sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

"A Argentina tem um direito histórico superior" nas Malvinas


Há dois domingos, abordamos a legitimidade da titularidade britânica das Malvinas através do livro “One Man’s Falklands” do escocês Tam Dalyell e os estudos do historiador inglês Peter Beck, ambos baseados na volumosa e transcendental obra do investigador estadounidense Jules Goeble, “The Struggle for the Falkland Islands”. Nesta oportunidade, traremos a opinão do decano da Universidade de Villanova (EUA), Lowell Gustafson, entrevistado por este autor, tendo como base o seu livro “A disputa da soberanía sobre as Falkland (Malvinas) Islands”. Entre citações de Perón e Scalabrini Ortiz,  Gustafson dedica vários capítulos ao estudo detalhado da titularidade inicial da Argentina e Grã-Bretanha sobre o arquipélago. As bicentenárias aspirações piratas no território das Provincias Unidas são explicadas com referências a autores como Rodolfo e Julio Irazusta, experts na “questão da exploração econômica britânica da Argentina”. Na página 57 de seu livro citado, nos lembra: “Juan Perón listaria as Ilhas Malvinas como ‘as primeiras entre as muiats formas de agressão que a América Latina sofreu. O ataque de 1833 às Malvinas por forças britânicas e sua violenta ocupação foram apoiadas pelos EUA pró-britânico, a mais poderosa nação americana’.”

– Quais são os direitos históricos e os títulos legais da Argentina sobre as Ilhas Malvinas?

- A resposta a esta pergunta é complexa. No meu livro as resumo entre as páginas 34 e 36. O título que a Argentina herdou, seja através da herança espanhola ou por própria criação, não pôde perder-se de maneira repentina pela agressão britânica. Tampouco pôde ter-se perdido gradualmente pelo assentamento britânico, em razão de que a Argentina nunca aceitou a usurpação britânica. Em 16 e 22 de janeiro de 1833, a Argentina protestou pelo uso de força britânico. Logo veio o protesto do ministro plenipotenciario argentino, don Manuel Moreno, em Londres, em 24 de abril de 1833, e mais um segundo em 29 de dezembro de 1834. [Os protestos] continuaram, protagonizados por outros funcionários, os protestos de 1841, 1849, 1888, 1908, 1927, 1933 e 1946. Daí em diante e mais praticamente de forma anual, a Argentina continuou suas queixas a nível de Nações Unidas.

– Os britânicos alegam que o período 1849 – 1884 sem protestos formais por parte da Argentina tiram força (total ou parcial) de suas reivindicações.

– A Argentina esteve 35 anos sem objeções, de fato, mas sua última queixa, a de 1849, assinalou especificamente que a ausência de futuros protestos não significa que o país abandone suas reivindicações. A maioria dos principais autores em Direito Internacional, incluindo Hugo Grotius e L. Oppenheim, argumentam que um período de interrupção de 50 a 100 anos é codnição fundamental para a prescrição de um titulo de legaliadde. Neste sentido, o silêncio argentino de 35 anos nãoo é importante, sobretudo desde que a Argentina não subscreveu nenhum tratadoque implique um reconhecimento da reivindicação britânica. De fato, a ausência britânica entre 1774 e 1833 totalizou uns 50 anos e isto não implicou, segundo sua conformidade, na perda da titularidade durante aquele período.

– Pode nos relatar brevemente como começou e por quem a colonização das Malvinas?

– A ocupação britânica data de meados do século XVIII; a espanhola começou nos fins desse século. Houve uma tentativa francesa de restaurar seu impérioo. Antoine Louis de Bougainville funda  Porto St. Louis em Les Malouines (As Malvinas) em 31 de janeiro de 1764. França paga a Bougainville pelo assentamento e Porto St. Louis é cedido à Espanha em 1767. Por sua parte, John Byron funda Porto Egmont em 4 de janeiro de 1765, depois da fundação do assentamento francês. A Espanha desaloja os britânicos a força em 1769. Alguns britânicos, como Lord Chatam, propiciam o uso da força para restaurar o controle britânico em Porto Egmont, caso fosse necessário. O desalojamento britânico finalmente sucede em 1774; deixaram uma placa afirmando a reivindicação da Grã-Bretanha sobre as ilhas.

