terça-feira, 12 de novembro de 2013

Dugin: O Ocidente atual deveria ser aniquilado


Para muitos dos nossos leitores o nome do filósofo, cientista político, tradicioinalista, professor Alexander Dugin, como seus vários livros, são bem conhecidos. É o motivo pelo qual não começamos por Adão e Eva. Vocês podem encontrar mais informações sobre A. Dugin e seus trabalhos nestes sites: http://www.arcto.ru, http://www.4pt.su, http://dugin.ru

O professor Dugin respondeu a algumas das nossas questões. Segue abaixo a entrevista.

Entrevista: Caro professor, poderíamos começar nossa conversa com sua própria e interessante biografia. Antes de tudo, é verdade o que está escrito no Wikipedia e em outros locais? O que é verdade e o que não é? Pai, que trabalhou na GRU, círculo nazista liderado por E. Golovin, muitas perturbações políticas, intimidade com Putin?

Dugin: É tudo pura mentira. Nem Putin, nem nazista, nem pai do GRU e assim por diante. Minha biografia é minha bibliografia (cf. J. Evola). Eu não mexo no Wikipedia por duas razões:

1)     Há um grupo de administradores liberais que imediatamente restauram todas as mentiras para conservar a minha imagem pejorativa (a guerra de rede – é apenas uma democracia, nada pessoa, mas a democracia é sempre uma mentira);
2)     O indivíduo (bem como eu mesmo) não importa para mim; só a missão importa.

Então eu não me inclino a falar de mim mesmo. Leiam meus livros, formem suas opiniões pessoais sobre minhas ideias primeiro, a personalidade do autor, depois é opcional.

E: As principais coisas a se discutir nesta entrevista são suas ideias, as quais eu considero mais interessantes e globalmente importantes, de que o mundo ocidental parece estar entrando em colapso. É isto? O fim da civilização ocidental foi previsto muito antes. Quanto tempo devemos ainda esperar? Há algo que deve acontecer? Terceira Guerra Mundial? Revolução global? Nada (quer dizer, o colapso como processo natural)?

Dugin: Eu mais penso que nada vai acontecer, nada. Isto é o que é realmente terrível. A eternidade é o momento interminável do tédio. Heidegger estudou em seu trabalho, Die Grundbegriffen der Metaphysik o fenômeno do tédio profundo. Quanto ao caráter existencial do Dasein moderno, Gnostic Basilides descreveu o mundo PÓS-fim como completamente balanceado, o mundo sem eventos. Isto não quer dizer que não hajam mais eventos, mas que não vivenciamos mais os eventos como eventos. O colapso permanente é bem analisado pelo escritor inglês Alex Kurtagic.

O problema real surge quando ninguém percebe ele como problema. Eis onde estamos. O Ocidente é o centro do tédio. Ele não explode, mas implode sempre mais profundamente.

Eles estão certos de que isto durará para sempre. O fim do mundo é a impossibilidade do Mundo de terminar. O mundo inacabável não é mais um Mundo, é a agregação dos fragmentos insignificantes da existência como um todo. Estamos vivendo nas 6-9 hipóteses do Parmênides de Platão – há multitudes(πολλά), não há mais unidade (ν). Um mundo assim não pode existir (de acordo com os neoplatônicos). Eu cocordo com eles, não com a mídia de massa e com a cultura prêt-a-porter ou com os hegemônicos intelectuais.

E: Você publicou muitos livros – nem posso conta-los (você pode?). Eu lembro do primeiro que eu li – foi espantoso em 1999, sobre conspiralogia. Você acredita em uma séria conspiração global como os Bilderberg, Maçonaria, Illuminatti, ou outros grupos que REALMENTE estão atuando hoje? Se sim, por favor, explique como isso funciona e o que deveríamos esperar disto.

Dugin: Não me lembro quantos são os meus livros, mas da qualidade deles. A qualidade é muito diferente porque os livros foram escritos para públicos diversos. A conspiralogia é descrita por mim como um tipo de sociologia primitiva. Para a sociologia há um ponto muito importante: o que a sociedade pensa sobre o que está acontecendo não é menos importante que o que realmente está acontecendo ou que o que os especialistas científicos pensam. Então, estudando as teorias de conspiração acabamos por estudar a mente das pessoas, os mitos, a cultura, os medos, as estruturas gnoseológicas e cognitivas. A crença das pessoas nas conspirações. Significa que eles existem ou subsistem (de acordo com a ontologia diferenciada de Alexius Meinong).

