sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

O Ensaio de Golpe da Direita Globalista no Brasil

por Amarílis Demartini & Caimmy de Sá

Após os primeiros meses do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, intensos ataques à sua gestão começaram a ser disparados pela oposição e logo adquiriram o semblante de golpismo. Aécio Neves, recém-derrotado nas eleições, assumiu o papel de garoto propaganda das manobras e FHC veio à tona conclamar seus partidários. Logrou-se até derrubar alguns peemedebistas de cima do muro e convocar manifestações que, se não foram bem o que se esperava, conseguiram encher avenidas por todo o país e gerar apreensão. Em meados do ano já cogitávamos seriamente a possibilidade de que o governo do PT fosse derrubado, trazendo algo ainda pior do que o seu “neodesenvolvimentismo” alinhado com os usurários[1], e essa impressão se intensificou na última semana com a aprovação de um pedido de impeachment pelo presidente da Câmara dos Deputados. Mas, apesar de tudo, ficamos com a sensação de que a concretização das ameaças não será tão simples.

           Uma pista de qual seria a ponta solta da trama golpista está na série de declarações públicas contra a derrubada da presidente, vindas de notórios representantes dos interesses atlantistas[2], de bancos a órgãos de mídia[3]. Se o povo já não se levantar com o ímpeto necessário para defender o governo após o “pacote de maldades”, outros atores – os quais na democracia ocidental são, obviamente, muito importantes: os próprios beneficiários das medidas de austeridade, isto é, os credores do Estado – podem vir a evitar a sua derrocada. As questões que se colocam, então, e às quais tentaremos buscar respostas, são: por que a finança globalista, já estando em uma posição vantajosa com o PT, alimentou a possibilidade de golpe? Como se explicam os recentes desenvolvimentos dessa ofensiva? Quais são as possíveis estratégias por trás deles? E, mais importante, qual a posição mais adequada a ser tomada nessa
conjuntura por aqueles que, como nós, buscam um Brasil soberano?

            Achamos que as respostas estão em boa parte nas condições políticas particulares do Brasil. Dentre as dezenas de partidos políticos ativos, poucas são as figuras interessantes, com projetos diferentes e condizentes com a nossa realidade, e essas poucas (poucas mesmo) são quase sempre desconhecidas do grande público. As instituições políticas no geral e aqueles que as compõem são alvo de desanimador (embora compreensível) descrédito por parte da população, e se é verdade que esta está insatisfeita com o PT, o PSDB não goza de maior prestígio. Assim, o jogo democrático torna-se para o brasileiro cada vez mais um amontoado propagandístico sem capacidade representativa, sofremos com a carência de líderes e ideias autênticas, enquanto, por outro lado, isso se traduz num movimento de maior acirramento e envolvimento das pessoas com questões políticas, especialmente por parte dos jovens. Isto caracteriza uma tendência à instabilidade, que poderia muito bem resultar favorável para uma dissidência organizada, mas que carrega em si uma alta dose de imprevisibilidade. Tendo isso em mente, passemos a analisar os meios aventados para um golpe.

O Golpe Militar
            A sanha oposicionista parecia tanta, que chegou a ser considerada por muitos a ideia de uma intervenção direta das Forças Armadas no plano político federal. É bem verdade que existem grupos de oligarcas nacionais que trabalham para isso desde a derrubada do Regime Militar, os quais se agitam esperançosamente a cada momento de efervescência política no Brasil e se tornam mais impacientes a cada ano do Partido dos Trabalhadores no poder. Entretanto, estes elementos da burguesia interna vêm perdendo forças mesmo dentro das corporações militares, seu poder de mobilização é débil e estão já obsoletos para influenciar decisivamente os funcionários do governo americano, que ingenuamente consideram seu parceiro.Isso porque ao longo do regime militar essa oligarquia foi suplantada pelo aparelho midiático e a presença de corporações multinacionais agindo com muito mais liberdade no cenário político brasileiro. Embora ela mantenha sua influência local em alguma medida, o imperialismo pode agora, quase sempre, dispensar o emprego de intermediários nas questões de interesse externo.Tal situação apenas se agravou durante a vigência do neoliberalismo pós-Constituição de 1988.