–O que aconteceu a partir de 1810?

– Em 1810 se estabelece no Cabildo a Primeira Junta, que diz reconhecer Fernando VII. A Grã-Bretanha segue interessada em penetrar no Império Espanhol, ainda que mudada a estratégia: do antiquado enfoque militar de Lord Beresford a respeito do colonialismo, à incitação à independência política da América Latina (neoconialismo econômico). Enquanto isso, a Espanha, preocupada com os movimentos independentistas no continete, abandonou as Ilhas Malvinas em 1811. Surge então o princípio de uti possidetis (aceitação das fronteiras coloniais) frente à fragmentação política causa pela independência: que territórios do antigo Vice-reinado formaram parte das nações recém-independentes? Caçadores e pescadores de diversas nacionalidades utilizam formalmente as Malvinas. A Argentina tenta estabelecer o controle de jure e de facto sobre elas. Na década de 20 acontecem importantes fatos. Em 1825, se assina o tratado de amizade, comércio e navegação entre a Argentina e a Grã-Bretanha. Em 10 de junho de 1829, os britânicos protestam pela concessão e renovam suas reivindicações sobre as Ilhas Malvinas. Vernet se apodera de dois navios dos EUA que foram achadas violando sua concessão exclusiva. Os Estados Unidos envia o U.S.S. Lexington, cujo capitão declarou as ilhas res nullius (propriedade de ninguém). É então que a Argentina nomeia um novo governador. A Grã-Bretanha responde enviando dois navios de guerra, o Clio e o Tyne, que tomam Porto Louis em 2 de janeiro de 1833. A ocupação britânica prossegue desde então e até o presente.

–Você afirmas na página 12 de seu livro: “A Argentina tem um direito histórico superior... sobre a Grã-Bretanha”. Por quê?

– A Argentina tem um direito histórico superior devido a que herdou a soberania da Espanha sobre as ilhas, sob o princípio de uti possidetis, pelo qual as nações recém-independentes da América Latina reivindicavam a substituição das fronteiras administrativas espanholas pelas nacionais, ou seja, estabelecer seu próprio título sobre as ilhas que haviam sido declaradas res nullius, ou propriedade de ninguém. Espanha tinha um título legal sobre as ilhas porque comprou a primeira colônia, que havia sido fundada pelos franceses, e a manteve até 1811. A Grã-Bretanha fundou uma colônia nas ilhas depois dos franceses, mas a abandonou em 1774. Os britânicos deixaram uma placa afirmando sua intenção de manter o título legal, mas não fizeram objeções durante quase 60 anos, enquanto a Espanha e a Argentina reivindicavam publicamente a soberania sobre o conjunto de ilhas. Quando a Argentina declarou formalmente sua independência em 1816, a colônia espanhola havia sido evacuado durante alguns anos. Dado que nenhuma outra nação havia reclamado habitar as ilhas em sua totalidade, a Argentina tomou posse das mesmas, seja em virtude do Vice-reinado ou em virtude de tratar-se de ilhas que não haviam sido reivindicadas por ninguém. Enquanto os Estados Unidos declararam as ilhas res nullius em 1831, a Argentina impugnou esta afirmação e atuou como se houvesse mantido a soberania sobre elas. Deste modo, quando a grã-Bretanha invadiu a pequena colônica argentina em 1833, o fez sem tener nenhuma reivindicação suficientemente fundamentada sobre as ilhas.

– Na página 56 o senhor afirma que “o princípio de auto-determinação não respaldaria os títulos da Grã-Bretanha sobre as ilhas se os os moradores não tivessem se atribuido este direito, dado que eles foram importados por uma potência colonial”. Deste modo, o princípio da auto-determinação é aplicável às Malvinas?

– A ONU tem pensado detalhadamente sobre a auto-determinação de povos nativos, mas não dos povos coloniais. Os colonos europeus haviam vivida na África durante séculos, mas raramento se pensou que pudessem reclamar território sob o princípio da auto-determinação.

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