domingo, 15 de dezembro de 2013

Alberto Buela - A América Ibérica

Por Maurício Oltramari

Alberto Buela, nascido em Buenos Aires em 1946, é um filósofo argentino que tem se destacado por seus trabalhos nas áreas de metapolítica, teoria do dissenso e teoria da virtude, tendo sido o fundador da primeira revista de metapolítica ibero-americana, ou hispano-americana, ainda nos anos 90. Buela é um dos autores que direciona seus esforços em criar uma “filosofia ibero-americana” contemplando os sentidos do “ser ibero-americano” e “o sentido da América”. No presente texto, iremos explanar de forma breve o pensamento acerca da América que tem sido desenvolvido por este filósofo, para isso teremos como base seus trabalhos direcionados a explicar o sentido do ecúmeno hispano-americano.

Hispano-América contra o Ocidente

A América Hispânica, ou América Ibérica é o termo utilizado para designar o grupo de países formado por Espanha, Portugal, Andorra e todas as nações do continente americano cuja cultura tem suas bases na hispanidade, ou seja, tudo aquilo que possui suas origens no Hispânico (Espanha e Portugal). Aqui entendemos esses países como aqueles que vão desde o México até o sul da América do Sul. Para Buela, os países americanos que constituem a supracitada designação, devem, por sua natureza, opor-se à cultura ocidental pós-moderna. Pois bem, ainda que tais nações americanas façam parte do chamado Ocidente, sua tradição e seus modos distanciam-se significativamente daqueles compartilhados pelos Norte-americanos e Europeus. A passagem pelo período das revoluções mundiais, ou seja, a Reforma, Revolução Francesa, Revolução Bolchevique e Revolução Tecnológica até a idade pós-moderna culminaram na cosmovisão que hoje predomina na Europa e América anglo-saxã. Sob os pilares das ideias de progresso, poder onímodo da razão, democracia, manipulação da natureza pela técnica e o cristianismo subjetivo conforma-se a Weltanschauung sustentada e difundida globalmente pelo aparato cultural, econômico e militar dos EUA e seus aliados. Em oposição a estes axiomas, vemos o homem ibero-americano chegar a América antes do período das revoluções mundiais, no séc. XVI, e, portanto, ainda isento das influências dessas transformações que se iniciaram com a era das luzes. O homem americano carrega em si a mentalidade católica, do baixo medieval, que mistura-se com a mentalidade indígena, própria dos povos que já habitavam essas terras. Portanto, estes dois elementos, o “católico” e o “indigenista”, conformam a consciência e cosmovisão do homem ibero-americano.

América como “O Hóspito”

Buela compreende a América como uma nova morada, uma nova chance para os homens que atravessaram o mar em busca de tempos melhores. A ideia de América como espaço geográfico carrega em si o conceito de hospedar (hospitari), pois nenhum continente recebeu e albergou -como a América- tantos povos de diferentes culturas e localidades. Povos vindos do inóspito, fugindo da perseguição, da guerra, da fome, da miséria, enfim, de toda sorte de problemas e desgraças em suas terras natais, vieram buscar um novo lar nesse continente, e aqui fundar raízes e novas tradições. Esse “fundar raízes” exige o esforço de identificar-se e situar-se como um novo homem nessas terras, o homem ibero-americano. Assim, podemos identificar o Ser da América como “o hóspito”.

O Ser Ibero-americano

“Um misto perfeito...”

