Há dois domingos, abordamos
a legitimidade da titularidade britânica das Malvinas através do livro “One Man’s
Falklands” do escocês Tam Dalyell e os estudos do historiador inglês Peter
Beck, ambos baseados na volumosa e transcendental obra do investigador
estadounidense Jules Goeble, “The Struggle for the Falkland Islands”. Nesta oportunidade,
traremos a opinão do decano da Universidade de Villanova (EUA), Lowell
Gustafson, entrevistado por este autor, tendo como base o seu livro “A disputa
da soberanía sobre as Falkland (Malvinas) Islands”. Entre citações de Perón e
Scalabrini Ortiz, Gustafson dedica
vários capítulos ao estudo detalhado da titularidade inicial da Argentina e Grã-Bretanha
sobre o arquipélago. As bicentenárias aspirações piratas no território das
Provincias Unidas são explicadas com referências a autores como Rodolfo e Julio
Irazusta, experts na “questão da exploração econômica britânica da Argentina”.
Na página 57 de seu livro citado, nos lembra: “Juan Perón listaria as Ilhas
Malvinas como ‘as primeiras entre as muiats formas de agressão que a América
Latina sofreu. O ataque de 1833 às Malvinas por forças britânicas e sua violenta
ocupação foram apoiadas pelos EUA pró-britânico, a mais poderosa nação
americana’.”
– Quais são os direitos históricos e os títulos legais da Argentina
sobre as Ilhas Malvinas?
- A resposta a esta pergunta é
complexa. No meu livro as resumo entre as páginas 34 e 36. O título que a
Argentina herdou, seja através da herança espanhola ou por própria criação, não
pôde perder-se de maneira repentina pela agressão britânica. Tampouco pôde
ter-se perdido gradualmente pelo assentamento britânico, em razão de que a
Argentina nunca aceitou a usurpação britânica. Em 16 e 22 de janeiro de 1833, a
Argentina protestou pelo uso de força britânico. Logo veio o protesto do
ministro plenipotenciario argentino, don Manuel Moreno, em Londres, em 24 de
abril de 1833, e mais um segundo em 29 de dezembro de 1834. [Os protestos]
continuaram, protagonizados por outros funcionários, os protestos de 1841,
1849, 1888, 1908, 1927, 1933 e 1946. Daí em diante e mais praticamente de forma
anual, a Argentina continuou suas queixas a nível de Nações Unidas.
– Os britânicos alegam que o período 1849 – 1884 sem protestos formais
por parte da Argentina tiram força (total ou parcial) de suas reivindicações.
– A Argentina esteve 35 anos sem
objeções, de fato, mas sua última queixa, a de 1849, assinalou especificamente
que a ausência de futuros protestos não significa que o país abandone suas
reivindicações. A maioria dos principais autores em Direito Internacional,
incluindo Hugo Grotius e L. Oppenheim, argumentam que um período de interrupção
de 50 a 100 anos é codnição fundamental para a prescrição de um titulo de
legaliadde. Neste sentido, o silêncio argentino de 35 anos nãoo é importante,
sobretudo desde que a Argentina não subscreveu nenhum tratadoque implique um
reconhecimento da reivindicação britânica. De fato, a ausência britânica entre
1774 e 1833 totalizou uns 50 anos e isto não implicou, segundo sua conformidade,
na perda da titularidade durante aquele período.
– Pode nos relatar brevemente como começou e por quem a colonização das
Malvinas?
– A ocupação britânica data de
meados do século XVIII; a espanhola começou nos fins desse século. Houve uma
tentativa francesa de restaurar seu impérioo. Antoine Louis de Bougainville
funda Porto St. Louis em Les Malouines
(As Malvinas) em 31 de janeiro de 1764. França paga a Bougainville pelo
assentamento e Porto St. Louis é cedido à Espanha em 1767. Por sua parte, John Byron
funda Porto Egmont em 4 de janeiro de 1765, depois da fundação do assentamento
francês. A Espanha desaloja os britânicos a força em 1769. Alguns britânicos,
como Lord Chatam, propiciam o uso da força para restaurar o controle britânico
em Porto Egmont, caso fosse necessário. O desalojamento britânico finalmente
sucede em 1774; deixaram uma placa afirmando a reivindicação da Grã-Bretanha
sobre as ilhas.
