Manuel Ochsenreiter.: Prof. Dugin, a mídia de massas Ocidental e políticos do establishment descrevem a recente situação na Ucrânia como um conflito entre a aliança de oposição pro-Européia, democrática e liberal de um lado e um regime autoritário com um ditador como presidente no outro lado. O senhor concorda?
Dugin: Eu conheço essas histórias e considero esse tipo de análise
completamente errada. Nós não podemos dividir o mundo ao estilo de Guerra Fria.
Não existe um ‘mundo democrático’ que se coloca contra um ‘mundo
anti-democrático’, como muito da mídia Ocidental relata.
Dugin: Isso é completamente errado. A Rússia é uma democracia
liberal. Dê uma olhada na constituição russa: nós temos um sistema eleitoral
democrático, um parlamento funcional, sistema de livre mercado. A constituição
é baseada no padrão Ocidental. Nosso presidente, Vladimir Putin, governa o país
de maneira democrática. Nós não somos uma monarquia, nós não somos uma
ditadura, nós não somos um regime comunista soviético.
M.O.: Nossos políticos na
Alemanha chamam Putin de ‘ditador’.
Dugin: (Risadas) Fundamentados em que?
M.O.: Por causa de suas
leis-LGBT, seu apoio à Síria, os processos contra Michail Chodorchowski e o ‘Pussy Riot’...
Dugin: Então eles o chamam de ‘ditador’ porque eles não gostam da
mentalidade russa. Todos os pontos que você citou são completamente legítimos
democraticamente. Não há sequer um elemento ‘autoritário’. Então nós não
devemos confundir isso: mesmo que você não goste da política russa, você não
pode negar que a Rússia é uma democracia liberal. O presidente Putin aceita as
regras democráticas do nosso sistema e as respeita. Ele nunca violou uma única
lei. Então a Rússia é parte do campo democrático liberal e o padrão da Guerra
Fria não funciona para explicar a crise ucraniana.
M.O.: Então como nós podemos
descrever esse conflito violento e sangrento?
Dugin: Nós precisamos de uma análise geopolítica e civilizacional
muito clara. E nós temos que aceitar fatos históricos, mesmo que nesses dias
eles não estejam em voga.
M.O.: O que o senhor quer
dizer?
Dugin: A Ucrânia atual é um Estado que nunca existiu na história. É
uma entidade recentemente criada. Esta entidade tem pelo menos duas partes
completamente diferentes. Essas duas partes têm diferentes identidades e
culturas. Há a Ucrânia ocidental que está unida com a identidade do Leste
Europeu. A vasta maioria das pessoas vivendo na Ucrânia ocidental se consideram
como Leste Europeus. E essa identidade é baseada na rejeição completa de
qualquer ideia pan-Eslávica junto da Rússia. Russos são considerados inimigos
existenciais. Nós podemos colocar assim: eles odeiam os russos, a cultura russa
e claro, a política russa. Isso é parte importante da identidade deles.
M.O.: O senhor, como russo, não
fica chateado com isso?
Dugin: (Risadas) De maneira alguma! É uma parte da identidade. Isso
não necessariamente significa que eles querem guerrear contra nós, mas eles não
gostam de nós. Nós devemos respeitar isso. Veja, os estadounidenses são odiados
por muito mais gente e eles também aceitam isso. Então quando os Ucranianos
ocidentais nos odeiam, não é bom nem ruim – é um fato. Vamos simplesmente
aceitar isso. Nem todo mundo tem que nos amar!
M.O.: Mas os ucranianos do
leste gostam mais de vocês russos!
Dugin: Não tão rápido! A maioria das pessoas vivendo na parte
oriental da Ucrânia compartilham uma identidade comum com o povo russo –
histórica, civilizacional e geopolítica. A Ucrânia Oriental é um país
absolutamente russo e eurasiano. Então existem duas Ucrânias. Nós vemos isso
muitos claramente nas eleições. A população está dividida em qualquer questão
importante. Especialmente quando se trata de relações com a Rússia nós
presenciamos o quão dramático se torna esse problema: uma parte é absolutamente
anti-Rùssia, a outra parte absolutamente pró-Rússia. Duas sociedades
diferentes, dois países diferentes e duas diferentes identidades nacionais e
históricas vivendo em uma entidade.
M.O.: Então a questão é: qual
sociedade domina a outra?
Dugin: Essa é uma parte importante da política ucraniana. Nós temos
duas partes e temos a capital, Kiev. Mas em Kiev nós temos as duas identidades.
Não é a capital nem da Ucrânia Ocidental e nem da Ucrânia Oriental. A capital
da parte ocidental é Lviv, a capital da parte oriental é Kharkiv. Kiev é a
capital de uma entidade artificial. Estes são todos fatos importantes para
entender o conflito.