Analisando as condições históricas, parece-nos que um golpe nos moldes de 64, ou seja, perpetrado pela intervenção direta das forças armadas, dificilmente se repetiria. No tempo de João Goulart não havia margem para uma alternativa democrática, legal ou institucional, que representasse um alinhamento com o poder anglo-americano que naquele momento exigia colaboração de todos os países da América, iniciando a Operação Condor com aval e apoio de setores políticos, militares, e associações civis ligadas, diretamente ou não, aos interesses da burguesia (e podemos citar com certa importância no caso brasileiro, a Opus Dei, a Maçonaria e outros círculos do tipo).

            Naquela situação, além do Ministério da Fazenda nas mãos de um economista do naipe de Celso Furtado, tínhamos um Darcy Ribeiro, ambos expoentes da corrente trabalhista.Não só isso, como se tinha um nacionalista feroz no governo do Estado do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, que estava disposto a reunir e convocar todo o III Exército a uma guerra anti-imperialista que se daria em solo brasileiro. Ou seja, a perspectiva de instaurarem-se projetos nacionalistas que poderiam vir a contrariar ou se indispor com os EUA era algo muito palpável, mesmo porque, no contexto de então, muito pouco era preciso para ser alvo de suspeitas.

           Com a vitória do modelo estadunidense sobre a antiga União Soviética, a ordem bipolar da Guerra Fria desmoronou e os representantes do Ocidente puderam avançar em muito com suas expectativas de uma ordem unipolar, sabendo que países que buscassem se livrar da sua influência não teriam mais outra potência à qual recorrer para sua sustentação no cenário geopolítico. Nós, na Ibero-América, logo sentimos os efeitos da nova postura dos EUA e da onda neoliberal que se sucedeu. Hoje no Brasil, temos um defensor de grandes conglomerados financeiros ocupando a pasta da economia, o governo faz privatizações, concessões, e até apoia na ONU a demonização do governo sírio de Assad.

           A própria oposição política, que caracteriza o maior veículo da ameaça golpista contra o PT, não gostaria de dividir seu protagonismo com os militares e correr o risco de ver o sistema democrático liberal enfraquecido. Para os atlantistas estrangeiros, tampouco é desejável que se abale esse sistema que tem garantido tão bem seus interesses no nosso continente – um fechamento político nas mãos das Forças Armadas poderia significar maior investimento na área de defesa, mudança de atitude com relação à cultura e até arroubos patrióticos, o que para aqueles seria puro retrocesso.

Além disso, dentre os oficiais do Exército já são poucos os que aspiram a meter-se pela política, a atitude legalista é enfatizada na instituição desde as primeiras lições e a discussão ideológica desencorajada. Isso vem em boa parte do fato de que os militares sofrem até agora as amargas consequências do antigo golpe, em um duplo sentido. Por um lado, há uma política que tende a condenar os militares não como traidores da Pátria(que de fato foram), mas como violadores dos "direitos humanos", política que leva a processos, sindicâncias, assédio e ações vexatórias vindas de movimentos de esquerda (principalmente, mas não só de esquerda).  A Comissão da Verdade,criada por Dilma Rousseff e pautada por uma moral "humanitária",quase nada falou do papel representado pelo empresariado envolvido com multinacionais nas manobras que levaram ao colapso de Jango, mas trouxe uma série de incômodos ao meio militar e poderia ter sido bem pior, se fossem instaurados processos criminais tal como certos movimentos cobravam. Digamos que as recentes provocações certamente irritaram muitas pessoas ligadas à caserna brasileira, mas ao invés de incitara uma reação revanchista,fizeram essas pessoas quererem manter-se longe de dores de cabeça por algum tempo.

           Por outro lado, o próprio processo de golpe instalou uma cultura de despolitização das Forças Armadas ao distanciá-las do amplo debate público. No momento que precedeu o golpe, era comum ver os militares divididos entre grupos nacionalistas, comunistas e liberais filo-atlantistas. Com a vitória da ala liberal através do golpe, os elementos militares pertencentes aos outros dois campos foram purgados do aparato de defesa, levando à hegemonia de um único grupo e, por consequência, à despolitização. Basta pensarmos na exclusão de Ivan Cavalcanti Proença e Nelson Werneck Sodré, respectivamente um nacionalista e um comunista.

