Por Alberto Buela(*)
Com motivo da publicação de um livro nosso em
português, Hispanoamérica Contra o
Ocidente[1], tivemos ocasião de passar alguns dias em Curitiba, capital do
Estado do Paraná.
Que surpresa foi a nossa quando às quatro e
meia da manhã nos acorda, assim como acontece todos os dias em Buenos Aires, o belo
porém interminável canto do zorzal,
que lá o chamam de sabiá.
Mas esta não seria a única coincidência. Na
conferência[2] que citamos se tomava mate, tiveram assistentes vestidos de
gaúchos, todo o pessoal que encontramos se mostrou predisposto a falar em
portunhol, viajando ao litoral marítimo observamos o costume de pintar as casas
de azul e branco, o homem curitibano é muito parecido com o tipo argentino.
Enfim, pareceu estarmos em um pedaço da nossa terra.
Quando chegamos ao aeroporto e, como os amigos
que viriam nos receber se atrasaram, perguntamos a um policial que estava por
aí o que poderíamos fazer e, ao observar nosso pouco domínio do português, nos
pediu que falássemos em castelhano, porque ele era descendente de guaranis
paraguaios.
No museu histórico paranaense pudemos observar
uma sequência histórica temporal da região sobre um grande mural e ali, em
homenagem à verdade, figura um primeiro período tupi-guarani, um segundo
espanhol e um terceiro bandeirante e, depois, a chegada dos negros, assim até
chegar aos dias de hoje.
Como no dia 20 de Novembro se celebra o dia da
consciência negra no Brasil, surgiu uma polêmica sobre se o declarassem feriado
ou não.
Da leitura dos jornais pudemos aprender que
todo o pensamento progressista do Brasil, no qual se inclui o marxismo político
e universitário, está em favor da festa e do feriado como uma reivindicação do
sofrimento da escravidão negra.
Conversando com alguns amigos de Curitiba
comentamos que nos parecia um grave erro, uma imbecilidade. Primeiro porque o
monopólio da dor e da exploração não só possuem os negros no Brasil. E se
tivesse que homenagear alguma etnia ou comunidade, esta seria a de São Paulo
para baixo, a tupi-guarani, que foi massivamente exterminada pelos
bandeirantes. Segundo porque outras coletividades, como os italianos,
poloneses, alemães, japoneses, espanhóis e chinêses, também podem reclamar o
mesmo. Terceiro porque Zumbi dos Palmares é uma lenda marxista para usar os
negros como elemento para acelerar a contradição na sociedade brasileira. Além
disso, Zumbi dos Palmares, o ídolo negro, tinha uma comitiva enorme que, enfim,
vendia como escravos aos bandeirantes. Quarto porque a teoria do multiculturalismo,
segundo a qual uma minoria tem razão só pelo fato de ser minoria e não pelas
razões de conduzem a seu favor, é uma invenção da intelligensia norteamericana para quebrar as unidades nacionais.
O Brasil, como a Argentina, são grandes
espaços territoriais que se conformaram através de uma cultura de síntese. Na
verdade, não somos muitas culturas separadas como pretende o multiculturalismo
“a la carte”, mas uma intercultura. Quer dizer que em cada um de nós,
sul-americanos, que não somos nem tão europeus nem tão índios, vivem várias
culturas ao mesmo tempo. Isto deu lugar a esta cultura de síntese, que foi
expressa na ideia de mestiçagem, mistura ou simbiose que expressou com grande
clareza e lucidez, entre outros, este grande pensador social brasileiro,
Alberto Torres (1865-1917).
E esta cultura deu ao mundo um arquétipo de
homem que foi e é o gaucho ou gaúcho,
cujo território e vigência se extende desde o pampa e a mesopotâmia argentina,
passando pelo Uruguai, até os estados do Rio Grande, Santa Catarina e Paraná.
Pensado em termos antropoculturais, esta
grande região gaúcha já tem uma expressão unificada: o portunhol. Um arquétipo
humano: o gaucho ou gaúcho. Uma
história comum: a luta contra Espanha e Portugal e a contemporânea contra os
interesses ingleses e norteamericanos. Politicamente, neste grande espaço
convergem hoje quatro países: três estados do Brasil, três províncias
argentinas, todo o Uruguai e a parte oriental do departamento de Canindeyú do
Paraguai. Tudo isso dá para pensar em quantas coisas nos unem, os povos da
América do Sul.
[1] Editora Austral (N.T.)
(*) arkegueta, aprendiz constante, melhor que
filósofo
Traduzido por Álvaro Hauschild
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