terça-feira, 2 de julho de 2019

Putin, Lavrov e Xi Jinping convocam fim à DMA



por Matthew Ehret

O espectro da guerra nuclear há muito paira sobre o mundo como uma espada tenebrosa de Dâmocles, oferecendo à humanidade muita causa para desespero diante da natureza ambivalente da ciência enquanto uma fonte de poder criativo que enleva e enobrece por um lado, e atua como o arauto da morte e do caos por outro.

Todavia, seria errado culpar a ciência pela crise cuja humanidade desencadeou com o átomo, quando a realidade é que nós nunca nos libertamos da peste dos sistemas oligárquicos de governo. Retrocedendo aos registros dos impérios Romano, Persa e Babilônico tais sistemas tem sempre almejado manipular as massas na direção de padrões de comportamento de auto-policiamento e conflito constante.

Quer estejamos falando sobre as Cruzadas, as guerras religiosas Européias, as guerras Napoleônicas, a guerra da Criméia, Guerras do Ópio, ou as primeira e segunda guerras mundiais tem sido sempre a mesma receita: Pôr as vítimas para definir seus interesses ao redor de constrangimentos materiais, recursos em diminuição, ou vieses religioso/étnico/linguísticos que previnem cada pessoa de reconhecer seus interesses comuns com seu vizinho e então pô-los a lutar. Clássico dividir e conquistar.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, aquela antiga receita para administrar o caos não funcionava mais quando um novo ingrediente foi introduzido no “grande jogo” geopolítico. Esse ingrediente atômico era tão poderoso que aqueles “mestres do jogo” gerenciando de cima os problemas da terra como deuses Olímpicos separados entenderam que poderiam ser aniquilados tão rápido quanto suas vítimas e que um novo conjunto de regras devia ser criado às pressas.

A Aposta Nuclear do Senhor Russell

Um principal representativo da mente genocida do império Britânico foi o Senhor Bertrand Russell, um membro de sétima geração da elite hereditária conhecida hoje pelo seu celebrado pacifismo e profundo alcance filosófico. É um fato desconfortável que esse modelo exemplar da “lógica” e da paz tenha sido um dos primeiros pensadores registrados clamando pela aniquilação nuclear da União Soviética na esteira da rendição da Alemanha Nazista. Caso a União Soviética não se submetesse a um Governo Mundial Único, argumentou o Senhor Russel no Boletimpara os Cientistas Atômicos de 1946, então deveria simplesmente encarar uma punição nuclear.

É claro que aquela ameaça foi de vida curta, quando o anúncio surpresa da Rússia de haver “decifrado o código atômico” quebrou o monopólio sobre cujo qual os Anglo-Americanos salivavam e 1945 quando observavam o Japão (cuja rendição indireta já havia sido negociada) queimar sob a sombra de um renovado Leviatã Anglo-Americano emergente.

O Senhor Russel, entãodiretor da CIA/MI6 Congresso pela Liberdade Cultural (cujo objetivo era criar uma nova anti-cultura de hedonismo e irracionalismo nas artes durante a Guerra Fria) foi forçado a mudar o tom e a liberar, ao invés, uma nova doutrina que veio a ser conhecida como “Destruição Mútua Assegurada” (DMA). A obsessão de Russel em tentar escravizar toda a física a um estrito determinismo matemático tal qual fora disposto em seu Principia Mathematica (1910) e seu papel principal na promoção da arte abstrata/música atonal pela CIA sob a bandeira da CCF é um insight útil sobre como sociedades são gerenciadas por oligarcas.

Numa entrevista à BBC anos após Russell mudar suas visões sobre um primeiro ataque à Rússia, o aristocrata britânico, agora-convertido em advogado anti-nuclear descreveu sua mudança de opinião assim:
“Q: É verdadeiro ou falso que em anos recentes você defendeu que uma guerra preventiva pudesse ser feita contra o comunismo, contra a Rússia Soviética?”
RUSSELL: É completamente verdadeiro, e eu não me arrependo disso agora. Não era inconsistente com o que eu penso agora... Houve um tempo, logo após a última guerra, quando os americanos tinham um monopólio das armas nucleares e ofereceram para internacionalizar armas nucleares pelo plano Baruch, e eu pensei ser uma proposta extremamente generosa da parte deles, uma que seria muito desejável que o mundo aceitasse; não que eu defendesse uma guerra nuclear, mas eu pensava que uma grande pressão devesse ser posta sobre a Rússia para que aceitassem o plano Baruch, e eu de fato pensei que se eles continuassem a recusá-lo talvez fosse necessário de fato ir à guerra. Naquele tempo as armas nucleares existiam apenas em um lado e, portanto, as chances é que os Russos desistiriam. Eu pensei que eles iriam... .
Q: Suponhamos que eles não desistissem.
RUSSELL: Eu pensei e tinha esperanças que os Russos iriam desistir, mas é claro que você não pode ameaçar a não ser que esteja preparado para ter seu blefe confrontado.”