M.O.: A mídia ocidental,
assim como os ‘nacionalistas’ ucranianos iriam discordar fortemente do termo ‘artificial’
para o Estado ucraniano.
Dugin: Os fatos estão claros. A criação do Estado da Ucrânia dentro
das fronteiras de hoje não foi resultado do desenvolvimento histórico. Foi uma
decisão burocrática e administrativa da União Soviética. A República Socialista
Soviética Ucraniana era uma das 15 repúblicas constituintes da União Soviética
desde a sua inserção em 1922 até o seu fim em 1991. Durante essa história de 72
anos as fronteiras da república mudaram muitas vezes, com uma parte significativa
do que agora é a Ucrânia ocidental sendo anexada pelo Exército Vermelho em 1939
e a adição da Criméia russa em 1954.
M.O.: Alguns políticos e
analistas dizem que a solução mais fácil seria a partição da Ucrânia em um
Estado Oriental e outro Ocidental.
Dugin: Não é tão fácil quanto parece porque nós teríamos problemas
com minorias nacionais. Na parte ocidental da Ucrânia vivem hoje muitas pessoas
que se consideram russas. Na parte oriental vive uma parte da população que se
considera ucranianos ocidentais. Você vê: uma simples partição do Estado não
iria realmente resolver o problema, mas até mesmo criar um novo. Nós podemos
imaginar a separação da Criméia, porque essa parte da Ucrânia é um território
populado puramente por russos.
M.O.: Por que parece que a
União Europeia está muito interessada em ‘importar’ todos esses problemas para
a sua esfera?
Dugin: [Isso] Não é do interesse de qualquer aliança europeia, é do
interesse dos EUA. É uma campanha política dirigida contra a Rússia. O convite
de Bruxelas para a Ucrânia se juntar ao Ocidente trouxe imediatamente o
conflito com Moscou e o conflito interno da Ucrânia. Isso não é absolutamente
surpreendente para ninguém que conheça sobre a sociedade e a história
ucraniana.
M.O.: Alguns políticos alemães
disseram que eles estavam surpresos com as cenas de Guerra Civil em Kiev...
Dugin: Isso diz mais respeito aos padrões de educação histórica e
política dos seus políticos do que sobre a crise na Ucrânia...
M.O.: Mas o presidente ucraniano,
Viktor Yanukovych rejeitou o convite do ocidente.
Dugin: Claro que rejeitou. Ele foi eleito pelo oriente pró-Rússia e
não pelo ocidente. Yanukovych não pode agir contra os interesses da sua própria
base eleitoral. Se ele aceitasse o convite Ocidental/[da]União Europeia, ele
seria imediatamente um traidor aos olhos dos seus eleitores. Os apoiadores de
Yanukovych querem a integração com a Rússia. Para colocar de forma clara:
Yanukovych simplesmente fez o que era lógico para ele fazer. Sem surpresa, sem
milagre. Simplesmente a política lógica.
M.O.: Há agora uma aliança
política de oposição muito plural e colorida contra Yanukovych: Esse aliança
inclui os típicos liberais, anarquistas, comunistas, grupos de direitos gays,
também nacionalistas e até grupos neo-nazistas e hooligans. O que mantem esse
diferentes grupos e ideologias juntos?
Dugin: Eles estão unidos
por puro ódio contra a Rússia. Yanukovych é, aos olhos deles, é um proxy da Rússia, o amigo do Putin, o
homem do oriente. Eles odeiam tudo relacionado à Rússia. Esse ódio os mantem
juntos; esse é um bloco de ódio. Para colocar claramente: o ódio é a ideologia
política deles. Eles não amam a União Europeia ou Bruxelas.
M.O.: Quais são os principais
grupos? Quem está dominando as ações da oposição?
Dugin: São claramente os mais violentos grupos neo-nazistas do
chamado Euromaidan. Eles incitam a violência e provocam uma situação de guerra
civil em Kiev.
M.O.: A mídia de massas do
ocidente alega que o papel desses grupos extremistas é dramatizado pela mídia
pró-Rússia para difamar a totalidade da aliança de oposição.
Dugin: Claro que eles alegam. Como eles pretendem justificar [o
fato de que] a União Europeia e os governos europeus apoiam extremistas,
racistas e neo-nazistas fora das fronteiras da União Europeia enquanto que
dentro dela eles tomam as ações mais melodramáticas e caras contra até mesmo os
mais moderados grupos de direita?