É irônico que você menciona os Bilderberg (grupo internacional oficialmente existente) ou os Maçons (organização historicamente documentada) e os Illuminatti, que são produto das teorias de conspiração modernas (houve uma organização assim no fim do século XVIII, mas logo desapareceu). Os Bilderberg planejam? Os Maçons planejam? Penso que sim. O que eles planejam exatamente? Ninguém sabe a não ser os membros. Os membros não falam sobre o que eles planejam. Então não sabemos muito claramente de seus planos. Mas as pessoas imaginam, deduzem, acham, adivinham. É apaixonante estudar, como elas fazem. Elas expressam medos, desejos subconscientes, compreensão oculta da sociedade, da história, das hierarquias, do destino...apaixonante estudar tudo isso.

E: Você é considerado como o pai do Eurasianismo e da Quarta Teoria Política. Você poderia explicar o foco das suas ideias?

Dugin: O Eurasianismo pensa que a Rússia não é um país, mas uma civilização. Então deveria ser comparada não com os países europeus ou asiáticos, mas com as civilizações europeias, islâmicas ou hindus. A Rússia-Eurásia consiste do caráter moderno e pré-moderno, das culturas e etnias do Leste-Europeu. Esta identidade particular deveria ser reconhecida e reafirmada no contexto do novo projeto de integração. O Eurasianismo nega a universalidade da civilização ocidental e a unidimensionalidade do processo histórico (dirigido pelo liberalismo, pela democracia, direitos humanos, economia de mercado e assim por diante). Há culturas diferentes com diferentes antropologias, ontologias, valores, tempos e espaços. O Ocidente não é nada mais que uma província mundial hipertrofiada e insolente com megalomania. É caso abjeto da hybris. A humanidade deveria lutar contra o Ocidente com fim de pôr suas pretensões nos limites legítimos. A província mundial deveria voltar a ser o que é – a província, o histórico caso isolado, a opção – não um fato universal, normativo ou de objetivo comum.

A Quarta Teoria Política é a teoria que afirma:

1)      Três principais ideologias políticas modernas (o liberalismo, o comunismo/socialismo e o fascismo/nazismo) não são mais adequadas – então precisamos descartar todas elas (ou seja, sem mais liberalismo, socialismo e fascismo – notem o fascismo e comparem com o que eles dizem de mim);
2)      Precisamos construir a Quarta Teoria Política além das três descartadas; dessa vez não pode ser moderna (pós-moderna ou pré-moderna);
3)      O sujeito da Quarta Teoria Política é o Dasein segundo o que Heidegger descreveu em seus trabalhos (não o indivíduo como no liberalismo, nem a classe como no marxismo, nem a raça ou o Estado como no fascismo/nazismo) – O Dasein deveria ser libertado do modo inautêntico de existência;
4)      O Dasein é plural e depende da cultura, de modo que o mundo deve ser multipolar (toda cultura, etnia ou religião tem seu própria Dasein – não estão necessariamente em contradição, mas são diferenciadas).
5)      Clamamos pela revolução existencial mundial dos Daseins – Daseins fas sociedades humanas unidas pela luta contra-hegemônica global – contra o globalismo ocidental e contra o universalismo liberal, assim como contra a a dominação dos EUA.

E: A União Eurasiana estabeleceu-se muitos anos atrás. Agora parece estar no esquecimento, apesar de que se pode ver que a parte oriental do mundo (China, Irã, etc.) está se fortalecendo enquanto a parte ocidental se enfraquece. Prossegue? Qual é a situação da União Eurasiana agora e o que você prevê para o futuro dela?

Dugin: A União Eurasiana é nossa ideia tomada pelos burocratas de Putin. Penso que é somente uma forma de assegurar o futuro da Rússia e a condição indispensável para a multipolaridade. A Rússia deveria estar do lado dos poderes não-ocidentais. Há muitos problemas com a União Eurasiana – objetivos e subjetivos. A hegemonia americana e quinta coluna na Rússia danifica ela, e a ineficácia da burocracia russa torna a situação sempre pior. Não obstante será estabelecida, porque deve ser estabelecida.

E: Guerras e revoluções por toda parte agora... Mali, Síria, Palestina, Tunísia... O que você pensa sobre a situação no Magreb/Oriente Médio? Terminará o sangue e outra guerra de mais de dez anos?