–O que aconteceu a partir de 1810?
– Em 1810 se estabelece no
Cabildo a Primeira Junta, que diz reconhecer Fernando VII. A Grã-Bretanha segue
interessada em penetrar no Império Espanhol, ainda que mudada a estratégia: do
antiquado enfoque militar de Lord Beresford a respeito do colonialismo, à
incitação à independência política da América Latina (neoconialismo econômico).
Enquanto isso, a Espanha, preocupada com os movimentos independentistas no
continete, abandonou as Ilhas Malvinas em 1811. Surge então o princípio de uti possidetis (aceitação das fronteiras
coloniais) frente à fragmentação política causa pela independência: que
territórios do antigo Vice-reinado formaram parte das nações
recém-independentes? Caçadores e pescadores de diversas nacionalidades utilizam
formalmente as Malvinas. A Argentina tenta estabelecer o controle de jure e de facto sobre elas. Na década de 20 acontecem importantes fatos.
Em 1825, se assina o tratado de amizade, comércio e navegação entre a Argentina
e a Grã-Bretanha. Em 10 de junho de 1829, os britânicos protestam pela
concessão e renovam suas reivindicações sobre as Ilhas Malvinas. Vernet se
apodera de dois navios dos EUA que foram achadas violando sua concessão
exclusiva. Os Estados Unidos envia o U.S.S. Lexington, cujo capitão declarou as
ilhas res nullius (propriedade de
ninguém). É então que a Argentina nomeia um novo governador. A Grã-Bretanha
responde enviando dois navios de guerra, o Clio e o Tyne, que tomam Porto Louis
em 2 de janeiro de 1833. A ocupação britânica prossegue desde então e até o
presente.
–Você afirmas na página 12 de seu
livro: “A Argentina tem um direito histórico superior... sobre a Grã-Bretanha”.
Por quê?
– A Argentina tem um direito
histórico superior devido a que herdou a soberania da Espanha sobre as ilhas,
sob o princípio de uti possidetis,
pelo qual as nações recém-independentes da América Latina reivindicavam a
substituição das fronteiras administrativas espanholas pelas nacionais, ou
seja, estabelecer seu próprio título sobre as ilhas que haviam sido declaradas res nullius, ou propriedade de ninguém.
Espanha tinha um título legal sobre as ilhas porque comprou a primeira colônia,
que havia sido fundada pelos franceses, e a manteve até 1811. A Grã-Bretanha
fundou uma colônia nas ilhas depois dos franceses, mas a abandonou em 1774. Os
britânicos deixaram uma placa afirmando sua intenção de manter o título legal,
mas não fizeram objeções durante quase 60 anos, enquanto a Espanha e a
Argentina reivindicavam publicamente a soberania sobre o conjunto de ilhas.
Quando a Argentina declarou formalmente sua independência em 1816, a colônia
espanhola havia sido evacuado durante alguns anos. Dado que nenhuma outra nação
havia reclamado habitar as ilhas em sua totalidade, a Argentina tomou posse das
mesmas, seja em virtude do Vice-reinado ou em virtude de tratar-se de ilhas que
não haviam sido reivindicadas por ninguém. Enquanto os Estados Unidos
declararam as ilhas res nullius em
1831, a Argentina impugnou esta afirmação e atuou como se houvesse mantido a
soberania sobre elas. Deste modo, quando a grã-Bretanha invadiu a pequena
colônica argentina em 1833, o fez sem tener nenhuma reivindicação suficientemente
fundamentada sobre as ilhas.
– Na página 56 o senhor afirma que “o princípio de auto-determinação
não respaldaria os títulos da Grã-Bretanha sobre as ilhas se os os moradores não
tivessem se atribuido este direito, dado que eles foram importados por uma
potência colonial”. Deste modo, o princípio da auto-determinação é aplicável às
Malvinas?
– A ONU tem pensado
detalhadamente sobre a auto-determinação de povos nativos, mas não dos povos
coloniais. Os colonos europeus haviam vivida na África durante séculos, mas
raramento se pensou que pudessem reclamar território sob o princípio da
auto-determinação.
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