por Matthew Ehret
O espectro da guerra
nuclear há muito paira sobre o mundo como uma espada tenebrosa de Dâmocles,
oferecendo à humanidade muita causa para desespero diante da natureza
ambivalente da ciência enquanto uma fonte de poder criativo que enleva e
enobrece por um lado, e atua como o arauto da morte e do caos por outro.
Todavia, seria errado
culpar a ciência pela crise cuja humanidade desencadeou com o átomo, quando a
realidade é que nós nunca nos libertamos da peste dos sistemas oligárquicos
de governo. Retrocedendo aos registros dos impérios Romano, Persa e
Babilônico tais sistemas tem sempre almejado manipular as massas na direção de
padrões de comportamento de auto-policiamento e conflito constante.
Quer estejamos falando
sobre as Cruzadas, as guerras religiosas Européias, as guerras Napoleônicas, a
guerra da Criméia, Guerras do Ópio, ou as primeira e segunda guerras mundiais
tem sido sempre a mesma receita: Pôr as vítimas para definir seus interesses
ao redor de constrangimentos materiais, recursos em diminuição, ou vieses
religioso/étnico/linguísticos que previnem cada pessoa de reconhecer seus
interesses comuns com seu vizinho e então pô-los a lutar. Clássico dividir
e conquistar.
Com o fim da Segunda
Guerra Mundial, aquela antiga receita para administrar o caos não funcionava
mais quando um novo ingrediente foi introduzido no “grande jogo” geopolítico.
Esse ingrediente atômico era tão poderoso que aqueles “mestres do jogo”
gerenciando de cima os problemas da terra como deuses Olímpicos separados
entenderam que poderiam ser aniquilados tão rápido quanto suas vítimas e que um
novo conjunto de regras devia ser criado às pressas.
A Aposta Nuclear do
Senhor Russell
Um principal
representativo da mente genocida do império Britânico foi o Senhor Bertrand
Russell, um membro de sétima geração da elite hereditária conhecida hoje pelo
seu celebrado pacifismo e profundo alcance filosófico. É um fato desconfortável
que esse modelo exemplar da “lógica” e da paz tenha sido um dos primeiros
pensadores registrados clamando pela aniquilação nuclear da União Soviética na
esteira da rendição da Alemanha Nazista. Caso a União Soviética não se
submetesse a um Governo Mundial Único, argumentou o Senhor Russel no Boletimpara os Cientistas Atômicos de 1946, então deveria simplesmente encarar uma
punição nuclear.
É claro que aquela ameaça
foi de vida curta, quando o anúncio surpresa da Rússia de haver “decifrado o
código atômico” quebrou o monopólio sobre cujo qual os Anglo-Americanos
salivavam e 1945 quando observavam o Japão (cuja rendição indireta já havia
sido negociada) queimar sob a sombra de um renovado Leviatã Anglo-Americano
emergente.
O Senhor Russel, entãodiretor da CIA/MI6 Congresso pela Liberdade Cultural (cujo objetivo era
criar uma nova anti-cultura de hedonismo e irracionalismo nas artes durante a
Guerra Fria) foi forçado a mudar o tom e a liberar, ao invés, uma nova doutrina
que veio a ser conhecida como “Destruição Mútua Assegurada” (DMA). A obsessão
de Russel em tentar escravizar toda a física a um estrito determinismo
matemático tal qual fora disposto em seu Principia Mathematica (1910) e seu
papel principal na promoção da arte abstrata/música atonal pela CIA sob a bandeira
da CCF é um insight útil sobre como sociedades são gerenciadas por oligarcas.
Numa entrevista à BBC
anos após Russell mudar suas visões sobre um primeiro ataque à Rússia, o
aristocrata britânico, agora-convertido em advogado anti-nuclear descreveu sua
mudança de opinião assim:
“Q: É verdadeiro ou falso
que em anos recentes você defendeu que uma guerra preventiva pudesse ser feita
contra o comunismo, contra a Rússia Soviética?”
RUSSELL: É completamente
verdadeiro, e eu não me arrependo disso agora. Não era inconsistente com o que
eu penso agora... Houve um tempo, logo após a última guerra, quando os
americanos tinham um monopólio das armas nucleares e ofereceram para
internacionalizar armas nucleares pelo plano Baruch, e eu pensei ser uma
proposta extremamente generosa da parte deles, uma que seria muito desejável
que o mundo aceitasse; não que eu defendesse uma guerra nuclear, mas eu pensava
que uma grande pressão devesse ser posta sobre a Rússia para que aceitassem o
plano Baruch, e eu de fato pensei que se eles continuassem a recusá-lo talvez
fosse necessário de fato ir à guerra. Naquele tempo as armas nucleares existiam
apenas em um lado e, portanto, as chances é que os Russos desistiriam. Eu
pensei que eles iriam... .
Q: Suponhamos que eles
não desistissem.