Um fim para o Mundo do DMA

O novo jogo tornou-se “balanço geopolítico do terror” sob o DMA, e em muitos aspectos o poder que ele oferecia a uma oligarquia era maior que qualquer coisa que uma sociedade pré-atômica tinha para oferecer. Ao mesmo tempo que grandes guerras não eram mais desejáveis (embora fossem sempre um risco nesse jogo psicótico de altas apostas de poker), guerra assimétrica e uma mudança de regime tornaram-se as novas “coisas grandes” pelos próximos setenta anos. Uma população em terror constante de aniquilação tornou-se um solo maduro para a disseminação de uma nova inquisição sob a orientação de um travestido megalomaníaco dirigindo o FBI. Essa inquisição purgou o Ocidente de líderes qualificados que fossem comprometidos para com a paz entre Oriente e Ocidente e incluiu grandes cientistas, artistas, professores e políticos que viram suas carreiras serem destruídos conforme o Estado Profundo tornou-se cada vez mais poderoso e bombas atômicas mais abundantes.

Enquanto muitos celebraram de maneira tola o sucesso do DMA com o colapso da União Soviética e a ascensão de um mundo uni-polar que iria supostamente conduzir a um pacífico “fim da história”, outros reconheceram o grande truque na medida em que a OTAN continuou se expandindo a despeito de sua razão de ser ter desaparecido. Yevgeni Primakov e um círculo de patriotas russos (cujo qual incluía um Vladimir Putin em ascensão) estavam entre aqueles que viram através da fraude. Essa rede trabalhou diligentemente com suas contrapartidas asiáticas para criar uma fundação para sobrevivência que manifestou-se na forma do G20 m 1999 e na Organização para Cooperação de Xangai em 2001.

No início de 2007, as guerras desencadeadas no Oriente Médio após o 9-11 não tinham um fim previsto, e uma intenção muito mais obscura do que muitos poderiam imaginar estava emergindo entre o caos. A construção de um escudo anti-mísseis balísticos liderada pela OTAN se iniciou ao redor do perímetro sul da Rússia por iniciativa de Dick Cheney e foi logo incrementada posteriormente pela circunscrição de um “Pivô-Asiático” da China, sob o mandato de Obama em 2011. Somente os tolos mais ingênuos acreditaram então que o Irã ou a Coréia do Norte eram as verdadeiras razões por trás dessa jogada Hobbesiana preemptiva de poder em favor de um monopólio. O fantasma do Senhor Russell podia ser sentido ao redor do mundo, ameaçando uma guerra nuclear se a soberania nacional não fosse abandonada em favor de um governo mundial gerenciado por uma “ditadura científica”.

A Convocação da Rússia e da China para controlar a Serpente de Fogo

O Presidente Putin junto a Sergei Lavrov e o Presidente Xi Jinping assinalaram um fim a era do DMA com uma importante convocação por uma nova doutrina internacional de segurança baseada sobre um “novo sistema operante”.

Saindo da Cúpula Econômica de São Petersburgo em 6 de Junho, Putin disse “se nós não mantermos essa serpente de fogo sob controle – se permitirmos que ela saia da garrafa, Deus proíba, isso pode levar a um catástrofe global. Todos estão fingindo ser surdos, cegos ou disléxicos. Precisamos reagir a isso de alguma maneira, não é? Claramente é isso.”

As palavras de Putin foram amplificadas por Sergei Lavrov em 11 de Junho ao falar na conferência do Primakov Readings de 2019 em Moscou, que reuniu diplomatas, especialistas e políticos de 30 países no tema do “Retornando à Confrontação: Existem Alternativas?” Lavrov disse:

“É de uma importância capital que a Rússia e os Estados Unidos tranquilizem o resto do mundo e transmitam uma declaração conjunta de alto escalão de que não pode haver vitória numa guerra nuclear e que, portanto, ela é inaceitável e inadmissível. Nós não entendemos porque eles não podem reassegurar essa posição agora. Nossa proposta está sendo considerada pelo lado dos Estados Unidos.”

Desde que se puseram entre o pelotão de fuzilamento Anglo-Americano e as nações da Síria e da Venezuela, em conjunto com uma surpreendente divulgação de um conjunto de novas tecnologias militares em Março de 2018, Putin transformou as “regras do jogo” geopolítico no sentido de que a proposta de Lavrov é agora uma possibilidade real. As novas tecnologias divulgadas pela Rússia em 2018 incluem mísseis supersônicos, drones subaquáticos e outros foguetes nucleares que garantem a capacidade de um ataque retaliatório caso alguém seja estúpido o suficiente em atacar a Rússia primeiro.