M.O.: Mas como podem, por
exemplo, os grupos de direitos gays e liberais de esquerda lutar juntamente com
neo-nazistas que são reconhecidamente não muito receptivos a gays?
Dugin: Primeiramente, todos esses grupos odeiam a Rússia e o
presidente russo. Isso faz deles camaradas. E os grupos liberais de esquerda não
são menos extremistas do que os grupos neo-nazistas. Nós tendemos a pensar que
eles são liberais, mas isso esta horrivelmente errado. Nós percebemos
frequentemente, especialmente na Europa Oriental e na Rússia, que o Lobby
Homossexual, os ultra-nacionalistas e os grupos neo-nazistas são aliados. O
Lobby Homossexual também tem ideias muito extremistas sobre como deformar,
reeducar e influenciar a sociedade. Nós não devemos nos esquecer disso. O lobby
gay e lésbico não é menos perigoso para qualquer sociedade do que neo-nazistas.
M.O.: Nós conhecemos tal
aliança também em Moscou. O blogger liberal e candidato a prefeito de Moscou,
Alexei Navalny, era apoiado por essa aliança de organizações de direitos gays e
grupos neo-nazistas.
Dugin: Exatamente. E essa coalizão [a favor de] Navalny também era
apoiada pelo Ocidente. A questão é: [a preocupação] não está em nada
relacionada com o conteúdo ideológico desses grupos. Isso não é de interesse do
ocidente.
M.O.: O que o senhor quer
dizer?
Dugin: O que aconteceria se organizações neo-nazistas apoiassem
Putin na Rússia ou Yanukovych na Ucrânia?
M.O.: A União Europeia
começaria uma campanha política; todas as imensas corporações de mídia massiva
do ocidente iriam fazer a cobertura e escandalizar [o fato].
Dugin: Este é exatamente o caso. Então a questão é apenas sobre
qual o lado que tais grupos apoiam. Se o grupo é contra Putin, contra
Yanukovych, contra a Rússia, a ideologia desse grupo não é um problema. Se esse
grupo apoia Putin, a Rússia ou Yanukovych, a ideologia imediatamente se
transforma em um imenso problema. A questão é toda sobre qual campo geopolítico
o grupo defende. Não é nada além de geopolítica. O que está acontecendo na
Ucrânia é uma lição muito boa. A lição nos diz: a geopolítica está dominando
aqueles conflitos e nada mais. Nós testemunhamos isso também em outros
conflitos, por exemplo na Síria, na Líbia, no Egito, na região do Cáucaso, no
Iraque, no Irã...
M.O.: Qualquer grupo alinhado
ao Ocidente é um ‘grupo bom’ sem importar se ele é extremista?
Dugin: Sim, e qualquer grupo que se coloque contra o Ocidente –
mesmo que esse grupo seja secular e moderado – será chamado de ‘extremista’
pela propaganda ocidental. Essa aproximação é exatamente o que domina os
campos-de-batalha geopolíticos atualmente. Você pode ser o guerreiro salafista
mais radical e brutal, você pode odiar judeus e comer órgãos humanos na frente
de uma câmera, contanto que você lute pelo interesse ocidental contra o governo
sírio, você será um respeitado e ajudado aliado do Ocidente. Quando você
defende uma sociedade pluri-religiosa, secular e moderada, a propósito, [são]
todos ideais do Ocidente, mas você toma a posição contra os interesses
ocidentais, como o governo sírio, você é o inimigo. Ninguém está interessado no
que você acredita, a questão é toda sobre qual campo geopolítico você escolheu,
se você está certo ou errado aos olhos da Hegemonia Ocidental.
M.O.: Prof. Dugin, especialmente
os grupos de oposição ucranianos se auto-denominando de’nacionalistas’ iriam
discordar fortemente do senhor. Eles alegam: “Nós somos contra a Rússia e
contra a União Europeia, nós tomamos uma terceira posição!”. A mesma coisa que
ironicamente seria dita por um guerreiro salafista na Síria: “Nós odiamos
estadounidenses tanto quanto o governo sírio!”. Existe algo como uma possível
terceira posição na guerra geopolítica de hoje?
Dugin: A ideia de tomar uma terceira posição independente dos dois
blocos dominantes é muito comum. Eu tive algumas interessantes entrevistas e
conversas com a principal figura da guerrilha separatista da Chechênia. Ele me
confessou que realmente acreditava na possibilidade de uma Chechênia Islâmica
independente e livre. Mas depois ele entendeu que não existe uma ‘terceira
posição’, sem possibilidades para isso. Ele entendeu que luta contra a Rússia
ao lado do Ocidente. A mesma terrível verdade acerta os ‘nacionalistas’
ucranianos e os guerreiros árabes salafistas: Eles são proxies ocidentais. Pra eles é difícil aceitar porque ninguém gosta
da ideia de ser um idiota útil de Washington.