RUSSELL: Eu pensei e
tinha esperanças que os Russos iriam desistir, mas é claro que você não pode
ameaçar a não ser que esteja preparado para ter seu blefe confrontado.”
Um fim para o Mundo do
DMA
O novo jogo tornou-se
“balanço geopolítico do terror” sob o DMA, e em muitos aspectos o poder que ele
oferecia a uma oligarquia era maior que qualquer coisa que uma sociedade
pré-atômica tinha para oferecer. Ao mesmo tempo que grandes guerras não eram
mais desejáveis (embora fossem sempre um risco nesse jogo psicótico de altas
apostas de poker), guerra assimétrica e uma mudança de regime tornaram-se as
novas “coisas grandes” pelos próximos setenta anos. Uma população em terror
constante de aniquilação tornou-se um solo maduro para a disseminação de uma
nova inquisição sob a orientação de um travestido megalomaníaco dirigindo o
FBI. Essa inquisição purgou o Ocidente de líderes qualificados que fossem
comprometidos para com a paz entre Oriente e Ocidente e incluiu grandes
cientistas, artistas, professores e políticos que viram suas carreiras serem
destruídos conforme o Estado Profundo tornou-se cada vez mais poderoso e bombas
atômicas mais abundantes.
Enquanto muitos
celebraram de maneira tola o sucesso do DMA com o colapso da União Soviética e
a ascensão de um mundo uni-polar que iria supostamente conduzir a um pacífico
“fim da história”, outros reconheceram o grande truque na medida em que a OTAN
continuou se expandindo a despeito de sua razão de ser ter desaparecido. Yevgeni Primakov e um círculo de
patriotas russos (cujo qual incluía um Vladimir Putin em ascensão) estavam
entre aqueles que viram através da fraude. Essa rede trabalhou diligentemente com
suas contrapartidas asiáticas para criar uma fundação para sobrevivência que
manifestou-se na forma do G20 m 1999 e na Organização para Cooperação de Xangai
em 2001.
No início de 2007, as
guerras desencadeadas no Oriente Médio após o 9-11 não tinham um fim previsto,
e uma intenção muito mais obscura do que muitos poderiam imaginar estava
emergindo entre o caos. A construção de um escudo anti-mísseis balísticos
liderada pela OTAN se iniciou ao redor do perímetro sul da Rússia por
iniciativa de Dick Cheney e foi logo incrementada posteriormente pela
circunscrição de um “Pivô-Asiático” da China, sob o mandato de Obama em 2011.
Somente os tolos mais ingênuos acreditaram então que o Irã ou a Coréia do Norte
eram as verdadeiras razões por trás dessa jogada Hobbesiana preemptiva de poder
em favor de um monopólio. O fantasma do Senhor Russell podia ser sentido ao
redor do mundo, ameaçando uma guerra nuclear se a soberania nacional não fosse
abandonada em favor de um governo mundial gerenciado por uma “ditadura
científica”.
A Convocação da Rússia e
da China para controlar a Serpente de Fogo
O Presidente Putin junto
a Sergei Lavrov e o Presidente Xi Jinping assinalaram um fim a era do DMA com
uma importante convocação por uma nova doutrina internacional de segurança
baseada sobre um “novo sistema operante”.
Saindo da Cúpula
Econômica de São Petersburgo em 6 de Junho, Putin disse “se nós não
mantermos essa serpente de fogo sob controle – se permitirmos que ela saia da
garrafa, Deus proíba, isso pode levar a um catástrofe global. Todos estão fingindo
ser surdos, cegos ou disléxicos. Precisamos reagir a isso de alguma maneira,
não é? Claramente é isso.”
As palavras de Putin
foram amplificadas por Sergei Lavrov em 11 de Junho ao falar na conferência do
Primakov Readings de 2019 em Moscou, que reuniu diplomatas, especialistas e
políticos de 30 países no tema do “Retornando à Confrontação: Existem
Alternativas?” Lavrov disse:
“É de uma
importância capital que a Rússia e os Estados Unidos tranquilizem o resto do
mundo e transmitam uma declaração conjunta de alto escalão de que não pode
haver vitória numa guerra nuclear e que, portanto, ela é inaceitável e
inadmissível. Nós não entendemos porque eles não podem reassegurar essa posição
agora. Nossa proposta está sendo considerada pelo lado dos Estados Unidos.”
Desde que se puseram
entre o pelotão de fuzilamento Anglo-Americano e as nações da Síria e da
Venezuela, em conjunto com uma surpreendente divulgação de um conjunto de novas
tecnologias militares em Março de 2018, Putin transformou as “regras do jogo”
geopolítico no sentido de que a proposta de Lavrov é agora uma possibilidade
real. As novas tecnologias divulgadas pela Rússia em 2018 incluem mísseis
supersônicos, drones subaquáticos e outros foguetes nucleares que garantem a
capacidade de um ataque retaliatório caso alguém seja estúpido o suficiente em
atacar a Rússia primeiro.
