brooks and Co. não fazem nenhum esforço. Foi o bastante para eles saber que o ideal político da Rússia significantemente difere do americano: logo é ilegítimo, Q. E. D.

Conforme Hannah Arendt escreveu em As Origens do Totalitarianismo, "a curiosa logicalidade de todos os ismos, sua simplista crença no valor de salvação da teimosa devoção sem consideração por fatores específicos e variáveis, já acolhe os primeiros germes do desprezo totalitário pela realidade".

Essa América realmente não vive seus próprios ideais, como tenho escrito anteriormente, não muda nada para o ideólogo. Afinal, todo aumento no poder da América traz mais perto o dia em que suas ações (que são geralmente realistas) e seu discurso (que é sempre democrático e idealista) podem encontrar harmonia. Então a história pode verdadeiramente e finalmente terminar.

E então, em luz da revisão acima de uma parte importante da tradição russa, há algo que agora sabemos de forma muito mais acurada: a Rússia também tomou o problema de ter ideais.

Paul Grenier é um ex-intérprete simultâneo russo e um regular escritor sobre assuntos político-filosóficos. Depois de avançar no estudo sobre assuntos russos, relações internacionais e geografia na Universidade Columbia, Paul Grenier trabalhou para o Pentágono, para o Departamento de Estado e para o Banco Mundial como intérprete russo, e no Conselho de Prioridades Econômicas, onde foi um diretor de pesquisa. Ele escreveu para o Huffington post, Solidary Wall, Baltimore Sun, Godspy e Second Spring, entre outros lugares, e suas traduções de filosofia russa apareceram no jornal católico Communio.












via russianinsider

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