O ICR (BRI, da sigla em inglês) e o Novo Sistema Operante

A cúpula econômica de São Petersburgo de 5-6 de Junho testemunhou não apenas 19000 participantes de 145 países assinado $47.8 bilhões em acordos, mas caracterizou-se como um encontro importante entre o chinês Xi Jinping e Putin, que descreveram seu relacionamento como o de melhores amigos e travaram suas nações mais profundamente que nunca no novo panorama operacional da Iniciativa do Cinturão e Rota (ICR, ou BRI da sigla em inglês), que rapidamente está se estendendo no Ártico.

Esse encontro foi levado ainda a um outro patamar em Bishkek Kyrgyzstan, com a cúpula da Organização para Cooperação de Xangai em 13-14 de Junho,  que integrou ainda mais as nações Eurasianas no ICR. Putin e Xi não apenas se encontraram novamente nessa cúpula, mas agora foram acompanhados pelo indiano recentemente eleito Narendra Modi, cuja participação é vital para a reorganização do sistema mundial. Após a cúpula da OCX, o mundo aguardaria pelo encontro potencial de 28-29 de Junho, na cúpula do G20 em Osaka, Japão, onde o presidente norte-americano Donald Trump indicou seu desejo de encontrar com os três líderes para negociações bilaterais. Muitos espectadores criticaram a ideia de que Trump de fato pudesse desejar um encontro honesto, mas Lavrov demonstrou seu entendimento superior da complexidade estratégica na América argumentando numa entrevista em 6 de Junho, quando ele disse que os fracassos do Presidente Trump em estabelecer relações construtivas com a Rússia devem-se à sabotagem de forças enraizadas dentro do governo: “Certos políticos estado-unidenses, incluindo aqueles que ataram as mãos do Presidente Trump não permitindo que ele cumprisse com suas promessas de campanha de normalizar e melhorar as relações com a Rússia, ainda são incapazes de aceitar esse fato.”

A propósito numa conferência em 12 de Junho junto ao presidente da Polônia, Trump foi pressionado por um repórter a tomar a linha dura contra a Rússia, que aparentemente está “ameaçando a Polônia”. Enquanto fingia concordar com a narrativa Rússia=bully, Trump concluiu sua resposta dizendo “Espero que a Polônia venha a ter um excelente relacionamento com a Rússia. Espero que nós venhamos a ter um excelente relacionamento com a Rússia e, inclusive, com a China e muitos outros países.” Trump tinha anteriormente convocado a Rússia, a China e a América para converterem suas centenas de milhões de dólares gastos em forças armadas em projetos que sejam do interesse comum de todos. Durante sua declaração chave ao Fórum Econômico, Putin desvelou o “elefante na sala” trazendo o tema da quebra do sistema financeiro global: “a degeneração do modelo de universalista de globalização e sua transformação numa paródia, numa caricatura de si próprio, onde as regras internacionais comuns são substituídas pelas leis... de um país.” Putin prosseguiu alertando para uma “fragmentação do espaço econômico global e por uma quebra forçada devido a uma política de egoísmo econômico completamente ilimitada. Mas esse é o caminho para um conflito sem fim, guerras comerciais e talvez não apenas comerciais. Figurativamente esse é o caminho para a terminal luta de todos contra todos.”

O ponto ressaltado foi que em última instância sem um novo sistema econômico, o perigo de injustiça e de aniquilação global pairará sempre sobre a humanidade. Ecoando a filosofia da cooperação ganha-ganha de Xi Jinping, Putin disse que o que é necessário em última instância é “um modelo mais justo e estável de desenvolvimento. Esses acordos deveriam não só ser escritos claramente, mas deveriam ser observados por todos os participantes. Entretanto, eu estou convencido que falar sobre uma ordem econômica como essa continuará sendo um pensamento caprichoso, a não ser que retornemos ao centro da discussão, isto é, noções como as de soberania, como o direito incondicional de cada país na sua estrada desenvolvimentista e, deixe-me acrescentar, responsabilidade pelo desenvolvimento sustentável universal, e não apenas pelos próprios desenvolvimentos.”


BIO: Matthew J.L. Ehret é um jornalista, palestrante e fundador da revista Canadian Patriot Review (O Patriota Canadense). Ele é um autor junto ao The Duran, à Fundação de Cultura Estratégica, Fort Russ e o Orient Review. Seus trabalhos têm sido destacados em Zero Hedge, Executive Intelligence Review, Global Times, Asia Times, L.A. Review of Books, and Sott.net. Matthew também publicou o livro “Chegou o Tempo do Canadá Ingressar na Nova Rota da Seda” e três volumes da História Não-contada do Canadá (disponíveis em untoldhistory.canadianpatriot.org). Ele pode ser contatado em matt.ehret@tutamail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário