Por Flavia Virginia
Steve Paikin da TVO - âncora da mídia
educacional canadense de Ontário, o mesmo entrevistador de Michael
Millerman em Dezembro passado - convida o filósofo russo Alexandr
Dugin, o político-cientista norte-americano Francis Fukuyama e o
búlgaro presidente do Centro de Estratégias Liberais (Sofia), Ivan
Krastev, para discutir suas perspectivas sobre um punhado de temas no
campo político.
Os caráteres
Steve Paikin é o âncora da TVO - não muito
inteligente, mas esperto o bastante para fazer duas coisas
importantes: jogar a bola para Fukuyama sempre que necessário;
convidar uma pessoa para fazer o papel que ele não poderia fazer
como um convidado, mas precisa de um empregado liberal: Krastev, o
descrente.
Fukuyama aparece como um liberal de moda antiga:
operando através de mentiras físicas e metafísicas, levando seus
credos e maneiras liberais, para o indissimulado contentamento de
Paikin. Ele é certamente um habitué no show e se sente confortável,
e também fatigado. O que ele faz ali? Vende seu livro, agradece seus
empregados, troça as pessoas com algumas técnicas refinadas - o que
é comum.
Krastev, por outro lado, é um liberal pós-moderno
contemporâneo, que procede via verdades virtuais, ou seja, verdades
que não convêm humanamente. Ele é, assim, mais preparado aos
aspectos dividualistas da próxima época (pós-modernidade), e
oferece suas bênçãos em uma conversa que terminará como que "por
que confiar em instituições que falharam conosco? Atualmente, se é
livre para criar/recriar a gama de relações, o modo como se
trabalha, o sexo; portanto, é puramente natural que também se
escolha sua política, uma política que fecha precisamente com você!
Espere apenas dez minutos, estou preparando um app que ajudará você
a fazer isto!"
O app não vem, não porque os mestres não podem
fazê-lo, mas porque seu dever é gerar um topos de descrença, um
vácuo epistêmico, uma desesperança epistêmica. E ele é bom
nisso.
Alexandr Dugin pacientemente e
etnosociologicamente faz o papel do Outro, de que o liberalismo não
pode permanecer de qualquer modo. Ele explica que outros povos podem
querer, e querem, destinos feitos por eles mesmos e que o direito de
não-interferência é uma dignidade pela qual se deve lutar. Ele
também cria uma ponte vanguardista, mas difícil de sustentar, entre
passado e futuro, entre tradição e uma Pós-Modernidade feita por
cada povo sem a intrusão do Ocidente. Ele explica como o sofrimento,
por exemplo, é visto como parte natural da vida russa. Ele está
querendo problemas.
Os Dogmas Principais
Os de Fukuyama:
1- Nunca ir ao núcleo das coisas - "Nós
[EUA] não somos bons em democratizar países". Mas então de
novo, quem no mundo perguntou a você para fazer isto "por nós"?
Esta questão tem de ser respondida honestamente - o fato de Paikin
não fazer esta questão prova que o show é vendido.
2- Substituir a verdade por correção política -
"Democracias liberais não lutam entre si". A ideia é
misciva no mínimo por três razões:
2.1 - o problema com esta afirmação está não
só na exatidão em si (houveram guerras entre democracias), mas
também no fato de que seu credo é precisamente o que leva à guerra
entre outros tipos de regime, que são considerados intrinsecamente
um crime punível pela guerra; portanto, a afirmação reconhece sua
visão prejudicial do Outro como um fenômeno e legitimiza a
necessidade de sua morte;
2.2 - a guerra, então, assume uma variedade de
funções que, acima de tudo, enfraquecem o valor da vida, que o
liberalismo pretende defender, precisamente, a todo custo; a guerra é
um sistema fechado de negócios com a participação de alguns
terceiros partidos, que fecham com os interesses dos próprios grupos
específicos e, por aquelas razões extremamente importantes, não
tem de seguir qualquer papel internacional, incluindo o "acordo
de gentlemen" estabelecido acima;
2.3 - até mesmo antes da guerra, no entanto,
precisamos tomar em consideração outras formas de opressão, como a
economia, violência, corrupção, patrocínios de ditaduras, mercado
negro, psicologia farmacêutica, substituição de cultura por
subculturas, etc., todas elas muito mais "corretas" no
quadro discursivo.
3 - tão logo que os princípios soam
politicamente corretos ou têm chegado ao nível de cega
conformidade, os meios para se chegar a eles e as consequências não
contam, deixando de existir no discurso epistêmico liberal - "Há
uma obrigação moral para apoiar povos que querem ser
auto-determinados". Sim, como no Iraque, levando democracia
através do sangramento do povo se supõe salvá-los através da
democracia.
Os de Krastev
1 - concordando e discordando na mesma sentença
para dissimular suas visões reais e assim manter-se trabalhando por
seu mestre, executando suas ordens: descreditar, confundir e, acima
de tudo, não deixar espaço para uma conclusão pessoal de parte do
telespectador. Krastev vai como "Não quero, não vejo, não
creio". Ele soa como um homem no meio do caminho, mas ele é
realmente bem assentado na presidência do seu Centro de Estratégias
Liberais.
2 - não há confiança possível. O que estava
certo é o que ultimamente estava errado. Coisas fora de si. Ou, nas
entrelinhas, criar um NGO e obter algum dinheiro para pesquisas de
liberais, que é o que melhor pode fazer;
3- Claro que apoia a União Europeia acima de tudo
(não está dito lá, mas quase em tudo o mais em sua obra).
Os de Dugin
1 - ele representa o Outro total: tudo que foi
antes virtua, tudo que deve existir depois. Dugin deve seguir adiante
- nós somos a verdadeira maioria, mas temos muito poucos profetas
para lutar nas velozes arenas. Ademais, para lutar com virtualidade.
Verdade para manter, apenas não-liberais podem compreender sua
mensagem. Entretanto, somos muitos e o que mais precisamos agora é
representação.
A moral: vamos traduzir mais dos seus trabalhos,
treinar mais pessoas para estar no fronte e vamos nos unir por
liberdade.
O Sentido Final
Tanto Fukuyama como Krastev sempre se submeteram a
um quadro institucional, nunca chegando ao papel da espiritualidade,
da coletividade, da família como entidades outras além das
institucionais. Por sua vez, a Igreja existe para atender "momentos"
religiosos; como votar ou participação política substitui a
coletividade e a família está realmente sob ataque. A pessoa não é
vista como um todo, e esta não-antropologia ou pós-antropologia é
tão importante para suas ideologias ocultas como a nossa
antropologia holística é central para a Quarta Teoria Política.
Isto fica bem claro quando Fukuyama diz "eu
não penso que a cultura guia as características humanas que
transcendem a cultura - ou seja instituições políticas contam para
a cultura", ou com Krastev repetindo "a cultura muda".
O resultado desse pensamento é que as identidades podem ser
substituídas por qualquer construto ideológico. Isso é
precisamente a razão dos liberais compreenderem a cultura como uma
configuração de instituições apesar da dinâmica expressão da
própria identidade.
Mas, como dito antes, Fukuyama (ou o fukuyanismo)
não mais representa um perigo para o cerne das instâncias tais como
a Quarta Teoria Política, Eurasianismo e Multipolaridade. Essa
retórica carece de pós-modernidade, ainda está cheia de cegas
crenças nas maravilhas do mundo liberal ainda mesmo se Fukuyama
entitula seu livro "Political Order and Political Decay".
Há ainda um gosto de esperança humana aí, e isso deve ficar no
passado. Essa é outra era quando povos estão sendo preparados para
um profundo mergulho no niilismo. Eles precisam de um discurso nessa
direção. Eles precisam estar desconectados do que está dentro,
rompido e fragmentado. Uma existência virtual trabalhará como um
refúgio para as mentiras que a política, uma pseudo-espiritualidade
e um fácil entretenimento cria para eles. Krastev é sua meta
perfeita.
Assim, ultimamente, nós temos o seguinte quadro:
-Fukuyama: permanece com o liberalismo (democracia
liberal, liberdade individual, individualismo, relatividade,
livre-mercado, unipolaridade, imperialismo, politicamente correto);
-Krastev: permanece com o pós-liberalismo
(pós-humanidade, dividuum e dividualismo, hegemonia
norte-americana/OTAN como globalização, vacuum de valores,
virtualidade);
-Dugin: permanece com a Quarta Teoria Política
(Tradição, Eternidade, Pós-Modernidade da Luz, Multipolaridade,
Eurasianismo, Família, o Sagrado).
Nossas tarefas futuras
Precisamos reconfigurar o modo de transmitir
informação e nossas ideias centrais através da mídia. Não
podemos emular o modo liberal, não funciona para nós - modo
demasiado oco, e somos criaturas do profundo, da amplitude e das
alturas. O todo é o nome de nossa identidade, com muitos comos.
Nossa principal tarefa é a desconstrução do liberalismo.
via 4pt
Abaixo, o debate em inglês
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