sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Os EUA podem impedir uma guerra contra a Rússia?


por Jack Hanick
Os Estados Unidos tendem a uma guerra contra a Rússia. Alguns chamam esta nova situação de "aumento de hostilidade" ou "Guerra Fria II". Há dois lados nesta história. Penso que os jornalistas estadunidenses de todas as convicções geopolíticas não estão oferecendo análises críticas. Compreender o lado russo e tomar seriamente seus argumentos podem ajudar a prevenir sérias consequências.

Os estadunidenses (o povo) acreditam que os russos são alimentados por propaganda feita pela mídia controlada pelo Estado. Se os russos (o povo) só pudessem ver a verdade, eles pensam, eles adotariam a posição dos EUA. Isto não é verdade. Há mais que 300 estações de televisão disponíveis em Moscou. Apenas 6 são controladas pelo Estado. A verdade é que os russos preferem ouvir as notícias do Estado ao invés aquelas da internet ou de outras fontes. É diferente de quase qualquer outro país do mundo. Não é a Coreia do Norte, onde as notícias são censuradas. Cada noite durante a crise da Crimeia, qualquer um poderia assistir a CNN ou a BBC meterem pau na Rússia.

Com relação à Ucrânia, a Rússia desenhou uma linha vermelha: nunca permitirá a Ucrânia ser parte da OTAN. A Rússia vê os EUA como o agressor, rodeando a Rússia com bases militares na Europa Oriental em todas as oportunidades desde o colapso da União Soviética. Os EUA veem a Rússia como o agressor contra seus vizinhos. Um pequeno passo em falso poderia levar à guerra. Agora a guerra não será mais "lá". Os bombardeiros russos voando para a Califórnia em 4 de julho claramente demonstram isso. Os russos compreendem que os EUA nunca lutaram uma guerra em sua própria terra desde a guerra civil. Se novas hostilidades começarem, a Rússia não deixará a guerra ser à distância, na qual os EUA disponibilizam as armas e os conselheiros, deixando que os outros "de botas no chão" combatam. A Rússia levará a guerra para os EUA. Como chegamos a este ponto crítico em tão pouco tempo?

Primeiro, algum retrospecto. Fui à Moscou há dois anos e meio. Fui à Rússia para construir um canal de notícias não-governamental com visões editoriais consistentes com a Igreja Ortodoxa Russa. Completei a missão e retornei ao Ocidente. Vejo dois lados desse conflito e, a menos que haja mudança de pensamento, o resultado será catastrófico. Quando cheguei, a relação entre os EUA e a Rússia pareciam normais. Como americano, minhas ideias foram aceitas, mesmo buscadas. No momento, o sr. Obama planejava atacar o exército de Assad na Síria por ter cruzado a "linha vermelha" em busca de armas químicas. A Rússia interveio e persuadiu a Síria a destruir suas armas químicas. O sr. Putin ajudou o sr. Obama salvar o rosto e não fazer uma mancada ainda maior na Síria. Logo depois, o sr. Putin escreveu um editorial publicado no The New York Times, no qual foi em geral bem recebido. As relações pareciam estar no seu curso normal. Houve cooperação no Oriente Médio e a russofobia estava leve.

Então a Rússia passou uma lei que preveniu a propaganda sexual para menores de idade. Foi o início das tensões. O lobby LGBT no Ocidente viu esta lei como anti-gay. Não foi isso que eu vi. A lei foi uma cópia direta da lei inglesa e foi tencionada a prevenir a pedofilia, não se referindo a relações entre adultos. Relações gays na Rússia não são ilegais (embora não sejam aceitas pela maioria do povo). Com relação aos protestos gays, ficaram longe da visão das crianças. Vejo isto do mesmo modo que vimos nos EUA crianças serem distanciadas de ver filmes marcados com "R". A punição por quebrar esta lei é um tanto menos que $100. Estacionamento duplo em Moscou é mais pesado: $150. Não obstante, a reação estava generalizada contra a Rússia.

O boicote das Olimíadas de Sochi foi o modo do Ocidente de descreditar a Rússia. A Rússia viu este boicote como um ato agressivo feito pelo Ocidente para interferir em suas políticas internas e ridicularizar a Rússia. Sochi foi para os russos uma grande fonte de orgulho nacional e não teve nada que ver com política. Para o Ocidente, isso foi o primeiro passo para criar a narrativa de que a Rússia era a antiga repressora União Soviética e que a Rússia deve ser parada.

Então vieram as revoluções coloridas na Ucrânia. Quando o presidente da Ucrânia foi derrubado (Yanukovich), do ponto de vista russo foi um golpe organizado pelo Ocidente. A derrubada de um presidente democraticamente eleito sinalizou que o Ocidente estava interessado em uma expansão de poder, não em valores democráticos. As conversações vazadas da Secretária Assistente de Estado, Victoria Nuland, e o Embaixados estadunidense, Geoffrey Pyatt, sugerem que os EUA estiveram ativamente envolvidos na mudança de regime na Ucrânia. Para a Rússia, os ucranianos são seus irmãos, muito mais que qualquer outro grupo. As línguas são similares; eles são ligados culturalmente e religiosamente. Kiev teve um papel central na cristianização da Rússia. Muitos russos têm membros familiares na Ucrânia. Para os russos, esta relação especial foi destruída por forças externas. Imaginem se o Canadá de repente se aliasse à Rússia ou à China. Os EUA certamente veriam isto como uma ameaça em sua fronteira e agiriam decisivamente.