M.O.: Para falar claramente:
a ‘terceira posição’ é absolutamente impossível?
Dugin: Sem possibilidades para isso atualmente. Na geopolítica
existe o poder terrestre e o poder marítimo. Hoje o poder terrestre é
representado pela Rússia, o poder marítimo por Washington. Durante a 2ª Guerra
Mundial a Alemanha tentou impor uma terceira posição. Esta tentativa foi
baseada precisamente nesses erros políticos que estamos conversando agora. A
Alemanha entrou em guerra contra o poder marítimo representado pelo Império
Britânico e contra o poder terrestre representado pela Rússia. Berlim lutou
contra as principais forças mundiais e perder a guerra. O fim foi a completa
destruição da Alemanha. Então quando mesmo a vigorosa e forte Alemanha daquela
época não foi forte o suficiente pra impor a terceira posição, como os grupos
muito menores e mais fracos querem fazer isso hoje? É impossível, é uma ilusão
ridícula.
M.O.: Qualquer pessoa que
alega lutar por uma ‘terceira posição’ independente hoje é um proxy do
Ocidente?
Dugin: Na maioria dos casos, sim.
M.O.: Moscou parece muito passive.
A Rússia não apoia nenhum proxy, por exemplo, nos países da União Europeia. Por que?
Dugin: A Rússia não possui uma agenda imperialista. Moscou respeita
a soberania e não interferiria na política interna de nenhum outro país. E esta
é uma política honesta e boa. Nós vemos isso mesmo na Ucrânia. Nós vemos muito
mais políticos da União Europeia e até mesmo políticos estadounidenses e
diplomatas viajando para Kiev para apoiar a oposição do que políticos russos
apoiando Yanukovych na Ucrânia. Nós não devemos nos esquecer que a Rússia não
tem qualquer interesse hegemônico na Europa, mas os estadounidenses têm.
Falando francamente, a União Europeia não é uma entidade genuinamente europeia –
é um projeto imperialista transatlântico. Ela não serve o interesse dos
europeus, mas os interesses da administração de Washington. A ‘União Europeia’
é em realiadde anti-europeia. E o ‘Euromaidan’ é em realidade ‘anti-Euromaidan’
– eles são puramente proxies
estadounidenses. A mesma cosia serve para os grupos de direitos homossexuais e
organizações como o FEMEN ou os grupos liberais de esquerda.
*Todos os créditos da entrevista a Manuel Ochsenreiter.
Esse Dugin é um grande cínico. Mesmo de longe, quem não vive na Ucrânia, conhece o histórico de horror que a Rússia impôs aquele povo. Imagine quem mora lá! Para Dugin isso não quer dizer absolutamente nada. Parece que as pessoas na Ucrânia lutam contra a influência Rússia do nada, por puro preconceito ou misticismo irracional. E os 6 milhões de mortos de fome que a Rússia provocou deliberadamente em 1932, isso ai é só uma "fofoca" da mídia do ocidente aos olhos de Dugin, Putin e todos os outros psicopatas russos.
ResponderExcluirNuma coisa Dugin tem razão: muita gente no ocidente odeia a Rússia de verdade, mas não é por causa da "Rússia" em si e sim por causa do que a herança maldita (leia-se KGB) representa de perigo para o mundo hoje. Para Dugin esse nome também não quer dizer nada. Veja que ele nem toca no nome FSB, nem o fato de Putin ser um 'proxy" (para usar a palavra da moda) da KGB.
Parabéns aos ucranianos que não foram trouxas de cair nesse xaveco russo sem graça.
você esté errado:
Excluir1) a russofóbia é muito mais antiga do que a KGB)))
2) "Holodomor" é uma farça ainda não reconhecida pela ONU:
http://guiademoscou.blogspot.ru/2013/08/holodomor-farsa-russofoba_5.html
Se esquivando, dando respostas vagas e análises errôneas durante toda a entrevista, Dugin se entrega realmente na última resposta. Mostra para que veio: defender a Rússia e atacar os EUA. Um palhaço de marca maior! Dizer que a Rússia não tem aspirações imperialistas? Conta outra!
ResponderExcluirDugin não domina o tema da Ucrânia e sua interpretação da tercera posição dos nazistas não é convinsente: o Terceiro Reich foi desenhado muito mas complicado e os nazistas cuidavam muito dos ingleses (o caso de Rudolf Hess, etc.).
ResponderExcluirhttp://guiademoscou.blogspot.ru/2014/03/dividir-ucrania-para-conquistar-russia.html