O ICR (BRI, da sigla em inglês) e o Novo Sistema
Operante
A cúpula econômica de São
Petersburgo de 5-6 de Junho testemunhou não apenas 19000 participantes de 145
países assinado $47.8 bilhões em acordos, mas caracterizou-se como um encontro
importante entre o chinês Xi Jinping e Putin, que descreveram seu
relacionamento como o de melhores amigos e travaram suas nações mais
profundamente que nunca no novo panorama operacional da Iniciativa do Cinturão
e Rota (ICR, ou BRI da sigla em inglês), que rapidamente está se estendendo no Ártico.
Esse encontro foi levado
ainda a um outro patamar em Bishkek
Kyrgyzstan, com a cúpula da Organização para Cooperação de Xangai em
13-14 de Junho, que integrou ainda mais as nações Eurasianas no ICR. Putin
e Xi não apenas se encontraram novamente nessa cúpula, mas agora foram
acompanhados pelo indiano recentemente eleito Narendra Modi, cuja participação
é vital para a reorganização do sistema mundial. Após a cúpula da OCX, o mundo
aguardaria pelo encontro potencial de 28-29 de Junho, na cúpula do G20 em
Osaka, Japão, onde o presidente norte-americano Donald Trump indicou seu desejo
de encontrar com os três líderes para negociações bilaterais. Muitos
espectadores criticaram a ideia de que Trump de fato pudesse desejar um
encontro honesto, mas Lavrov demonstrou seu entendimento superior da
complexidade estratégica na América argumentando numa entrevista em 6 de Junho,
quando ele disse que os fracassos do Presidente Trump em estabelecer relações
construtivas com a Rússia devem-se à sabotagem de forças enraizadas dentro do
governo: “Certos políticos estado-unidenses, incluindo aqueles que ataram
as mãos do Presidente Trump não permitindo que ele cumprisse com suas promessas
de campanha de normalizar e melhorar as relações com a Rússia, ainda são
incapazes de aceitar esse fato.”
A propósito numa
conferência em 12 de Junho junto ao presidente da Polônia, Trump foi
pressionado por um repórter a tomar a linha dura contra a Rússia, que
aparentemente está “ameaçando a Polônia”. Enquanto fingia concordar com a
narrativa Rússia=bully, Trump concluiu sua resposta dizendo “Espero que a
Polônia venha a ter um excelente relacionamento com a Rússia. Espero que nós
venhamos a ter um excelente relacionamento com a Rússia e, inclusive, com a
China e muitos outros países.” Trump tinha anteriormente
convocado a Rússia, a China e a América para converterem suas centenas de
milhões de dólares gastos em forças armadas em projetos que sejam do interesse
comum de todos. Durante sua declaração chave ao Fórum Econômico, Putin desvelou
o “elefante na sala” trazendo o tema da quebra do sistema financeiro global: “a
degeneração do modelo de universalista de globalização e sua transformação numa
paródia, numa caricatura de si próprio, onde as regras internacionais comuns
são substituídas pelas leis... de um país.” Putin prosseguiu alertando
para uma “fragmentação do espaço econômico global e por uma quebra
forçada devido a uma política de egoísmo econômico completamente ilimitada. Mas
esse é o caminho para um conflito sem fim, guerras comerciais e talvez não
apenas comerciais. Figurativamente esse é o caminho para a terminal luta de
todos contra todos.”
O ponto ressaltado foi
que em última instância sem um novo sistema econômico, o perigo de injustiça e
de aniquilação global pairará sempre sobre a humanidade. Ecoando a filosofia da
cooperação ganha-ganha de Xi Jinping, Putin disse que o que é necessário em
última instância é “um modelo mais justo e estável de desenvolvimento.
Esses acordos deveriam não só ser escritos claramente, mas deveriam ser
observados por todos os participantes. Entretanto, eu estou convencido que
falar sobre uma ordem econômica como essa continuará sendo um pensamento
caprichoso, a não ser que retornemos ao centro da discussão, isto é, noções
como as de soberania, como o direito incondicional de cada país na sua estrada
desenvolvimentista e, deixe-me acrescentar, responsabilidade pelo
desenvolvimento sustentável universal, e não apenas pelos próprios
desenvolvimentos.”
BIO: Matthew J.L.
Ehret é um jornalista, palestrante e fundador da
revista Canadian Patriot Review (O Patriota Canadense). Ele é um autor junto ao
The Duran, à Fundação de Cultura Estratégica, Fort Russ e o Orient Review. Seus
trabalhos têm sido destacados em Zero Hedge, Executive Intelligence Review, Global Times, Asia Times,
L.A. Review of Books, and Sott.net. Matthew também publicou o livro “Chegou o
Tempo do Canadá Ingressar na Nova Rota da Seda” e três volumes da História
Não-contada do Canadá (disponíveis em untoldhistory.canadianpatriot.org).
Ele pode ser contatado em matt.ehret@tutamail.com
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