O Golpe Institucional
           A forma mais cômoda para um golpe da direita contra Dilma seria a via institucional, jurídica ou parlamentar. Isso poderia acontecer através da anulação das eleições, o que foi tentado quando Gilmar Mendes, ministro do STF(Supremo Tribunal Federal) requisitou a investigação das contas de campanha da chapa eleita, alegando o possível uso de dinheiro proveniente do esquema de corrupção da “Lava Jato”[4]. Mas o pedido foi arquivado pelo procurador-geral eleitoral, que alegou falta de indícios suficientes e expiração do prazo para a entrada com recursos. Desde então, Mendes vem tentando outros caminhos para invalidar o pleito, mas até agora nenhum logrou progresso.

           Outra forma de atacar pela via institucional é através da abertura de processos de impeachment, e Eduardo Cunha (deputado eleito pelo PMDB e presidente da Câmara) finalmente aceitou um pedido depois de ter recebido uns 15 deles. Os antecedentes deste acontecimento envolvem toda uma trama de denúncias e negociações políticas que vem se desenvolvendo entre o governo e sua base, pressionada pela oposição. Já em setembro havia sido criado um movimento congressista oficial pelo impeachment unindo deputados oposicionistas e os rebeldes da base, ao que a bancada governista reagiu com um movimento “anti”. Cunha vem sendo acuado por investigações de corrupção e lavagem de dinheiro, e o fato de o PT ser o principal partido que pretende levar adiante o processo de cassação que corre contra ele no Conselho de Ética certamente influenciou sua ação de ataque à presidência.

           Para que o processo de impedimento da presidente tenha sucesso, é necessário que seja analisado por uma comissão parlamentar especial e aprovado na Câmara por mais de dois terços dos deputados, com o que Dilma Roussef seria afastada por 180 dias, assumindo o vice-presidente Michel Temer (PMDB). A partir daí, o processo se encaminha ao Senado e, havendo a condenação de dois terços dos senadores, Dilma deixa a função. Entretanto, essas maiorias não são fáceis de conseguir, pois exigiriam uma ruptura total da base com o governo e aqui vemos a necessidade de falar do principal componente dela, o PMDB.

           O chamado Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) protagoniza a situação politicamente escorregadia e imprevisível na qual nos encontramos. A sigla representa o maior partido do país, o qual tem sido essencial para o que se convencionou chamar “governabilidade”: sem nunca ter elegido um presidente, a legenda está profundamente arraigada em todo o aparelho estatal, influencia toda decisão abrangente e é afamada por seu oportunismo. Dilma vem negociando com o PMDB constantemente, os favoreceu na nomeação dos ministérios, mas ainda assim o partido mostra-se pouco interessado em colaborar e nenhuma declaração de apoio contra o impeachment veio até agora, nem sequer do vice-presidente Michel Temer, de quem Roussef disse esperar “integral confiança”. Muito pelo contrário, uma embaraçosa carta de Temer à presidente foi divulgada na mídia essa semana, e Eliseu Padilha, homem próximo àquele, acaba de pedir demissão do Ministério da Aviação Civil. O partido ainda lançou, no final de outubro, um documento contendo críticas às políticas econômicas dos petistas e reforçando seu compromisso com o liberalismo econômico. Porém, não seria surpresa nenhuma se esta organização grande, ideologicamente débil e com tantos interesses conflitantes, acabasse dividida, o que inviabilizaria os planos golpistas.

           O cenário de golpe institucional é possível, mas lhe falta respaldo de importantes setores. O ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto, entre outros especialistas do Direito Constitucional, manifestou-se anteriormente ressaltando que não há base jurídica para um impeachment. Há também diversas entidades de pressão popular que se mantêm do lado do governo, pela sua ligação histórica com o Partido dos Trabalhadores. A capacidade de apaziguar as demandas classistas dos trabalhadores tem sido, na verdade, um dos pontos positivos para o capital nos anos de PT, mas também vem gradualmente se desgastando. Apesar de toda a insatisfação que as medidas deste mandato têm suscitado entre os seus apoiadores mais à esquerda (ou simplesmente mais conscientes), em uma situação de golpe da direita, provavelmente eles iriam às ruas e não seriam facilmente reprimidos. O mesmo não se pode esperar dos partidários da oposição.