Quando a União Soviética colapsou, do ponto de vista estadunidense, as fronteiras da Europa Oriental foram congeladas. Entretanto, no fim dos anos 1990, as fronteiras da Iugoslávia mudaram, dividindo o país ao meio. Os russos tinham aceitado o governo de Kiev sobre a Crimeia desde 1954, como um irmão confiável pode cuidar de uma propriedade da família. Mas quando este irmão não mais fazia parte da família, a Rússia quis a Crimeia de volta. A Crimeia também queria a Rússia de volta. Os crimeanos falam russo e estão atados com a herança russa de 300 anos. Do ponto de vista russo, foi um problema familiar que não interessa ao Ocidente, as sanções impostas foram vistas como agressão por parte do Ocidente para manter a Rússia no seu lugar.

As sanções separam a Rússia do Ocidente e a empurram para a China. O turismo chinês na Rússia bate os níveis recordes. Mais transações são agora estabelecidas diretamente entre o Rublo e o Yuan, sendo o dollar estadunidense um meio que já míngua. Embora o dollar permanece forte agora, é enganador. A China criou o banco banco AIIB para diretamente competir contra o FMI por poder bancário mundial, e os EUA estão tendo problemas em prevenir seus aliados de se juntar a ele. Esta é a primeira rachadura na dominação financeira dos EUA, como resultado direto das sanções.

Estamos nos movendo mais perto de uma guerra real. Os republicanos e os democratas falam em política externa com a Rússia. Quando todos os políticos estão de acordo, não há discussão de abordagens alternativas. Qualquer alternativa para o isolamento completo da Rússia e para a construção da OTAN em torno das fronteiras russas é um sinal de fraqueza. Qualquer alternativa para a construção militar é criticada como "apaziguamento", comparada à falida política externa do primeiro ministro britânico, Neville Chamberlain, com relação à Alemanha Nazista entre 1937 e 1939.

Os liberal-democratas historicamente são anti-guerra, mas não agora. Na República Tcheca houve o começo de um movimento anti-guerra quando a OTAN pôs seu armamento nas suas fronteiras. "Tanques, mas nenhum obrigado [Tanks but no thanks]" se tornou um coro. Os tchecos ficaram desconfortáveis com um músculo que flexionava rumo ao impasse. Apenas um só libertário, Ron Paul, elevou uma crítica da sabedoria dessa construção militar.

O erro que custará aos EUA muito caro é a hipótese de que a Rússia  tem as mesmas ambições que a União Soviética. A estratégia da Guerra Fria usada contra a União Soviética não pode ser repetida com os mesmos resultados. A União Soviética foi comunista e ateia. A Rússia moderna retornou às suas raízes cristãs. Há um renascimento na ortodoxia russa com mais de 25.000 novas igrejas construídas na Rússia depois da queda do comunismo. Em qualquer domingo, as igrejas são embaladas. Mais de 70% da população se identifica como cristã ortodoxa. Combinados este renascimento religioso com o renovado nacionalismo a Rússia cresce auto-confiante.

A ideologia marxista seguida pela União Soviética foi evangelista. Apenas quando todo o mundo tiver se tornado comunista é que os princípios marxistas teriam sido realizados. Quando as fazendas coletivas perderam seus fins, foi porque todo o mundo não era mais comunista, não porque a ideologia destruiu a iniciativa individual. Por esta razão, a União Soviética precisou dominar o mundo todo. Para a Rússia moderna, a dominação mundial não é o objetivo. A Rússia quer manter sua identidade russa e não perdê-la para forças estrangeiras.

A história russa é repleta de invasores tentando conquistar a Rússia Napoleão e Hitler são apenas os últimos exemplos. A Rússia sempre prevaleceu. Dirigindo do aeroporto, você pode ver exatamente o quão perto Hitler chegou de Moscou. Você também lembrou que foi aqui que ele foi parado. A Rússia está certa de que repelirá o novo invasor: a OTAN.

Uma guerra com a Rússia não pode ser vencida economicamente. O petróleo russo e uma abundância de recursos naturais ocupa o maior perímetro do mundo. Está crescendo em sua habilidade de substituir bens restritos [sancionados] do Ocidente. Uma guerra à distância usando o exército ucraniano não resolverá o problema.

Ainda há tempo de fazer um acordo. Mais sanções e mais isolamento do Ocidente não são o meio para resolver as diferenças. Os EUA articulando seu músculo militar não resolverá os problemas. A guerra não é a resposta, mas muito frequentemente na história se torna a única solução quando dois lados se recusam a ver o ponto de vista do outro.

via katheon

Nenhum comentário:

Postar um comentário