É desse modo que Buela se refere ao Ser ibero-americano. Em oposição à ideia de mestiçagem racial ou cultural, que não expressa plenamente a concepção do Ser hispano-americano, adota-se o termo simbiose. Uma simbiose entre o católico, homem que chegou a essas terras antes do período das revoluções mundiais, e o índio telúrico, homem que habitava a América na época de seu descobrimento. O conceito de católico tomado aqui não deve ser entendido como “categoria confessional”, mas sim como a consciência europeia e cosmovisão que conformava os traços do homem que chegou nessas terras. Então, se a identidade do homem ibero-americano é um composto harmônico, estamos falando da junção de dois componentes completos em si mesmos, e que por fusão conformam um novo ser, único, e dessa forma, diferente dos dois elementos pelo qual está composto. A consciência desse homem está conformada pelo sentido hierárquico da vida e dos seres, que se funda em valores absolutos e indiscutíveis, ao contrário do homem moderno e sua consciência igualitária, que nivela e rebaixa os homens em uma só massa homogeneizada a partir de valores subjetivos e coletivistas. O Ser do homem ibero-americano se identifica pela preferência de si mesmo em relação ao outro, por isso não estamos falando de uma simples mestiçagem, agregado, somatória ou sobreposição, mas sim, de um autêntico misto perfeito.

A Filosofia Ibero-americana

A América possui um modelo civilizacional único, e assim, o seu próprio pensamento filosófico, definido por suas características essenciais, representadas pelo católico e o índio telúrico, sobre os quais já nos referimos em parágrafos anteriores. Não obstante, como nos demonstra Buela, a história dessa filosofia é muitas vezes uma história de simples imitação e admiração do pensamento filosófico europeu e de sua erudição que, afinal de contas, não tem como objeto de seu trabalho o nosso continente e seu habitante. É certo que as condições de pobreza e mesmo ignorância as quais temos sido submetidos desde nossas origens pela dominação econômico-cultural, tornam a tarefa de desenvolver uma filosofia genuína uma verdadeira obra hercúlea. Assim se apresenta o desafio: produzir uma filosofia que possa explanar “quem” e “o que” somos, que possa expor e buscar soluções desde as origens, e não apenas vislumbrar uma América como o eterno continente do futuro, onde toda visão positiva se foca em um futuro hipotético, em um “vir-a-ser” que nunca se realiza.

O Tempo americano

Adentrando a concepção de um “tempo americano” apresentada por Buela, pode-se dizer que a América Hispânica possui um tempo próprio, característico de seu clima, solo e paisagem, e talvez incompreensível para os não americanos. Quando especificamos a categoria de um “tempo próprio” queremos dizer uma forma própria de valorizar o tempo. E esse tempo, não é o “time is money” norte-americano e nem o “laizzes-faire” que predomina hoje na Europa. O tempo americano é um “madurar com as coisas”, ele se desenvolve e é determinado pelo ritmo da natureza. É o tempo del gaucho, o homem nativo do campo ou da cidade pequena, aquele que trabalha quando a natureza lhe permite e descansa quando ela apresenta condições adversas. Portanto, o homem ibero-americano não simplesmente utiliza o seu meio para o aperfeiçoamento da técnica e a busca pelo progresso, ele vive como se fosse parte integrante dessa natureza. Essa concepção de tempo põe, mais uma vez, o homem americano em oposição ao pensamento ocidental beligerante.

Conclusão

A busca de um sentido concreto para a América e o Ser Americano passa pela concepção de uma realidade, de um lugar, de uma filosofia e de um tempo próprios. Buela é um dos filósofos que soube reconhecer essas verdades e segue desenvolvendo seus esforços para que se afirme El Sentido de América. Não seria exagero dizer que ele é atualmente um dois maiores divulgadores da metapolítica como ciência em nossas terras. Esse continente, que compartilha língua e cultura comuns, salvo os regionalismo, presentes em qualquer grande espaço geográfico, deve ser a expressão plena de nosso ser, em oposição a todo aspecto da pós-modernidade que não nos representa. Remontando aos ideais de Bolívar e San Martín, a missão do homem ibero-americano é unir esse grande continente em uma única unidade de sentido, em uma única nação.

Bibliografia:

Buela, Alberto. El Sentido de América. Buenos Aires, Ediciones Nuestro Tiempo, 1990.

Buela, Alberto. Hispanoamerica Contra Ocidente. Madrid, Ediciones Barbarroja.

Buela, Alberto. La Sinarquia y lo Nacional. Buenos Aires, Fundación de Cultura et Labor, 1974.

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