Dugin: Não. Nunca terminará. É o projeto do caos financiado pelo Ocidente enfraquecido a fim de controlar as sociedades não-ocidentais por outros meios. O sangue será espalhado mais e mais. Só quando todos os islâmicos voltarem suas armas contra os hegemônicos ocidentalistas e unirem-se à batalha final dos eurasianistas poderá terminar. O Império continua a dividir, mas não pode mais efetivamente controlar. Então começa a dividir e, e é tudo. Não pode dominar, só matar. Então precisamos revidar.

E: Qual é sua opinião sobre o Islã e o Irã?

Dugin: Eu admiro o Irã e admiro o shiismo e o sufismo. É a tradição espiritual que luta contra a modernidade mirando seu centro. Há muitos tipos de Islã. Gosto do Islã tradicional e tenho algumas dúvidas sobre a versão wahhabista. É uma versão modernista e universalista do Islã e parece funcionar sob os interesses dos EUA como um tipo de unidade sub-imperialista. Em suma, eu apoio o tradicionalismo em todas as religiões. Mas o Irã e a tradição shiita eu os amo com meu coração.

E: Que futuro (próximo e distante) gostaria de ver para o mundo? Qual sua visão?

Dugin: No status quo estamos desprovidos de futuro. Compreendo o futuro existencialmente como o horizonte da existência autêntica do Dasein, como Ereignis (evento/em si mesmo), a vinda do último Deus (letzte Gott). Mas este futuro é incompatível com o Logos decadente da história Ocidental. O Ocidente atual (EUA e em parte a Europa) deveriam ser aniquilados e a humanidade deveria ser reconstruída sob fundamentos diferentes – em face da Morte e do Abismo.

Deveria haver um Novo Começo da Filosofia ou...nada mais. O mesmo nada de agora, não perseguido mais como tal. Assim, o futuro não deveria vir por si mesmo. Nós deveríamos fazê-lo. Mas antes precisamos destruir o que é ou parece ser.

E: Como vejo do Facebook e das páginas da internet, há muitas pessoas prontas para alguma revolucionária mudança de paradigma de suas mentes e talvez ainda revoluções físicas. Mudanças reais estão para surgir no nosso mundo? Poderia prever quando e como?

Dugin: A mudança de paradigma é absolutamente necessária. Eu não vejo homens ou mulheres suficientes e prontos para mudar eles próprios e o mundo em torno deles. Mas vejo alguns. É muito pouco para a esperança, mas muito grande para o desespero. Eu gostaria de ver passos mais decisivos e concretos. É bom que alguns começam a despertar. O ódio ao Ocidente, ao globalismo, ao consumismo, à mídia de massas, às mentiras democráticas, ao lixo dos direitos humanos, ao capitalismo, à ditadura tão chamada “sociedade civil” e à dominação americana estão obviamente crescendo. Então deveríamos seguir adiante. Fraqueza significa revolução e guerra. É pouco provável que eles começarão agora. Mas eles deveriam começar exatamente agora porque amanhã será tarde demais.

E: Desejo a você todo o melhor e agradeço pelas respostas – a última questão: quais são as principais ideias nas quais você está trabalhando agora?

Dugin: No manual de Relações Internacionais para as universidades russas, na Teoria do Mundo Multipolar (publicada, mas ainda em desenvolvimento), no desenvolvimento da Quarta Teoria Política, nos estudos heideggerianos no campo da filosofia (tenho escrito já dois livros sobre Heidegger e continuo trabalhando no mesmo projeto), no tradicionalismo (Henry Corbin, círculo Eranos – tenho comprado recentemente todas as edições do Eranos Jahrbuch na Suíça), na sociologia da imaginação (no estilo de G. Duran – fazem dois anos do meu doutorado sobre o assunto), em novos livros sobre geopolítica (geopolítica histórica da Rússia, regiões do mundo e assim por diante), no platonismo e neoplatonismo, eurasianismo (claro), na teologia ortodoxa, antropologia social e etnossociologia, economia (meios alternativos), e em estudos conservadores.

Também: ensino na Universidade Estatal de Moscou (sendo chefe do departamento de sociologia das Relações Internacionais) – RI, geopolítica, etnossociologia, sociologia; conferências (ao redor do mundo); aconselhando o governo russo e o parlamento (enquanto membro oficial dos conselheiros do chefe de Estado Duma S. Naryshkin); e dirijo o Movimento Internacional Eurasiano.

E: Obrigado.

Dugin: De nada.

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