O que é que está acontecendo?
            A disputa pelo Estado que nos aparece na forma básica de PT versus PSDB se digladiando corresponde a projetos concorrentes, em ambos os quais atores econômicos saem ganhando e o país sai perdendo, mas um deles se destaca como potencialmente mais nocivo do que o outro. Este se caracteriza pela alternativa deliberadamente atlantista encabeçada pelo PSDB.

            É notório que o governo petista tem cedido terreno ao grande capital e garantido seu lucro em detrimento do nosso desenvolvimento (não apenas econômico, mas também cultural e moral), quando não abertamente, por seu envolvimento em práticas de corrupção que, além de constituir alta traição em si mesmas, tornam nosso Estado vulnerável aos ataques do interesse globalista.  O escândalo da Petrobrás, por exemplo, não obstante se tenha tornado um “escândalo” com um empurrãozinho da influência externa e da mídia sua serviçal, resultou na desvalorização da nossa principal estatal, com a venda de ativos a investidores privados e a abertura do precedente para maiores concessões do pré-sal a gigantes internacionais. Esta perda é incalculável para o Brasil.

            Se, no entanto, o capital internacional tem avançado sobre os bens brasileiros e o setor financeiro tem quebrado sucessivos recordes de lucro por aqui[5], o fato é que nunca se dão por satisfeitos e sabem que estariam em situação mais vantajosa com o PSDB no poder. Esta afirmação é corroborada pela análise dos financiamentos de campanha das últimas eleições[6]. O PT aparece atrás do PMDB, como o terceiro colocado com relação ao montante arrecadado e uma receita total de $385,993,122.54, enquanto o PSDB, campeão de arrecadação, tem um total de $629,323,035.76. Ao sondar-se a proveniência das doações, nota-se a aberta preferência do setor bancário e de serviços financeiros pelo PSDB. Ora, qualquer um que esteja a par da importância da geopolítica para se compreender o mundo atual e agir nele, sabe que o setor bancário não é simplesmente mais um braço qualquer do capital[7], servindo como o principal instrumento de submissão das nações pelo projeto liberal globalista. É quando a atuação dos bancos é rechaçada por governos resistentes que o atlantismo passa a lançar mão de outros tipos de intervenção, suscitando guerras e “revoluções laranjas”, como vimos recentemente na Líbia, na Síria e em um bocado de outras nações, nesses tempos de ofensiva da unipolaridade.

            No Brasil, bem menos que isso foi necessário para incomodar aqueles que se sentem os donos do mundo: a presença dos bancos estatais na nossa economia vem irritando os banqueiros. Ao disponibilizar linhas de crédito acessíveis, a Caixa Econômica Federal tirou deles uma fatia importante do mercado, e isso se traduziu em ataques à instituição, ao que o governo respondeu sinalizando a privatização[8]. O BNDES, ainda mais incômodo por financiar os grandes projetos do PAC, foi o alvo seguinte, com a abertura de uma CPI debaixo de intensas críticas da mídia. Além disso, outras movimentações do governo também contribuíram para exasperar os financistas, são algumas delas: a intenção de não mais operar com o manejo da taxa SELIC, que beneficiava os bancos; a sanção da lei de superávit primário que privilegia as empreiteiras em detrimento daqueles; a taxação sobre o lucro dos bancos que, ao estender o ajuste fiscal aos mais ricos, aumentaria em 3 a 4 bilhões a arrecadação estatal; e o esforço para restabelecer a CPMF.

            Como toda ação que leve ao desabono de empresas nacionais abrirá espaço para o capital internacional, e ainda com base nos financiadores do PSDB e o projeto de enfraquecimento do aparelho estatal ao qual esse partido se propõe, podemos afirmar que a disputa política entre PT e PSDB reflete em boa medida a disputa levada a cabo entre capitais internos e externos, não se limitando ao setor financeiro. Com isso, temos de onde saíram, em termos econômicos, os incentivos ao golpismo e não há dúvidas de que foram seguidos de perto pela intrusão política e ideológica dos EUA[9].
            Então, por que duvidamos do sucesso da empreitada golpista?
  1. Em parte, pelo fracasso da oposição em conseguir apoio popular e político.As bases impulsionadas pelos thinktanks americanos e que lideraram as manifestações de rua anti-PTtem se enfraquecido, sofrendo seguidos rachas por discordâncias entre os líderes e também porque setores mais propensos ao conservadorismo, usados como idiotas úteis pelos liberais, têm começado a ressentir-se[10]. Por mais que a população esteja descontente com a crise financeira e desaprove a administração de Dilma Roussef, não há indícios de um movimento massivo e disposto a sair às ruas pelo impeachment.
  2. Além disso, as medidas de austeridade impostas pelo Ministro da Fazenda, Joaquim Levy,garantirão que o Brasil continue pagando as dívidas regularmente, com os juros abusivos de sempre, subsídios para o agronegócio, a deterioração dos direitos trabalhistas para a burguesia industrial (turbinada pela imigração direcionada pelos capitalistas aos municípios industriais) e a alegria do setor exportador com a alta vertiginosa do dólar. Sendo assim, para o capital atlantista pode ser mais seguro evitar a instabilidade e tentar manter os níveis de insatisfação das massas contra Dilma para serem usados em uma derrota eleitoral em 2018.
            Temendo o trunfo Lula, a oposição emplacou ainda certas alterações legislativas que inviabilizariam o financiamento da campanha petista, já prejudicado de todo modo pelo desmonte dos esquemas com empreiteiras. Nesse sentido, os oposicionistas sofreram uma derrota com a aprovação do fim do financiamento de empresas nas campanhas. De toda forma, a ofensiva liberal não está derrotada e o Brasil precisa de um movimento que não se acue diante dela para livrar-se do jugo imperialista de uma vez por todas. A nós está muito claro que esse movimento não virá do PT.
 
Conclusão
            Queremos deixar claro que repudiamos o PT, por toda sua condescendência para com o globalismo no campo da economia e também pela adoção de um programa completamente afeito às piores degenerações liberais nos âmbitos social e cultural, com grande prejuízo para a tradição brasileira. Entretanto, em política a neutralidade é impossível e pretender refugiar-se nela é apoiar um ou outro lado, conscientemente ou não. Com a crise política instalada no Brasil este ano, vimos partir tanto de círculos da extrema-esquerda quanto de nacionalistas o reforço ao coro golpista anti-PT por vários motivos. Essa atitude pode ser fruto de legítima revolta, mas, no momento, não ajuda o Brasil, nem a classe trabalhadora brasileira.

Não estamos dizendo, com isso, que o governo petista (especialmente o de Dilma Rousseff e ainda mais nesse segundo mandato) seja minimamente contra- hegemônico. Por muito do que dissemos nesse texto, é evidente que não é esse o caso. A questão que faz com que nos oponhamos à derrubada do governo é a falta de qualquer alternativa que ofereça melhores perspectivas no curto prazo – o fiasco nacional que é o sistema partidário atual não acabará sem trabalho árduo e revolucionário, de conscientização, desconstrução e conquista de espaços. A ascensão de figuras do PSDB ou PMDB, partidos que não se preocupam em manter sequer uma imagem de resistência, representaria uma vitória ainda maior para o capital financeiro por aqui, causando danos que, mesmo com a construção de uma alternativa realmente dissidente não poderiam ser reparados sem muita dificuldade. O PT, por querer manter-se no poder, sabendo que não tem a confiança do atlantismo e que pode perder o apoio das próprias bases militantes, fica na defensiva e para isso precisa amparar-se em algumas das posições que serão importantes para retomar uma política soberana.A postura do PT contra a pilhagem do aparelho e empresas estatais é fraca demais para impedir a rapina, mas ela não seria nem encontrada com a oposição no poder, e o processo seria acelerado. Talvez, tentando ser otimistas em uma situação bem pouco propícia a isso, poderíamos pensar que uma pressão vinda das ruas lograria uma postura mais incisiva do governo. Foram formadas frentes de esquerda com esse propósito, ainda que por um viés com o qual temos muito desacordo[11].

            Assim, reafirmamos nossa ruptura com toda a política moderna, com as direitas e as esquerdas, mas sem nunca tirar os pés do chão. Porque queremos uma revolução real,será preciso saber valer-se de tudo o que puder se tornar um recurso contra o inimigo e agir no mundo que ele mesmo construiu para implodi-lo. Assim, buscamos no momento de crise a oportunidade para inserir no debate público nacional uma opção autêntica pautada pela Quarta Teoria Política[12] e não por falsas dicotomias como petismo ou anti-petismo, dicotomias essas calcadas namodernidade a ser ultrapassada e que podem distrair tanto dos pontos fundamentais sobre os quais devemos estar atentos quanto do poder real de escolha que temos.

Notas:
[1]As aspas são porque a versão de que os governos de Lula e Dilma foram neodesenvolvimentistas é contestável. Falta à política petista uma série de características centrais do desenvolvimentismo de Celso Furtado, do qual a versão “neo” procederia. Furtado tinha em vista a soberania nacional, através da internalização das decisões políticas e econômicas, portanto, a condescendência atual para com as instâncias estrangeiras já seria uma contradição, daí a ironia. Para maiores detalhes referentes ao questionamento de tal tese, conferir:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-66282012000400004&script=sci_arttext

[2] “Atlantismo” é um termo importante para nós. Ele foi sucintamente definido por Aleksandr Dugin da seguinte forma:
“Atlantismo – termo geopolítico significando:
- sob o ponto de vista histórico e geográfico, o setor ocidental da civilização mundial;
- sob o ponto de vista estratégico-militar, os países membros da OTAN (em primeiro lugar, os EUA);
- sob o ponto de vista cultural, a rede unificada de informações criada pelos impérios midiáticos Ocidentais;
- sob o ponto de vista social, o ‘sistema de mercado’, afirmado como sendo absoluto e negando todas as formas diferentes de organização da vida econômica.”
Texto completo e traduzido em: http://evrazia.info/article/4436

[3]Aqui podemos citar Itaú, NY Times, Globo, entre outros.
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1672332-nao-ha-motivos-para-tirar-dilma-do-cargo-diz-presidente-do-itau-unibanco.shtml
http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/08/impeachment-sem-evidencia-concreta-traria-dano-diz-new-york-times.html
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/08/em-editorial-surpreendente-globo-pede-sustentacao-ao-governo-dilma.html

[4]Esta Operação mereceria um texto inteiro e é certamente a antessala da estratégia golpista.

[5]http://g1.globo.com/economia/negocios/noticia/2015/08/mesmo-diante-de-crise-lucro-dos-bancos-nao-para-de-crescer.html

[6]Devemos os créditos dessa análise e outros dados, referentes à conjuntura econômica, ao artigo de Pablo Polese (Mestre em Sociologia pela UNICAMP, doutorando em Serviço Social pela UERJ e UFRJ) no blog esquerdista Passa Palavra.

[7] Ao que parece, a maior parte dos marxistas se esforça para ignorar peremptoriamente este fato.
8http://www.valor.com.br/politica/3833616/vou-abrir-o-capital-da-caixa-mas-processo-demora-adianta-dilma

[9]http://mundo.sputniknews.com/americalatina/20150414/1036371835.html

[10]Por exemplo, o desentendimento entre “libertários” e “liberais” no Instituto Mises Brasil, e entre o Movimento Brasil Livre e os seguidores de Olavo de Carvalho, etc.

[11]É o casoda Frente Brasil Popular e da Frente Povo Sem Medo. Embora essas iniciativas tenham muitas pautas válidas, infelizmente, se desviam do foco e valem-se de um discurso de cunho liberal em questões não econômicas, defendendo degenerações absolutamente impopulares, como é comum às esquerdasnos nossos dias.

[12]Quem não conhece os fundamentos da Quarta Teoria Política, neste vídeo pode ver uma breve explicação do Professor Aleksandr Dugin com legendas em português: https://www.youtube.com/watch?v=YpRykFhRlIA

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